BC está “falando” muito?
Comentários de Campos Neto voltaram a mexer com expectativas dos investidores
A resposta para o título da coluna é sim, o Banco Central (BC) está “falando” muito. E quando isso acontece o ruído aumenta, exatamente o que está acontecendo nas últimas semanas.
Nesta sexta-feira (30) foi a vez do (ainda) presidente do BC, Roberto Campos Neto, botar fogo no parquinho do mercado financeiro doméstico.
Numa palestra no evento da XP Investimentos, Campos Neto disse com todas as letras que o Copom não vai chancelar uma alta forte da taxa de juros só porque o mercado quer assim.
“O preço que o mercado coloca hoje na curva de juros está errado”, disse.
E avisou que “qualquer ajuste [nos juros], se houver, será gradual”. Em “bancocentralês” isso quer dizer que a Selic pode mesmo subir, mas num ritmo de não mais do que 0,25 ponto percentual.
Campos Neto pareceu querer corrigir aposta do mercado de que o aperto seria maior, levando a Selic para 11% em setembro. Para completar o recado, o (ainda) presidente do BC, disse que com essa fala, ele não estaria sinalizando os próximos passos do Copom: “Não estou dando foward guidance”, ressaltou.
Ora, se dizer que o preço está errado e que qualquer ajuste será gradual não é sinalizar, o que seria?
A dúvida não durou segundos no mercado. Rapidamente os preços se mexeram e a curva de juros teve queda na taxa dos contratos curtos e fez disparar a dos papéis mais longos. Essa “empinada” na curva é um movimento clássico da percepção de que o BC está sendo “dovish”, ou seja, pouco disposto a subir os juros.
Calma que tem mais. Na sua fala em São Paulo, Campos Neto também falou sobre a alta do dólar contra o real, afirmando que o BC vai intervir no câmbio quando achar que deve e que eles têm bala para isso, já que o volume de reservas internacionais é altíssimo (em torno de US$ 350 bilhões).
Minutos depois que ele deixou a plenária do evento, o BC anunciou intervenção com swaps cambiais, um instrumento que simula a venda de dólares e que atende ao apetite do mercado para vários tipos de operações. Nem foi tanto dólar assim, menos de US$ 800 milhões, mas a proximidade dos acontecimentos chamou atenção.
A sexta-feira já tinha começado com uma intervenção mais pesada do BC, com a venda de US$ 1,5 bilhão. Mas essa operação tinha uma razão de ser, já que aconteceu hoje uma mudança no índice de ações brasileiras negociadas lá fora, o que provocaria uma demanda incomum de dólares.
Nem com US$ 2,3 bilhões a mais o mercado acalmou. A moeda americana beliscou uma queda e logo depois voltou a subir. A sexta-feira sendo ultimo dia do mês, também exerce pressão sobre o câmbio, o que só fez aumentar o barulho nos negócios.
O falatório do BC não é apenas de Roberto Campos Neto, o futuro ex-presidente. O futuro novo presidente, Gabriel Galípolo, também deu sua contribuição de ruído com falas seguidas nos últimos dias.
O problema não é apenas a quantidade de falas dos dois – que agora vão viver uma transição de cadeiras até 31 de dezembro.
Apesar de ambos dizerem que os membros do Copom estão coesos, cada um tem dito uma coisa.
“Para cada palavra deles, o mercado mexe R$ 1 trilhão com ativos financeiros”, disse um experiente economista.
O fôlego para esse vai e vem de trilhões é curto e consome não só dinheiro, como credibilidade e confiança sobre a gestão do Banco Central no país.