Análise: ilusão do domínio de Assad sobre a Síria se desfaz com ofensiva rebelde

Insurgentes conseguem avanços em momento que os principais aliados da Síria – Rússia, Irã e Hezbollah – estão todos sob pressão e baixaram a guarda

Ben Wedeman, da CNN
Combatentes entram nos distritos de Rashidin, nos arredores de Aleppo, Síria, na sexta-feira, 29 de novembro.
Combatentes entram nos distritos de Rashidin, nos arredores de Aleppo, Síria, na sexta-feira, 29 de novembro.  • Bakr Alkasem/AFP/Getty Images via CNN Newsource
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“Nosso líder para sempre” era um slogan frequentemente visto na Síria durante a era do presidente Hafez al-Assad, pai do atual presidente sírio.

A perspectiva de que o severo e austero líder sírio viveria para sempre era uma fonte de humor ácido para muitos dos meus amigos sírios quando vivi e trabalhei em Aleppo no final dos anos 1980 e início dos anos 1990.

Hafez al-Assad morreu em junho de 2000. Afinal, ele não era imortal.

Seu regime, no entanto, continua sob a liderança de seu filho Bashar al-Assad.

Houve momentos em que a sobrevivência do regime de Bashar pareceu em dúvida. Quando a chamada Primavera Árabe atingiu a região em 2011, derrubando autocratas na Tunísia, Egito e Líbia, e protestos em massa irromperam no Iêmen, Bahrein e Síria, alguns começaram a escrever epitáfios para a dinastia Assad.

Mas os aliados da Síria – Irã, Hezbollah do Líbano e Rússia – vieram ao resgate. Nos últimos anos, a luta na Síria entre um regime corrupto e brutal em Damasco e uma oposição dividida, muitas vezes extrema, parecia congelada.

Antes rejeitado por seus companheiros autocratas árabes, Bashar al-Assad estava gradualmente recuperando a duvidosa respeitabilidade que os regimes árabes concedem uns aos outros.

O pesadelo da guerra civil síria estava chegando ao fim?

Bashar al-Assad havia vencido?

Certamente, essa era a suposição de muitos, apesar do fato de que grandes partes da Síria eram controladas por uma milícia curda apoiada pelos EUA e facções sunitas apoiadas pela Turquia; que o Hezbollah, o Irã e a Rússia apoiavam o regime; que os EUA controlavam áreas no leste da Síria; que Israel conduzia ataques aéreos sempre que e onde bem entendesse; e que o Estado Islâmico, embora derrotado, ainda conseguia lançar ataques.

O fato do governo em Damasco ainda estar de pé depois de tudo isso já parecia uma conquista.

Bashar al-Assad, que governa a Síria desde 2000. • Alexei Druzhinin - 7.jan.2020/TASS via Getty Images
Bashar al-Assad, que governa a Síria desde 2000. • Alexei Druzhinin - 7.jan.2020/TASS via Getty Images

No entanto, era uma ilusão de vitória do regime, repentinamente destruída nesta semana depois que a oposição rebelde, liderada pelo Hayat Tahrir al-Sham (HTS) — antigamente conhecido como "Frente Al-Nusra" e afiliada à Al-Qaeda —, lançou uma ofensiva a partir da província de Idlib e em apenas 72 horas conseguiu invadir o centro de Aleppo.

No sábado à noite (30), perfis sírios nas redes sociais estavam falando sobre as forças do governo entrando em colapso na parte norte do país, com rebeldes avançando para a cidade central de Hama.

Foi lá, no início de 1982, que o pai de Bashar fez seu Exército e serviços de inteligência massacrarem milhares de seus oponentes, encerrando uma revolta liderada pela Irmandade Muçulmana.

Por que, em apenas alguns dias, a barragem se rompeu?

A explicação óbvia é que os principais aliados da Síria – Rússia, Irã e Hezbollah – estão todos sob pressão e baixaram a guarda.

O Hezbollah — que desempenhou um papel fundamental no fortalecimento do regime sírio durante os dias mais sombrios da guerra civil — retirou a maior parte de suas tropas de volta para casa depois de 7 de outubro de 2023, para lutar contra Israel, que posteriormente matou a maior parte da liderança sênior do grupo.

A Rússia também desempenhou um papel fundamental no fortalecimento do governo em Damasco após ter despachado tropas e aviões de guerra para a Síria em setembro de 2015.

No entanto, agora a principal prioridade de Moscou é a guerra na Ucrânia. E, finalmente, os conselheiros e bases do Irã na Síria têm sido alvo frequente de ataques de Israel no último ano.

Além de tudo isso, há a realidade básica da longevidade.

Presidentes Vladimir Putin, da Rússia, e Bashar Al-Asad, da Síria • Imprensa do Kremlin/Anadolu Agency/Getty Images
Presidentes Vladimir Putin, da Rússia, e Bashar Al-Asad, da Síria • Imprensa do Kremlin/Anadolu Agency/Getty Images

A dinastia Assad está no poder há 53 anos, desde 1971. Embora sua mera sobrevivência seja uma conquista, ela tem pouco mais a mostrar.

A corrupção endêmica e a má gestão eram um fardo para a economia mesmo antes da guerra civil estourar em 2011.

Desde então, a vida do sírio médio foi de mal a pior. A guerra deixou centenas de milhares de mortos, enquanto outros milhões foram deslocados internamente ou levados ao exílio.

Vez ou outra desde 1971, a dinastia Assad sobreviveu a desafios internos e externos e viveu para lutar outro dia. No entanto, nada, nem regimes, nem líderes, dura para sempre.

Tudo eventualmente chega ao fim.

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