ANP anuncia acompanhamento diário de estoques de combustíveis no Brasil
Agência declarou sobreaviso no abastecimento, citando cenário geopolítico atual
A Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP) anunciou na terça-feira (22) que passará a acompanhar diariamente os estoques de combustíveis no Brasil, medida que chamou de “sobreaviso no abastecimento”.
Desta forma, os agentes econômicos em território nacional precisarão informar diariamente os estoques que possuem e as importações realizadas.
Segundo a ANP, até o momento, o abastecimento está regular em todo o país, e o sobreaviso busca “somente permitir que esse acompanhamento dos estoques e das importações de produtores e distribuidores seja intensificado”.
O comunicado com o anúncio de sobreaviso determina que as informações sobre estoques e importações sejam enviadas até às 12h de cada dia, e engloba gasolina A, óleo diesel A S 10, óleo diesel A S 500, querosene de aviação (QAV) e gás liquefeito de petróleo (GLP).
A decisão foi tomada devido à “situação geopolítica mundial atual”, com a guerra entre Ucrânia e Rússia. Devido ao conflito, os preços do petróleo, já pressionados, dispararam e passaram os US$ 100, encarecendo os combustíveis.
“O mecanismo do sobreaviso no abastecimento permite o monitoramento dinâmico do abastecimento, subsidiando possíveis ações preventivas”, afirma a ANP em nota.
O anúncio foi feito após a publicação, no dia 10 de março, de uma portaria do Ministério de Minas e Energia que criou o Comitê Setorial de Monitoramento do Suprimento Nacional de Combustíveis e Biocombustíveis.
O objetivo do órgão é “gerenciar as questões inerentes ao suprimento nacional de combustíveis e biocombustíveis” e “intensificar o monitoramento da conjuntura energética corrente, em face da situação geopolítica mundial, com impacto nos fluxos e nas cotações desses energéticos”.
Desabastecimento
Segundo professor Maurício Canêdo, da FGV, a medida é “só uma ferramenta para o órgão regulador acompanhar essa possibilidade [de desabastecimento] mais de perto”, mas não possui um efeito prático em relação aos preços dos combustíveis.
Edmilson Moutinho, professor do IEE-USP, afirma que “do ponto de vista regulatório, é um procedimento padrão. Em tempos de emergência é bom que a agência tenha um acompanhamento mais próximo e possa identificar eventuais problemas de desabastecimento previamente”.
O professor ressalta que a, segundo a ANP, a medida permitiria adotar medidas paliativas ou mitigatórias, mas sem esclarecer quais seriam. “Precisamos saber que medidas são essas. De quais instrumentos dispomos atualmente? Penso que estamos muito enfraquecidos”, diz, citando a falta de estabelecimento de estoques estratégicos pelo país.
“Importadores estão com dificuldades para importar diesel. Também podemos ter problemas com importações de GNL para geração elétrica. A Europa vai consumir todos os excedentes do mercado global e pagará mais caro por eles. Surge então um risco de desabastecimento de diesel? Talvez. Há de se monitorar”, afirma.
Para o Moutinho, a ausência de estoques disponíveis para a ANP gerenciar acaba fazendo com que a agência apenas avise “o governo do problema. Com sorte com boa antecipação”, mas que “caberá ao MME e ao CNPE processar e pensar em soluções”.
Fontes do governo afirmaram à CNN em 10 de março que o reajuste mais recente nos combustíveis feito pela Petrobras, e o maior em mais de um ano, foi realizado para evitar um risco real de desabastecimento no país a partir de abril.
O analista de política da CNN, Caio Junqueira, afirma que a Petrobras estava à época verificando os estoques de gasolina, diesel e GLP nas distribuidoras.
O cenário apontado indicava que, se nada fosse feito, em pouco mais de 20 dias, o diesel seria o primeiro combustível a faltar, seguido de gasolina e do GLP.
Cerca de 30% do petróleo brasileiro é importado, com a Petrobras seguindo a cotação internacional do tipo Brent.
Antes do último reajuste, o preço internacional elevado não compensava a importação e venda no mercado interno por um preço bem menor, o que gerou o risco de desabastecimento. O reajuste não eliminou toda a defasagem, mas reduziu para níveis mais vantajosos às importadoras.
Saiba mais sobre o petróleo e como funciona a sua cotação
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O petróleo é considerado uma commodity. O termo se refere a recursos finitos que têm origem na natureza e são comercializados. No caso, o petróleo é usado principalmente como combustível, mas também dá origem a materiais como o plástico • REUTERS/Vasily Fedosenko
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O petróleo pode ser de vários tipos, dependendo principalmente do seu grau de impureza. Os dois principais, Brent e WTI, são leves (pouco impuros), e a diferença se dá pelo local de negociação: bolsa de Nova York no caso do Brent e bolsa de Londres no caso do WTI • Instagram/ Reprodução
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Os preços do petróleo seguem uma cotação internacional, e flutuam pela oferta e demanda. No Brasil, o preço de referência adotado pela Petrobras - maior produtora no país - é do Brent, seguindo a cotação internacional, em dólar • REUTERS
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Quando se fala da comercialização de petróleo, um fator importante é a Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo). Com 13 membros, ela é responsável por quase 50% da produção mundial de petróleo, e portanto consegue regular a oferta - e preços - pelos fluxos de produção • Reuters/Dado Ruvic
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A partir de 2020, os preços do petróleo foram afetados pela pandemia e pela guerra na Ucrânia. A Opep+ (que inclui países aliados do grupo, como a Rússia) decidiu cortar a produção temporariamente devido à baixa demanda com lockdowns, e os preços caíram. A média em 2020 foi US$ 40, distante da de anos anteriores, entre US$ 60 e US$ 70 • REUTERS
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Em 2021, porém, o cenário mudou, com o avanço da vacinação, os países reabriram rapidamente, e a demanda por commodities decolou, incluindo pelo petróleo. A Opep+, porém, decidiu manter os níveis de produção de 2020, e a oferta baixa fez os preços saltaram, ultrapassando US$ 80 • REUTERS/Nick Oxford
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Já em 2022, a situação piorou. A guerra na Ucrânia, e as sanções ocidentais a um dos maiores produtores mundiais da commodity, a Rússia, fizeram os preços dispararem, ultrapassando os US$ 120. Atualmente, o barril varia entre US$ 100 e US$ 115 • 03/06/2022REUTERS/Angus Mordant
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A alta dos preços do petróleo, porém, trouxe consequências negativas para o Brasil. Como a Petrobras segue a cotação internacional e o dólar está valorizado ante o real, ela subiu o preço nas refinarias, o que levou a uma elevação da gasolina e outros combustíveis. Até o momento, o preço da gasolina já subiu 70% • REUTERS/Max Rossi
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A alta do petróleo não afetou só o Brasil. Países dependentes da commodity, como EUA, Índia e Reino Unido, também viram os preços dos combustíveis subirem, e têm tentado pressionar a Opep+ a retomar os níveis de produção pré-pandemia, o que tem ocorrido lentamente enquanto a organização aproveita para se recuperar das perdas em 2020 • Reuters
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