Em reunião com Guajajara, Zanin demonstra preocupação com pequenos proprietários de terras
Ministra dos Povos Indígenas se encontrou com ministro do STF às vésperas da retomada do julgamento do marco temporal
Em audiência com a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin manifestou preocupação sobre a possibilidade de demarcações de terras indígenas em pequenas propriedades rurais.
Zanin se encontrou com Guajajara no gabinete dele nesta terça-feira (29).
A reunião foi marcada no fim da semana passada, mas a data agendada foi às vésperas da retomada do julgamento do marco temporal na Corte. Oficialmente, o encontro foi uma "visita de cortesia". Também participou do encontro Eloy Terena, secretário-executivo da pasta.
Diálogo sobre marco temporal
O foco da conversa foi a situação da demarcação de terras indígenas. Esse é o principal ponto da tese do marco temporal, que coloca em debate se os povos originários podem reivindicar apenas terras ocupadas até a promulgação da Constituição Federal de 1988.
Segundo interlocutores, a ministra manifestou preocupação com o marco temporal. Zanin teria questionado sobre os procedimentos de demarcação e expressou atenção com possibilidade de promulgação de terras em territórios de pequenos agricultores, cidades e vilarejos.
Guajajara teria frisado que indígenas não reivindicam terras em cidades grandes e quando áreas demarcadas estão em vilarejos ou pequenas propriedades, os ocupantes têm prioridade de reassentamento.
A agenda foi considerada positiva por aliados de Guajajara, já que foi a primeira oportunidade de a ministra conversar reservadamente com Zanin.
A avaliação no Ministério dos Povos Indígenas é de que a questão do marco temporal precisa ser solucionada no julgamento do STF.
Para os integrantes da pasta, o projeto de lei que trata do tema já avançou com rapidez no Senado e tem no texto “jabutis” que são considerados péssimos para os indígenas, como possibilidade de permitir a mineração em territórios.
VÍDEO - 'Marco temporal é a maior privatização de terras do país', diz Ailton Krenak
Retomada
O julgamento que será retomado nesta quarta (30) está 2 a 1 para derrubar a tese do marco temporal.
A presidente do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber, marcou a retomada da análise em plenário assim que André Mendonça devolveu o processo do pedido de vistas.
Mendonça pediu vistas em junho e durante a mesma sessão, Weber afirmou que gostaria de votar nessa ação antes da aposentadoria dela, em outubro.
Votos
- Edson Fachin
O relator do caso, ministro Edson Fachin, manifestou-se contra o marco temporal. Para o magistrado, a Constituição reconhece o direito de permanência desses povos independentemente da data da ocupação.
- Nunes Marques
O ministro Nunes Marques, por sua vez, votou a favor da tese. Considerou que o marco deve ser adotado para definir a ocupação tradicional da terra por indígenas. Em sua justificativa, ele disse que a solução concilia os interesses do país e os dos povos originários.
- Alexandre de Moraes
O ministro Alexandre de Moraes votou contra a tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas, mas avançou em determinados pontos para além da proposta do relator. A posição pode ser vista como uma espécie de “caminho do meio” em prol de conciliar pleitos de indígenas e de produtores rurais.
Entre as propostas do ministro, há a possibilidade de indenização prévia a fazendeiros que tenham ocupado de boa-fé territórios reconhecidos como de tradicional ocupação indígena. Diferente de como é hoje, Moraes propôs que os ocupantes sejam indenizados pelo valor da terra em si e por eventuais benfeitorias feitas no local.
O ministro também defendeu a possibilidade de haver uma “compensação” aos povos originários, para terras em que houver uma ocupação “consolidada” por não indígenas ou em que a demarcação seja contrária ao interesse público. Nesses casos, seria concedido aos indígenas um território equivalente ao de tradicional ocupação.
Entidades e organizações indígenas reconhecem a importância de Moraes ter votado para invalidar a tese do marco temporal, mas criticam as medidas propostas pelo ministro, como a indenização pela terra e a possibilidade de compensação de territórios considerados consolidados.