Análise: Lula apazigua, mas embate de Gleisi e Haddad vai além da Economia
Sucessão do presidente serve de pano de fundo para embates sucessivos entre a ministra responsável pela articulação com o Congresso e o ministro da Fazenda
A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, hastearam a bandeira branca. Os últimos dias foram marcados por juras públicas de cooperação e parceria, em nome da agenda prioritária do governo na área econômica. A onda de acenos mútuos foi coroada nesta quinta-feira (13), com a primeira reunião de trabalho dos dois titulares da Esplanada.
Gleisi e Haddad marcaram o encontro para esta manhã, na sede do Ministério da Fazenda. Todos os sinais, até agora, vão na direção de uma atuação conjunta e desprovida de atritos. Mas, por trás dessa trégua, a rivalidade entre dois dos mais importantes ministros do governo se estende para muito além da economia.
Expoentes de um racha cada vez mais evidente no grupo que historicamente dá as cartas no PT – a corrente Construindo um Novo Brasil (CNB) –, Gleisi e Haddad já divergiram em mais de uma ocasião a respeito dos rumos do partido e da estratégia que deve guiar este terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Um exemplo recente disso é a eleição interna que definirá o novo presidente do PT. Lula endossou o nome do ex-prefeito de Araraquara Edinho Silva, aliado histórico de Haddad dentro da legenda. Mas a ala ligada a Gleisi impôs uma série de resistências à indicação e segue tentando construir uma alternativa para a vaga.
O ponto central é que, no decorrer dos últimos anos, Gleisi e Haddad passaram a protagonizar especulações diversas sobre quem irá suceder Lula. Em reservado, ministros e líderes petistas atribuem a esse embate muitas das divergências que marcaram nos últimos meses a relação entre os dois ministros.
Nos bastidores, aliados próximos de Gleisi enxergam na ministra vários atributos que a cacifariam para a disputa presidencial – do histórico de militância na esquerda ao respeito dos movimentos sociais, passando pela relação sólida com o Congresso, a experiência como chefe da Casa Civil e o fato de representar uma novidade nas urnas para a Presidência.
Já o time de Haddad enxerga nele o grande favorito para essa vaga. Aliados apontam a relevância da missão de comandar a Fazenda, a relação construída com o mercado e o Congresso, o potencial de aceitação junto a parte do eleitorado de centro. Sem contar o fato de ter chegado primeiro nessa fila. Afinal, Haddad foi escolhido por Lula para disputar o Planalto quando ele próprio ficou impedido de fazê-lo, ao ser preso na Operação Lava Jato. Mas Haddad nunca teve a oportunidade de disputar uma eleição presidencial desde o início.
Em meio a esse contexto, Gleisi e Haddad de fato passaram os últimos dois anos discordando publicamente e em reservado sobre a política econômica. Do lado de Gleisi, a ideia de que o governo precisava destravar investimentos para assegurar a continuidade de seu projeto político dava o tom do discurso. Haddad, por sua vez, insistiu na defesa do ajuste fiscal e mirou alto com uma meta de déficit zero.
A trégua sacramentada hoje é reflexo de uma articulação liderada pelo próprio Lula, segundo o relato de pessoas próximas. O presidente, afirma um interlocutor, pediu expressamente a Gleisi que fizesse um aceno a Haddad antes de anunciá-la como nova ministra da articulação política.
No fim das contas, o destino do próprio Lula pode ser crucial para definir se essa trégua vai durar. Em tese, o presidente é candidato à reeleição. Mas há no PT quem acredite que o petista já desistiu há muito tempo de disputar um novo mandato. Por essa lógica, Lula só permanece no páreo para 2026 para estancar a disputa interna para decidir quem será seu sucessor.