Iuri Pitta
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Iuri Pitta

Jornalista, mestre em administração pública e governo e professor universitário. Atuou como repórter, editor e analista em coberturas eleitorais desde 2000

Supersalários no setor público custam ao Brasil R$ 20 bi em 12 meses

Pesquisa do Movimento Pessoas à Frente e República.org mostra país como o que mais gasta com remuneração acima do teto entre 12 nações

De acordo com a pesquisa, 53.500 servidores ativos e inativos no Brasil recebem acima do teto constitucional remuneratório, atualmente em R$ 46.366,19  • 01/08/2025REUTERS/Adriano Machado
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O Brasil é o país que mais gasta com supersalários no serviço público em uma comparação com outras dez nações da Europa e das Américas: nos 12 meses entre agosto de 2024 e julho de 2025, esse tipo de despesa atingiu R$ 20 bilhões, mais de 20 vezes superior ao segundo colocado do ranking, a vizinha Argentina.

Os dados foram compilados pelo pesquisador Sergio Guedes-Reis, da Universidade da Califórnia em San Diego (UCSD), em estudo inédito encomendado pelo Movimento Pessoas à Frente e República.org, divulgado nesta quarta-feira (26).

De acordo com a pesquisa, 53.500 servidores ativos e inativos no Brasil recebem acima do teto constitucional remuneratório, atualmente em R$ 46.366,19. É quase o dobro do registrado na Argentina, onde 27 mil funcionários públicos têm supersalários, e mais de 13 vezes o volume de profissionais dos Estados Unidos remunerados acima do teto.

O estudo também mostra que mais de 53.000 beneficiados por supersalários representam 1,34% do total de 4 milhões de servidores ativos e inativos analisados no país.

A amostra inclui funcionários e aposentados de órgãos do Poder Executivo Federal (incluindo Advocacia-Geral da União, Banco Central e Forças Armadas), Judiciários federal e estaduais, 24 Ministérios Públicos estaduais, Câmara dos Deputados, Senado Federal, TCU (Tribunal de Contas da União), DPU (Defensoria Pública da União), e governos dos estados de São Paulo e Minas Gerais.

Do total de servidores que receberam supersalários no período analisado, 21 mil fazem parte da magistratura, como juízes e desembargadores, que receberam R$ 11,5 bilhões. Nos MPs, o gasto acima do teto foi de R$ 3,2 bilhões, pagos a 10.300 integrantes das instituições.

No governo federal, são 12.200 servidores que receberam acima do teto, num total de R$ 4,33 bilhões acima do teto constitucional – mais de 80% são de carreiras como advogados da União e procuradores federais. No Legislativo, a Câmara registra mil servidores que recebem supersalários.

A título de comparação com os países elencados no estudo, sete não apresentam mais do que 2 mil trabalhadores com supersalários no serviço público: Chile, Colômbia, França, Itália, México, Portugal e Reino Unido. A Alemanha não tem um caso registrado sequer de pagamento acima do teto legal.

Comparação com trabalhadores

O estudo do Movimento Pessoas à Frente e República.org também compara o dinheiro gasto com supersalários à renda dos demais profissionais e trabalhadores brasileiros.

A mediana da renda anual no país é de aproximadamente R$ 28 mil – ou seja, metade dos profissionais ganha mais do que esse valor, e outros 50% ganham menos.

Quase 40 mil servidores públicos têm renda anual acima de R$ 685 mil no período estudado, o que os coloca no grupo do 1% mais rico da população brasileira. Metade (49,8%) pertence à magistratura e um quinto (21,1%), ao Ministério Público.

“O gasto bilionário com supersalários impacta negativamente o orçamento público, amplia a desigualdade remuneratória no funcionalismo e tem efeito desmoralizante na legitimidade do Estado”, diz a diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente, Jessika Moreira. Para ela, a reforma administrativa e outro conjunto de leis são urgentes para acabar de fato com os supersalários.

Ana Pessanha, especialista em conhecimento da República.org, destaca o quanto o gasto do Brasil com supersalários não encontra comparação no estudo, que inclui países desenvolvidos e outros em patamar próximo ao brasileiro.

“Os servidores precisam ter uma remuneração justa, compatível com a complexidade do seu trabalho, e de forma sustentável. Mas não podemos achar aceitável que a sociedade brasileira banque o enriquecimento de uma pequena elite, que compromete a boa imagem de todos os servidores públicos”, avalia.