Gilvan Bueno
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Gilvan Bueno

Especialista em finanças, mercado de capitais e educação financeira. Foi sócio e gerente educacional no mercado financeiro. Trabalhou em bancos de investimentos e corretoras. Foi palestrante no Fórum Global South Financiers 2025, realizado em Beijin, China.

Brasil está no cheque especial, e sucesso fiscal virá do corte de gastos

Mesmo que aumente a receita, se não controlar os gastos, continuaremos com déficit público

Cédula de real ao fundo de gráficos
Ouvimos de tudo, mas não o mais importante: o sucesso da política fiscal virá do corte de gastos, pois temos 95% da receita comprometida  • Anton Petrus / Getty Images
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O país está no cheque especial desde 2014: gastamos mais de R$ 900 bilhões em juros da dívida pública federal.

O raciocínio natural para correção é verificar e reduzir os gastos. Assim nasceu o teto de gastos, implementado no governo Temer por meio da Emenda Constitucional 95, de 2016. A medida limitava o crescimento das despesas à inflação.

O seu objetivo era controlar o crescimento dos gastos públicos federais, após anos de aumento forte das despesas e do déficit público. Precisamos revisitar um dos três pilares do Plano Real: câmbio flutuante, superávit primário e metas de inflação.

A criação do teto de gastos foi importante para combater a grave crise fiscal e econômica (recessão de 2015-2016), e o governo buscava sinalizar responsabilidade fiscal para tentar recuperar a confiança dos mercados e controlar o endividamento.

Importante revisar os números desta recessão para entender as consequências de uma crise fiscal e econômica no Brasil:

  • PIB caiu quase 7% em dois anos (2015-2016).
  • Inflação estourou para 10,67% em 2015.
  • Desemprego subiu de 6,8% para 11,5%.
  • Dívida/PIB subiu de 53,6% para quase 70%.

A sua construção foi importante para conter o crescimento da dívida pública nos primeiros anos. Contudo, ao longo do tempo, o teto foi considerado rigoroso demais e perdeu credibilidade, devido a várias exceções criadas.

Nasceram assim os gastos extraordinários.

Em 2024, surgiu o Projeto de Lei Complementar 93/2023), chamado de arcabouço fiscal, um conjunto de regras para controlar os gastos públicos no Brasil, substituindo o antigo teto de gastos.

A sua regra básica é que as despesas podem crescer acima da inflação, mas com um limite atrelado ao crescimento das receitas e metas fiscais.

Em 2025, o orçamento federal brasileiro terá 95% do dinheiro arrecadado já comprometido com os gastos em despesas obrigatórias definidas por leis e pela Constituição. Elas são: Previdência + Pessoal + Benefícios assistenciais.

Acredito ser importante explicar a diferença entre despesas obrigatórias e despesas discricionárias.

  • Despesas obrigatórias → o governo é legalmente obrigado a pagar.
  • Despesas discricionárias → o governo escolhe quanto e onde gastar (investimentos, custeio da máquina, etc.).

Chegamos no momento final deste pensamento, a divulgação o Relatório de Receitas e Despesas do governo (também chamado de Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas), um documento fundamental para a gestão fiscal do Brasil.

Através dele temos a percepção se governo irá cumprir suas metas fiscais. Caso tenha o risco de não cumprir, a máquina pública é obrigada a tomar medidas para bloquear gastos, também chamado contingenciamento.

Este bloqueio precisa ser factível, com números precisos, comunicação clara e que todos tenham a percepção que ele será crível.

Então quando ouvimos que o sucesso do contingenciamento, leia-se, geração de receita, seria através do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), muitas incertezas surgiram. Logo em seguida, trouxemos a tributação das bets, aumento da alíquota do CSLL para os bancos e tributação das LCI e LCAs.

Ouvimos de tudo, mas não o mais importante: o sucesso da política fiscal virá do corte de gastos, pois temos 95% da receita comprometida. Mesmo que aumente a receita, se não controlar os gastos, continuaremos com déficit público.

No final, se o corte de gastos não acontecer, podemos fazer reformas profundas em setores como previdência social, de benefícios sociais e funcionalismo público.

O que não resolve é insistir em subir a carga tributária, pois em 2024 ela chegou a 32,32 % do Produto Interno Bruto (PIB), a maior da série histórica iniciada em 2010.

Uma carga tributária elevada pode limitar a capacidade de consumo e investimento de famílias e empresas.

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