Maurício Noriega
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Maurício Noriega

Mauricio Noriega é um dos jornalistas esportivos mais reconhecidos do país. Ganhou o prêmio ACEESP de melhor comentarista esportivo de TV seis vezes.

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Futebol está perdendo o jogo para a violência

Estádios e seus entornos são cada vez mais perigosos para quem quer somente assistir aos jogos em paz

Torcedores do Peñarol detidos na Praia do Recreio, zona oeste do Rio
Torcedores do Peñarol detidos na Praia do Recreio, zona oeste do Rio  • Reprodução
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A violência de criminosos e baderneiros disfarçados de torcedores é o maior inimigo do futebol na atualidade. Seja na forma de insultos racistas e xenófobos, em ameaças e emboscadas a jogadores ou de conflitos entre grupos que lembram milícias, os episódios de violência são cada vez mais frequentes.

Os dirigentes de futebol insistem em subdimensionar a gravidade do problema.

No Brasil, CPIs são abertas e encerradas, políticos capitalizam sobre o tema e as brigas e mortes continuam acontecendo.

O episódio mais recente foi a batalha campal protagoniza por torcedores (?) do Peñarol, do Uruguai, antes do jogo contra o Botafogo, no Rio, pela semifinal da Copa Libertadores da América. A ação envolveu furto, agressão, porte ilegal de arma, incêndio, depredação de patrimônio, entre um rosário de crimes. Mais de 300 uruguaios foram presos.

É curioso acompanhar a repercussão do fato no Brasil e nos países vizinhos. O diário esportivo Olé, da Argentina, notório no passado por chamar brasileiros de “macacos” e apostar numa ironia de péssimo gosto, condenou a Polícia Militar do Rio de Janeiro pelo ocorrido. Essa postura é adotada desde a confusão envolvendo torcedores do Boca Juniors e do Fluminense antes da final da Libertadores de 2023. Para o Olé e para a imprensa uruguaia, a polícia brasileira reprime com violência os torcedores.

Claro que há abusos policiais no Brasil, como na Argentina e no Uruguai. Mas de que forma as forças da lei devem combater grupos que atuam como milícias, adotam táticas de guerrilha e simplesmente ignoram o conceito de autoridade?

Na base da ameaça e da extorsão, alguns criminosos que se escondem atrás de torcidas exercem influência sobre dirigentes de clubes e federações esportivas. Um dos envolvidos na confusão no Rio é Edgardo “Chino” Lasalvia, que é empresário de jogadores. Trabalhou com Federico Valverde e Darwin Nuñez, estrelas uruguaias, e agencia Mateo Ponte, jogador do Botafogo, entre outros.

Atualmente, muitos integrantes de torcidas participam da vida política de grandes clubes do futebol brasileiro e sul-americano. Alguns com intenções legítimas, registre-se.

Não se trata de acusar, julgar e condenar torcedores estrangeiros que se envolvem em confusão ou cometem atos racistas no Brasil. Até porque há episódios de racismo de brasileiros contra brasileiros registrados em estádios e cotidianamente. Torcedores brasileiros já se envolveram em confusões fora do país, inclusive com casos de morte.

A questão envolve atitude e medidas duras e concretas contra esse estado de coisas. É preciso uma atuação diplomática conjunta dos governos dos países sul-americanos para combater o crime que se infiltra nas torcidas. Compartilhamento de informações de inteligência, proibição de entrada de torcedores condenados e envolvimento em brigas e atos de vandalismo. O reconhecimento facial deve ser obrigatório nos estádios, com o uso e integração dos bancos de dados de polícias dos países envolvidos e da Interpol.

Um passo adiante deve ser a punição esportiva e pecuniária dos clubes cujos torcedores se envolvam em atos de violência.

Na Inglaterra a situação só começou a melhorar quando, após a Tragédia de Heysel (confronto entre torcedores de Juventus e Liverpool, em 29 de maio de 1985, antes da final da Liga dos Campeões da Europa, que resultou na morte de 39 pessoas), os clubes ingleses foram banidos de competições europeias por cinco anos.

O ato de ir a um grande jogo de futebol na América do Sul está cada vez mais perigoso para aqueles cujo interesse é somente torcer e se divertir.

Resta saber se a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), pródiga em aplicar multas em dólar e arrecadar muito dinheiro com isso, terá coragem de liderar um movimento nesse sentido e entrar de cabeça no combate à violência. Multas apenas engordam o orçamento da entidade e rendem notas oficiais recheadas de termos pomposos.

Na prática, a violência segue triunfando.

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