Análise: BC sobe o tom e deixa lição de casa ao governo sobre juros
Ata do Copom foi mais dura e divergiu de teses que embalam o discurso de líderes governistas sobre o cenário econômico


Há vários meses, aliados próximos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva repetem como um mantra uma premissa sobre o quadro que se desenha para a economia: o cenário externo vai ajudar e o Brasil terá condições para iniciar um ciclo de queda dos juros em 2025. Os mais próximos de Lula costumam dizer que o chefe tem um olhar positivo sobre esse tema. Mas o Banco Central não compartilha nem de longe de tanto otimismo.
A ata do Comitê de Política Monetária divulgada ontem veio com tom mais duro. O documento traz os principais pontos da reunião que decidiu subir a Selic para 10,75% – a primeira alta desde o início do novo governo Lula. E veio recheado de menções à necessidade de o País ter “cautela” para enfrentar um cenário que é “desafiador”.
O BC deixou claro que discorda radicalmente da teoria defendida à exaustão por aliados de Lula de que a perspectiva de redução dos juros nos Estados Unidos puxará a Selic para baixo aqui no Brasil.
“O Comitê reiterou que não há relação mecânica entre a condução da política monetária norte-americana e a determinação da taxa básica de juros doméstica, tampouco entre a taxa de câmbio e a determinação doméstica da taxa de juros”, afirma o texto, que reforça mais uma vez a necessidade de atenção com um aquecimento da economia em ritmo maior que o esperado.
Fora diversos alertas. Mas nada foi tão enfático no documento quanto a cobrança explícita ao governo Lula na área fiscal. O comitê já havia dado sinais nessa direção no comunicado emitido logo após a reunião da semana passada. Desta vez, foi mais forte. O texto fala em “o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal”. E manifesta preocupações quanto ao estímulo ao crédito, em meio a incertezas sobre a estabilização da dívida pública.
Tudo isso coroado com a ressalva de que o governo precisa, principalmente, dar credibilidade à sua política fiscal. “Uma política fiscal crível, embasada em regras previsíveis e transparência em seus resultados, em conjunto com a persecução de estratégias fiscais que sinalizem e reforcem o compromisso com o arcabouço fiscal nos próximos anos são importantes elementos para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de riscos dos ativos financeiros consequentemente impactando a política monetária”, diz a ata
O Copom fala na necessidade de uma política monetária mais contracionista, mas opta por não fornecer sinais sobre os próximos passos do colegiado a respeito da taxa básica de juros. Disse que tudo vai depender da convergência das expectativas para a inflação à meta. Fica a mensagem de que muito do que vem pela frente vai depender de um agente: o próprio governo.