Fernanda Magnotta
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Fernanda Magnotta

PhD especializada em Estados Unidos. Professora da FAAP, pesquisadora do CEBRI e do Wilson Center. Referência brasileira na área de Relações Internacionais

Lei de Trump ampliará dívida dos EUA e deve aumentar desigualdade no país

A One Big Beautiful Bill Act combina cortes de impostos para os mais ricos com aumento da dívida pública, aprofundando desigualdades e gerando risco fiscal para os Estados Unidos.

Presidente dos EUA, Donald Trump
Presidente dos EUA, Donald Trump27/06/2025REUTERS/Ken Cedeno  • Presidente dos EUA, Donald Trump 27/06/2025 REUTERS/Ken Cedeno
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A “One Big Beautiful Bill Act” (OBBBA), recentemente aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos, é um retrato fiel da era Trump 2.0: ambiciosa em escala, agressiva em conteúdo e embalada em retórica triunfalista.

Apelidada pelo próprio presidente de “Big Beautiful Bill”, a medida representa um pacote legislativo abrangente que reflete a essência da agenda trumpista: cortes de impostos em larga escala, endurecimento na política migratória, mudanças severas nas regulações ambientais e no sistema de proteção social.

Mas por trás do nome publicitário e da aparência de ousadia legislativa, o que se revela é um projeto profundamente controverso, que explora desigualdades sociais e coloca os Estados Unidos em alerta do ponto de vista fiscal.

 

Aprovada pela Câmara em maio e confirmada pelo Senado agora, depois de algumas mudanças, a OBBBA estende de forma permanente os cortes de impostos do Tax Cuts and Jobs Act de 2017 e vai além. Introduz novas deduções, como isenções fiscais para gorjetas e horas extras, crédito para filhos e benefícios a quem compra veículos produzidos nos Estados Unidos.

Ao mesmo tempo, impõe exigências de trabalho para acesso ao Medicaid, reduz drasticamente recursos de programas como o SNAP (vale-alimentação), desmonta incentivos à energia limpa, e amplia maciçamente os recursos para segurança de fronteira e defesa, inclusive com financiamento para deportações em massa e para o chamado “Golden Dome”, um sistema de defesa antimísseis de última geração.

Pontos de contestação

As críticas são numerosas e vêm de economistas, especialistas em políticas públicas, organizações da sociedade civil e até mesmo de setores moderados do próprio Partido Republicano.

O principal ponto de contestação é a distribuição assimétrica dos benefícios: enquanto os mais ricos ganham com generosos cortes tributários, os mais pobres arcam com a perda de direitos e serviços essenciais.

Estudos do Escritório de Orçamento do Congresso (CBO) apontam que a lei deve aumentar a dívida pública em até US$ 2,8 trilhões até 2034, sem previsão clara de compensações fiscais.

Paralelamente, estima-se que 10 a 12 milhões de norte-americanos possam perder o acesso ao Medicaid por não atenderem às novas exigências. A política migratória também é alvo de duras críticas: a militarização da fronteira, somada à expansão do ICE, acentua a criminalização da imigração, com sérias consequências humanitárias e legais.

Impacto na transição energética

Do ponto de vista climático, a reversão de estímulos à energia limpa enfraquece o já frágil compromisso dos Estados Unidos com a transição energética. E a proibição de regulação estadual sobre inteligência artificial por uma década retira dos estados a possibilidade de proteger seus cidadãos em um campo tecnológico de rápido avanço e alto risco.

A lei revela, de forma clara, uma determinada escolha de prioridades econômicas. Os principais beneficiários são segmentos já bem posicionados na estrutura social, como famílias de alta renda, grandes empresas e setores tradicionais da indústria, enquanto os custos recaem, em grande parte, sobre populações mais vulneráveis e dependentes de serviços públicos.

Além da redistribuição regressiva de recursos, a proposta levanta sérias preocupações fiscais: ao combinar cortes de receita com aumento expressivo de gastos em defesa e segurança, ela contribui para um desequilíbrio orçamentário significativo, projetando um aumento da dívida pública da ordem de trilhões de dólares na próxima década.

Trata-se, portanto, de uma política ambiciosa, mas que impõe riscos consideráveis à sustentabilidade fiscal e à equidade social no longo prazo. A ver.