Empresas dizem que lei ajudará a diminuir desperdício de alimentos no Brasil
A lei nº 14.016 permite que estabelecimentos possam doar sobras de alimentos que ainda estejam próprios para o consumo humano

A Lei nº 14.016, que trata do combate ao desperdício de produtos alimentícios e da doação de excedentes, tem sido bem vista pelas empresas, associações e bancos de alimentos. A lei, publicada no Diário Oficial da União (DOU) no quarta-feira (24), permite que estabelecimentos possam doar sobras de alimentos que ainda estejam próprios para o consumo humano.
Para o head de Sustentabilidade do Grupo Carrefour Brasil, Lucio Vicente, a aprovação da lei é um ponto positivo no combate ao desperdício. “A lei pode encorajar outras redes a fazerem doações de alimentos”. Ele destaca, neste contexto, que o respaldo jurídico pode auxiliar neste processo.
O presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA), João Dornellas, compartilha da mesma visão. Além disso, ele enxerga a lei “com muito bons olhos”.
“Com ela, pequenos estabelecimentos, grandes restaurantes que trabalham com alimentos vão poder criar programas de doação com maior segurança jurídica”, analisa Dornellas.
Em relação à fiscalização e controle dos alimentos, Vicente afirma que o grupo possui uma equipe especializada para atuar nesta questão. “Temos nutricionistas e uma equipe técnica que avaliam a qualidade dos alimentos que são doados”, explica.
Com a aprovação da lei, produtoras, fornecedoras, hospitais, supermercados, cooperativas, restaurantes, lanchonetes e demais empresas que trabalhem com alimentos poderão fazer doações de quantidades excedentes de produtos.
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Segundo Dornellas, a ABIA apoiou o projeto desde o início da tramitação. “Trabalharmos para a aprovação dele [do projeto], esclarecendo a importância dessa lei para os parlamentares e para o governo”, afirma.
Dornellas explica que antes da lei ser aprovada, havia um “risco excessivo ao doador”. “Essa lei ajuda a quebrar essas barreiras, ela facilita a quebra dessas barreiras. Ela responsabiliza o doador apenas em caso de dolo”, diz.
Conforme a lei, para que as doações ocorram, é necessário que os produtos alimentícios – alimentos in natura, industrializados e refeições prontas para o consumo – “estejam dentro do prazo de validade e nas condições de conservação especificadas pelo fabricante”.
Responsabilidade
Vicente analisa o fato de apesar da facilitação que a lei propõe aos fornecedores e produtores de alimentos, isso não deve afetar a responsabilidade do doador ao controlar a qualidade dos produtos que serão entregues.
“A lei não diminui a responsabilidade dos doadores”, diz. Neste caso, Vicente defende que o controle deve ser reforçado.
No entanto, os desafios e a capacidade de pessoal que uma rede multinacional e uma média empresa possui são diferentes. Grande parte das pequenas e médias empresas não podem arcar com o investimento em uma equipe técnica e própria para o controle dos alimentos.
Dornellas acredita que o controle pode ser feito pela própria Vigilância Sanitária. “Tem gente capacitada no governo para fazer a fiscalização. Até nas cidades menores, têm a fiscalização da vigilância sanitária local”, aponta.
Além disso, o presidente da ABIA acredita que não seria necessário, neste caso, aumentar o efetivo da Vigilância. “No âmbito nacional, temos também a Agência Nacional de Vigilância Sanitária [Anvisa] que também fiscaliza”, diz.
Em relação ao auxílio aos pequenos e médios estabelecimentos que tenham interesse em doar, Vicente aponta o trabalho das redes de banco de alimentos, que auxiliam os empreendedores neste processo.
É nesta parte que a rede de banco de alimentos Mesa Brasil, uma iniciativa do Sesc, atua. Presente em todo o território nacional, com 91 unidades, a rede atende 1,4 milhão de pessoas no país.

As empresas que tenham interesse em doar, por exemplo, podem buscar o suporte da rede para que a logística e distribuição sejam organizadas, explica a gerente de assistência do Departamento Nacional do Sesc, Ana Cristina Corrêa Guedes Barros.
Ela afirma que a lei “vem exatamente ao encontro de uma necessidade atual de um país, como o Brasil, de combater o desperdício de alimentos”. A gerente faz um alerta, ainda, para a pandemia do novo coronavírus, que tem impactado a renda e a segurança alimentar de muitas pessoas.
“A estimativa é que, com a pandemia, a gente tenha um incremento enorme de milhões de pessoas que irão para a extrema pobreza. Então, bancos de alimentos e redes de solidariedade terão um papel vital no sentido de trazer respostas rápidas na pandemia”, analisa.
A gerente destaca, ainda, que é necessário que a lei seja ampliada e aprofundada ao longo do tempo. “A lei traz aspectos mais gerais, mas depois, através de decretos, ela será mais detalhada”, analisa.
De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), 821,6 milhões de pessoas passam fome no mundo.
Segundo a lei, as doações dos alimentos excedentes devem ser realizadas de modo gratuito. De acordo com o texto, o objetivo é beneficiar "pessoas, famílias ou grupos em situação de vulnerabilidade ou de risco alimentar ou nutricional".
“A doação poderá ser feita diretamente, em colaboração com o poder público, ou por meio de bancos de alimentos, de outras entidades beneficentes de assistência social certificadas na forma da lei ou de entidades religiosas”, estabelece o texto.
“Um terço do que o planeta produz, em termos de alimentação, vai para o lixo. A gente tem que combater esse problema”, conclui Dornellas.