Remédio pediátrico para esquistossomose começa a ser produzido em 2022

Medicamento será fabricado pela Fiocruz. Doença parasitária endêmica afeta cerca de 200 milhões de pessoas em todo o mundo, sendo as crianças as mais afetadas

Isabelle Resende, da CNN, no Rio de Janeiro
Espécime de Schistosoma mansoni, parasita que causa a esquistossomose  • CDC / EUA
Compartilhar matéria

A partir de março de 2022, o Instituto de Tecnologia em Fármacos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) vai começar a produzir os lotes-piloto do medicamento de uso pediátrico Praziquantel, indicado para a esquistossomose.

A doença parasitária afeta cerca de 200 milhões de pessoas em todo o mundo – metade são crianças. O medicamento está na última fase de testes clínicos e deve estar disponível em 2024.

O remédio é solúvel em água, o que facilita a administração em crianças menores de seis anos de idade.

Até então, o medicamento disponível para essa doença não tem uma versão adequada para o público infantil, o que dificulta o tratamento e pode trazer consequências graves às crianças como anemia, raquitismo, deficiência na capacidade de aprendizado e inflamação crônica dos órgãos, podendo levar a morte.

De acordo com o gerente do projeto da Fiocruz, Daniel Lacerda, o processo de desenvolvimento do Praziquantel (PZQ) pediátrico está na fase final.

“Os estudos clínicos de fase III, que estavam sendo realizados no Quênia e na Costa do Marfim, finalizaram a etapa de recrutamento e administração do produto nos pacientes. Agora, entrou na etapa de conciliação e análise final de todos os resultados para fazermos o fechamento do relatório, previsto para o início do próximo ano", declarou.

"Uma análise preliminar demonstrou bons resultados, mas temos que aguardar o relatório final para confirmação e divulgação completa”, pondera.

Em paralelo, Farmanguinhos/Fiocruz está na fase de finalização dos requisitos e de toda documentação de qualidade necessária para a fabricação dos lotes de validação do produto.

Os passos são imprescindíveis para compor o dossiê a ser submetido à Agência Regulatória Europeia (EMA) e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), para obtenção do registro do medicamento, além da pré-qualificação junto à Organização Mundial da Saúde (OMS).

A esquistossomose é uma doença endêmica, ou seja, que atinge a população residente em algumas regiões tropicais, especialmente onde não há saneamento básico.

Ela causa uma infecção produzida pelo parasita Schistosoma mansoni, da família Schistosomatidae. A doença possui baixa letalidade e as principais causas de óbito estão relacionadas às formas clínicas graves.

No Brasil, a esquistossomose ainda é um importante problema de saúde pública e por isso o governo brasileiro vem sendo signatário em vários compromissos junto à Organização Pan Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) para eliminação da esquistossomose como problema de saúde pública.

A transmissão da doença ocorre quando o indivíduo infectado elimina os ovos do verme por meio das fezes humanas. Em contato com a água, os ovos eclodem e liberam larvas que infectam os caramujos, hospedeiros intermediários que vivem nas águas doces

A esquistossomose está presente de forma mais intensificada em 19 estados brasileiros. São áreas com transmissão endêmicas que compreendem os Estados de Alagoas, Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba, Sergipe, Espírito Santo e Minas Gerais, com predominância no norte e nordeste deste estado.

No Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul, Goiás e no Distrito Federal, a transmissão é focal, não atingindo grandes áreas.

Atividades escolares durante a pandemia de Covid-19 na cidade de Jundiaí (SP) / Pedro Amora/Prefeitura de Jundiaí
Atividades escolares durante a pandemia de Covid-19 na cidade de Jundiaí (SP) / Pedro Amora/Prefeitura de Jundiaí

No período de 2009 a 2019, segundo dados do Sistema de Informação do Programa de Controle da Esquistossomose (SISPCE), foram registrados 423.117 casos da doença. O percentual de positividade para S. mansoni nas áreas endêmicas apresentou variações de positividade de 5,20% em 2009 e 3,22% em 2019.

Consórcio

O Consórcio Praziquantel Pediátrico, fundado em julho de 2012 como a primeira parceria internacional público-privada sem fins lucrativos para a esquistossomose, tem apoio de especialistas mundiais em doenças infecciosas parasitárias tropicais e é a única parceria que atua com a faixa etária em idade pré-escolar.

O objetivo do consórcio é desenvolver, registrar e fornecer acesso a uma formulação pediátrica de praziquantel para o tratamento da esquistossomose em crianças em idade pré-escolar, com comprovada eficácia, segurança e propriedades de sabor aceitáveis.

A formulação também deve suportar os desafios apresentados por um clima tropical. O programa está atualmente na fase de desenvolvimento clínico.

O Consórcio é composto por Farmanguinhos/Fiocruz, Merck KGaA (Alemanha), Astellas Pharma Inc. (Japão), Swiss TPH (Suíça), Lygature (Holanda), SCI (Reino Unido), Kenry (Quênia) e Université Félix Houphouët-Boigny (Costa do Marfim), sendo o projeto financiado por Bill & Melinda Gates Foundation (Estados Unidos), Global Health Innovative Technology Fund (Japão) e European & Developing Countries Trials Partnership (Europa).