É falso pedido de prisão em flagrante contra o ministro do STF Alexandre de Moraes após as eleições
É falso que tenha sido determinada a prisão em flagrante do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Alexandre de Moraes como afirma, em vídeo, um apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL)
Falso: É falso que tenha sido determinada a prisão em flagrante do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Alexandre de Moraes como afirma, em vídeo, um apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL). Para fazer a afirmação, ele usa uma notícia-crime feita por dois advogados em setembro de 2021.
Conteúdo investigado: Vídeo em que um homem afirma que foi protocolada a prisão em flagrante do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em meio a uma manifestação de apoio ao presidente Jair Bolsonaro (PL) em uma rodovia, onde ocorreram bloqueios, e os participantes comemoram.
Onde foi publicado: Twitter.
Conclusão do Comprova: É falso que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do TSE, Alexandre de Moraes, tenha sido alvo de um mandado de prisão em flagrante, como afirma um participante de manifestação de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro após o 2º turno das eleições.
No discurso, o homem cita um pedido do advogado e promotor aposentado Wilson Koressawa, que foi de fato apresentado como notícia-crime à Procuradoria-Geral do Ministério Público Militar (MPM) em setembro de 2021. Koressawa e outro advogado, Getúlio Alves de Lima, pediram a prisão ou afastamento dos ministros da Suprema Corte na época (exceto de Kássio Nunes Marques) por agirem em contraposição a indicações do governo federal na condução da pandemia de covid-19.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação: Até o dia 4 de novembro o post no Twitter tinha 3,5 milhões de visualizações e 361 comentários.
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou entrar em contato com o autor da publicação pelas redes sociais, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
Como verificamos: Para começar, procuramos no Google por “prisão do ministro Alexandre de Moraes”. Como resultado da busca, apareceram várias notícias desmentindo o vídeo aqui analisado (Antagonista, Metrópoles, Gaúcha ZH e Correio Braziliense e Poder360). Na sequência, pesquisamos quem era Wilson Koressawa, apontado como sendo o autor do pedido de prisão. Também encontramos a notícia-crime protocolada por ele. Para saber onde tinha sido gravado o vídeo, procuramos no Google Maps pelos locais em Santa Catarina que registraram manifestação de bolsonaristas que fossem perto de uma loja da Havan. Comparamos os locais com as imagens do vídeo.
O pedido de prisão apresentado
Em 3 de setembro de 2021, os promotores aposentados Wilson Koressawa e Getúlio Alves de Lima protocolaram na Procuradoria-Geral de Justiça do Ministério Público Militar, em Brasília (DF), uma notícia-crime requerendo a “imediata prisão em flagrante” ou afastamento dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Notícia-crime é uma notificação sobre um possível fato criminoso apresentada a autoridades competentes a fim de que sejam iniciadas investigações, como explica o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O pedido lista os nomes do então presidente da Suprema Corte, Dias Toffoli, e de Luiz Fux, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes. O ministro Kassio Nunes Marques, primeiro indicado do presidente Jair Bolsonaro ao STF, foi o único integrante da Corte que não teve o nome citado no pedido.
De acordo com os procuradores aposentados, os ministros estariam incurso nas penas dos crimes de genocídio e tortura por terem feito, com apoio da TV Globo, a “divulgação de notícias inverídicas, alarmantes e causadoras de indevido pânico à população” sobre a covid-19. Os advogados alegam abuso de poder dos representados com finalidade “político-ideológica”, por agirem em contraponto a atitudes do governo federal diante da pandemia.
Os procuradores citam, também, que os ministros estavam contribuindo “para impedir o fornecimento de medicamentos enviados pelo Poder Executivo Federal, para a cura do coronavírus”. Não há comprovação científica de eficácia de remédios para prevenir a covid-19.
Ao Comprova, o Ministério Público Militar informou que a instauração da notícia de fato foi indeferida “por não configurarem os fatos narrados lesão ou ameaça de lesão aos interesses ou direitos tutelados pelo Ministério Público Militar”.
“A Justiça Militar da União é absolutamente incompetente para conhecer de pedidos relativos ao afastamento dos noticiados dos cargos que ocupavam, à suspensão de decretos estaduais, à reabertura dos comércios, à suspensão de medidas restritivas, à cassação da concessão da Rede Globo de Televisão etc., inexistindo, em consequência, atribuição do Ministério Público Militar sobre tais matérias”, explicou a instituição, que afirmou ter remetido o expediente à Procuradoria-Geral da República por ofício, para conhecimento.
Em quais circunstâncias um ministro do STF pode ser preso
Um ministro do STF, assim como o presidente da República, senadores e outras autoridades, têm foro privilegiado, direito concedido especificamente a cargos de autoridades com relação ao julgamento de processos criminais. “Por isso, se um ministro vier a quebrar a lei penal, se considera que ele teria cometido um crime comum. Neste caso, a investigação tem que ser iniciada pela PGR [Procuradoria-Geral da República], que ofereceria uma denúncia se considerar que há indícios de crime. Essa denúncia seria julgada pelos demais ministros”, explica Rubens Glezer, professor de Direito Constitucional na FGV-SP (Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo). O ministro também pode ser responsabilizado por crime de responsabilidade, ou seja, sofrer impeachment. “Eventual crime de responsabilidade de ministro do STF é julgado no Senado Federal. Se sofrer impeachment, o ministro é destituído do cargo”, concluiu Glezer.
Há cinco hipóteses de cometimento de crime de responsabilidade previstas no Artigo 39 da Lei 1079/1950 (Lei do Impeachment) que podem levar ao impedimento de ministros do STF. São elas: alterar decisão ou voto já proferido em sessão do Tribunal, exceto por via de recurso; proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa; exercer atividade político-partidária; ser patentemente desidioso (ocioso) no cumprimento dos deveres no cargo; e proceder de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro de suas funções.
O Comprova procurou o Supremo Tribunal Federal para saber qual o posicionamento do ministro Alexandre de Moraes sobre o fato e o que o STF teria a dizer sobre esse tipo de manifestação. A resposta foi ‘sem comentário’.
Quem é Wilson Koressawa
Wilson Koressawa, que é citado no discurso como autor do pedido de prisão de Alexandre de Moraes, é promotor aposentado do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Ele também foi juiz do Tribunal de Justiça do Amapá entre 1994 e 2001. Atualmente, ele é advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF) com o número 46466.
Em janeiro deste ano, ele se tornou conhecido ao pedir a prisão do âncora do Jornal Nacional, William Bonner, por ele incentivar a vacinação contra a covid-19. O pedido foi negado pela justiça do DF. No mesmo mês, a OAB abriu processo contra o advogado no Tribunal de Ética e Disciplina (TED). A OAB-DF informou ao Comprova que o processo é sigiloso.
Nas eleições de 2022, Koressawa se candidatou a deputado federal por Minas Gerais pelo PTB, mas não foi eleito. O Comprova tentou contato com Koressawa pelo Instagram, mas não obteve retorno até o fechamento desta checagem. Também foi pedido o contato dele para a OAB-DF, mas a entidade informou que ele não registrou nenhum telefone no cadastro.
Onde o vídeo foi gravado
O vídeo foi gravado por um grupo de bolsonaristas que ocupava as duas faixas da BR-101, no km 215 (Palhoça), próximo à Parada Havan, em Santa Catarina. O trecho dá acesso à região serrana do estado e ficou interditado entre a noite de domingo, 30 de outubro, e a manhã de quarta-feira, 2 de novembro. As imagens começaram a circular no Twitter na terça-feira (1).
Para identificar o local onde foram feitas as imagens, o Comprova procurou o primeiro perfil a compartilhar a gravação no Twitter, o Todo Dia um Catarinense Passando Vergonha, mas não teve resposta.
Nas imagens, alguns elementos foram usados como marcas de localização, a exemplo da Estátua da Liberdade da Loja Havan, as montanhas ao fundo, a torre de identificação do Brasil Atacadista, e a loja de caminhões Iveco Carboni.
Usando o Google Street View, buscamos as lojas Havan em Santa Catarina que estão localizadas em BRs que tiveram bloqueios de grupos bolsonaristas. Buscando os elementos de localização que aparecem no vídeo, chegamos ao km 215 da BR-101, em imagens capturadas em agosto deste ano.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. No atual momento, conteúdos que contêm desinformação sobre ministros do STF podem gerar desconfiança nas pessoas quanto ao Poder Judiciário e consequentemente ameaçar a democracia.
Outras checagens sobre o tema: Ao menos seis veículos de comunicação fizeram a mesma checagem: O Antagonista publicou que é “fake” que pedido de prisão de Alexandre de Moraes tenha sido protocolado; o Metrópoles, por meio da coluna do jornalista Guilherme Amado, divulgou que bolsonaristas caíram em “fake news” sobre prisão de Moraes e festejaram; a Gaúcha ZH postou matéria com o título: “bolsonaristas comemoram prisão fake de Alexandre de Moraes durante ato em Porto Alegre”; o Correio Braziliense publicou a comemoração de bolsonaristas da “ação falsa” sobre a prisão; e o Poder360 noticiou que “bolsonaristas comemoram notícia falsa sobre prisão de Moraes”.
Investigado por: CNN Brasil, Correio Braziliense, Estado de S.Paulo e Poder 360; Verificado por: Uol, NSC, A Gazeta, Folha de S.Paulo, Plural Curitiba e CBN Cuiabá