Luísa Martins
Blog
Luísa Martins

Em Brasília, atua há oito anos na cobertura do Poder Judiciário. Natural de Pelotas (RS), venceu o Prêmio Esso em 2015 e o Prêmio Comunique-se em 2021. Passou pelos jornais Zero Hora, Estadão e Valor Econômico

Alegações finais da PGR dão "spoiler" de denúncia no caso "Abin Paralela"

Gonet diz haver provas concretas do aparelhamento da agência de inteligencia

Agência Brasileira de Inteligência (ABIN)  • Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
Compartilhar matéria

As alegações finais da PGR (Procuradoria-Geral da República) na ação penal sobre o plano de golpe deixam claro que o órgão deve denunciar os indiciados no inquérito da chamada “Abin Paralela”.

A avaliação é feita por interlocutores do procurador-geral da República, Paulo Gonet, e de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) que acompanham o desenrolar das investigações.

Para essas fontes, a PGR demonstrou, ao longo do documento de 517 páginas apresentado na noite desta segunda-feira, ter provas concretas da instrumentalização da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.

“Basta um ‘Ctrl C + Ctrl V’ e a denúncia está pronta”, disse reservadamente à CNN um ministro da Corte, em tom de brincadeira. A Abin é citada 209 vezes nas alegações finais sobre a trama golpista.

De acordo com Gonet, a Abin funcionava como um “núcleo clandestino de contrainteligência” voltado a monitorar adversários políticos, atingir agentes públicos que iam contra os interesses do bolsonarismo e produzir “fake news” sobre o sistema eleitoral.

“A existência dessa estrutura oculta é prova da lógica de aparelhamento institucional”, relata o procurador-geral, destacando a utilização de “recursos estatais e ferramentas de natureza ilegal”, como softwares de espionagem.

O procurador-geral prossegue afirmando que o então diretor-geral da Abin, o atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), tinha uma sala no Palácio do Planalto, para que Bolsonaro pudesse acioná-lo diretamente e sem intermediações.

Ramagem era orientado a buscar “informações sensíveis sobre pessoas que contrariavam os interesses do então presidente, numa manifesta utilização indevida da estrutura de Estado para fins de perseguição política e produção de vantagens ilegítimas”, diz a PGR.

Além de espionar pessoas consideradas pelo governo como desafetos - o que incluía ministros do Supremo, parlamentares e jornalistas -, a Abin teria sido usada para “interferir em investigações sensíveis” que envolviam familiares de Bolsonaro.

“O uso da Abin e de sua estrutura para promover perseguição a adversários, interferência em investigações e espionagem política caracteriza um desvio gravíssimo de finalidade institucional, em clara afronta à legalidade e à ordem democrática”, complementa Gonet.

 

Para o procurador-geral, esse desvio de finalidade no âmbito da Abin é um dos “momentos capitais do golpe posto em andamento” pelo ex-presidente e pelo alto escalão do seu governo.

A PF (Polícia Federal) já indiciou Ramagem e outros investigados no inquérito sobre a “Abin Paralela”, que tramita à parte da ação penal sobre o golpe de Estado. Gonet pode pedir diligências complementares, mas seu entorno aposta no oferecimento direto da denúncia.

Apesar de a PF ver responsabilidade de Bolsonaro também no caso “Abin Paralela”, ele não foi formalmente indiciado porque já responde por organização criminosa na ação do golpe de Estado - a lei impede que uma pessoa responda duas vezes sobre o mesmo fato.

Na lista de indiciados estão Ramagem, o vereador Carlos Bolsonaro (filho do ex-presidente) e o atual diretor-geral da Abin no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Luiz Fernando Corrêa.