Américo Martins
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Américo Martins

Especialista em jornalismo internacional e fascinado pelo mundo desde sempre, foi diretor da BBC de Londres e VP de Conteúdo da CNN; já visitou mais de 70 países

Crise entre Venezuela e Brasil enterra esperanças ocidentais de diálogo com Maduro

Vários países democráticos viam as tentativas de conversa propostas por Lula como a última alternativa para influenciar o processo político venezuelano

Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro  • 03/08/2024REUTERS/Maxwell Briceno
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A crise entre Venezuela e Brasil enterra qualquer esperança que o mundo democrático tinha de poder estabelecer um diálogo adulto e responsável com o ditador Nicolás Maduro.

Governos de vários países ocidentais viam as tentativas de conversa propostas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva como uma última alternativa para influenciar minimamente o processo político venezuelano.

Essa estratégia foi discutida por Lula com vários líderes mundiais, inclusive com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, durante uma ligação entre os dois, feita a pedido da Casa Branca, logo depois que as fraudes eleitorais na Venezuela ficaram claras.

Esses países acreditavam que uma mistura de mais sanções econômicas contra Caracas com a possibilidade de diálogo poderia levar Maduro a fazer alguma concessão – como, por exemplo, diminuir a repressão política ou tentar algum tipo de acordo com a oposição para pacificar o país.

Por isso, diplomatas de várias nações acompanhavam de perto os movimentos do Itamaraty para tentar convencer Maduro a conversar.

Não funcionou.

Agora, esses mesmos países dizem que não existe mesmo nenhum caminho diplomático possível, neste momento, para restabelecer a democracia no país vizinho.

Pior do que isso. Uma importante fonte diplomática de um influente país europeu disse à CNN que também não vê nenhuma outra alternativa viável para restabelecer o diálogo com Caracas. Com isso, ainda mais sanções devem ser impostas ao regime venezuelano.

A mesma fonte admite, no entanto, que essas medidas também tendem a não funcionar completamente, já que a ditadura venezuelana conta com o apoio de outros países autoritários como a China e a Rússia – forças que ajudariam a manter viva, mesmo que funcionando por aparelhos, a economia venezuelana.

Além de tudo isso, a fuga do candidato presidencial oposicionista Edmundo González para a Espanha também não ajudou o ocidente a aumentar a pressão sobre Maduro. Afinal, o homem que diz ter vencido a disputa eleitoral nem se encontra mais no país.

O Itamaraty não comenta a posição dos países ocidentais.

Mas fontes brasileiras que acompanham de perto a crise reconhecem que vários outros governos já jogaram a toalha e desistiram de influir no processo venezuelano.

O problema é que isso facilitaria ainda mais a atuação repressora da ditadura de Caracas.

A análise dessas fontes é que o Brasil, ao contrário de outras nações, não pode simplesmente desistir da Venezuela.

Até porque o país é agora responsável pela embaixada da Argentina em Caracas, onde se encontram opositores de Maduro que querem fugir da repressão chavista.

O pedido de salvo-conduto a esses opositores, aliás, foi um dos fatores que irritou o Brasil e levou o presidente Lula a bloquear a entrada da Venezuela nos Brics.

Os novos capítulos da crise serão desenhados diretamente por Caracas, já que o Itamaraty pretende não retaliar, pelo menos por enquanto.

Com a bola em seu campo, Maduro pode simplesmente esperar – sabendo que o Ocidente não tem como forçar mudanças neste momento.