Fernanda Magnotta
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Fernanda Magnotta

PhD especializada em Estados Unidos. Professora da FAAP, pesquisadora do CEBRI e do Wilson Center. Referência brasileira na área de Relações Internacionais

Análise: A Educação na mira de Trump

Presidente dos EUA assinou ordem para iniciar fechamento do Departamento de Educação, mas precisará de apoio no Congresso

Presidente dos EUA, Donald Trump
Presidente dos EUA, Donald Trump  • 12/02/2025 REUTERS/Nathan Howard
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A proposta do presidente Donald Trump de fechar o Departamento de Educação dos Estados Unidos carrega potenciais impactos profundos e preocupantes, não apenas para a educação americana, mas também para a economia e a sociedade em geral.

O Departamento administra atualmente mais de US$ 1,6 trilhão em empréstimos federais estudantis e financia aproximadamente 14% dos orçamentos das escolas públicas do país, sendo peça central do sistema educacional dos Estados Unidos.

A justificativa do governo Trump para o fechamento do departamento baseia-se, primordialmente, no argumento das baixas notas dos estudantes do país em testes padronizados internacionais.

O raciocínio sugerido é que, ao eliminar o departamento federal, seria possível devolver poder e autonomia para pais, estados e comunidades locais. Todavia, o governo não esclarece como precisamente esta descentralização contribuiria para melhorar efetivamente os resultados educacionais.

Essa proposta levanta questões críticas quanto à viabilidade legislativa e política da medida. Primeiramente, a aprovação no Congresso americano é incerta, especialmente diante de uma oposição vigorosa do Partido Democrata e mesmo de setores republicanos moderados, que reconhecem os impactos disruptivos de tal política na educação básica e superior.

Pesquisas recentes indicam que 61% dos americanos acreditam que o governo federal deve desempenhar um papel significativo no financiamento da educação pública.

Para efetivamente fechar o Departamento de Educação, Trump precisaria seguir um processo legislativo específico no Congresso: inicialmente, seria necessário apresentar um projeto de lei, que passaria por análise detalhada em comissões especializadas, como a Comissão de Educação e Trabalho na Câmara e a Comissão de Saúde, Educação, Trabalho e Pensões no Senado.

Após debates e audiências públicas, o projeto precisaria ser aprovado em ambas as casas legislativas, com eventuais divergências sendo resolvidas por um comitê de conferência.

A versão final do projeto precisaria ser novamente aprovada em ambas as casas antes de seguir para a sanção presidencial. O presidente poderia então sancionar ou vetar o projeto, sendo que um eventual veto poderia ser derrubado por uma maioria de dois terços no Congresso.

Portanto, o fechamento definitivo do Departamento não pode ocorrer por decreto presidencial isolado.

Além disso, o papel dos sindicatos, especialmente a poderosa Federação Americana de Professores (AFT), com cerca de 1,7 milhão de integrantes, e a Associação Nacional de Educação (NEA), com aproximadamente 3 milhões de integrantes, será decisivo.

Esses sindicatos já demonstraram capacidade significativa de resistência política e mobilização social contra reformas que percebem como ameaças diretas ao sistema público de educação.

Mesmo que o fechamento completo do Departamento de Educação não se concretize politicamente, uma estratégia alternativa já praticada pelo governo Trump em outras agências federais é a desidratação gradual de recursos e autoridade.

Exemplos emblemáticos incluem a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) e o Bureau de Proteção Financeira do Consumidor, que têm enfrentado reduções severas em orçamento e capacidade de operação.

Essas pressões políticas e orçamentárias já são visíveis no setor educacional. Universidades importantes, como Columbia, têm sofrido constrangimentos financeiros e políticos.

Recentemente, Columbia cedeu às exigências do governo Trump para reaver US$ 400 milhões em financiamento federal, após enfrentar investigações federais e pressão direta da administração republicana. Tal cenário gerou insegurança acadêmica, congelamento de contratações, fechamento de laboratórios e demissão de funcionários em diversas instituições de ensino superior.

Essas medidas apresentam riscos significativos, incluindo a deterioração da qualidade educacional, aumento das desigualdades sociais e econômicas e enfraquecimento das instituições acadêmicas norte-americanas no cenário global.

Um relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) enfatiza que países que investem mais na educação tendem a ter maior crescimento econômico e níveis mais altos de igualdade social.

Os desafios estão postos, e o debate público deverá avaliar cuidadosamente as implicações de tais políticas para o futuro da educação nos Estados Unidos.