Maurício Noriega
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Maurício Noriega

Mauricio Noriega é um dos jornalistas esportivos mais reconhecidos do país. Ganhou o prêmio ACEESP de melhor comentarista esportivo de TV seis vezes.

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Corinthians pagará R$ 500 mil por Hugo Souza e pela chance de ganhar R$ 31,5 milhões

Aposta se justifica no universo movido a paixões do futebol, mas parece loucura na conta fria dos números

Hugo Souza está emprestado pelo Flamengo ao Corinthians
Hugo Souza está emprestado pelo Flamengo ao Corinthians  • Ricardo Moreira/Getty Images
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Imagine o seguinte cenário: você está numa situação financeira terrível, com uma dívida praticamente impagável, mas aparece uma oportunidade de investimento tentadora. No caso, pagar R$ 500 mil, com a possibilidade de receber, pelo menos, R$ 31,75 milhões (sem contar alguns juros e dividendos). Um retorno de 63,5 vezes o investimento.

É mais ou menos o que fará o Corinthians ao pagar a multa de R$ 500 mil ao Flamengo, valor acordado entre os clubes para que o time paulista pudesse utilizar o goleiro Hugo Souza na semifinal da Copa do Brasil.

A competição, que oferece a maior premiação em dinheiro do futebol nacional, garante R$ 31,75 milhões para o vice-campeão. Hugo Souza foi decisivo mais uma vez e manteve o Corinthians vivo na disputa. Ele fez seis defesas na partida, quatro delas em finalizações realizadas dentro da área.

Em um jogo no qual o adversário foi dominante e agressivo na etapa inicial, contar com um goleiro decisivo como Hugo Souza fez a diferença. O Flamengo poderia ter definido a classificação se não fossem as defesas de seu goleiro emprestado e os erros de finalização de seus atacantes.

Essa é uma questão que jamais seria discutida numa reunião de diretoria em uma empresa de qualquer outra atividade que não seja o futebol. Um CNPJ com dívida assumida de R$ 2,3 bilhões, que tem contas penhoradas por dívidas de empresários, mas se dá ao luxo de pagar R$ 500 mil para um funcionário que já recebe salário poder trabalhar numa noite.

Quando se trata de futebol, uma atividade que é movida a paixão, por entidades teoricamente sem fins econômicos, que movimentam orçamentos maiores que o de muitas cidades, chaga-se a esse quadro.

O investimento do Corinthians tem muito a ver com o assunto da moda na esfera esportiva: as apostas, as famosas bets. As probabilidades, ou odds, são ruins, mas o apostador acredita que aquele será o seu dia, que ele conhece as estatísticas, entende de futebol e decide jogar. Pode parecer que não, mas a jogada do Corinthians remete a isso. É um movimento bastante comum no futebol. Clubes emprestam jogadores para adversários e colocam cláusulas que impõem multas na tentativa de evitar que um ativo de seu quadro jogue contra o contratante.

É difícil imaginar que a companhia aérea X empreste um piloto para a Y e coloque uma cláusula no contrato em que cobre uma multa caso a concorrente escale esse comandante para uma rota bastante concorrida e lucrativa. A empresa Y resolve pagar a multa, porque sabe que o piloto é um profissional experiente e talentoso, que pode ser decisivo para que aquela rota específica apresente uma lucratividade bastante superior ao valor da multa.

Você faria um investimento como esse do Corinthians?

Vamos trazer a situação para um cenário mais próximo do nosso, o dos simples mortais. Você tem uma dívida de R$ 2,3 milhões, os cobradores fazem fila em frente à sua casa. Em vez de pagar um boleto, aparece uma oportunidade no horizonte. Jogar R$ 500 numa aposta com a perspectiva de ganhar 63,5 vezes, um total de R$ 31,75 mil. Uma conta atrasada a mais pela possibilidade de ganhar um dinheiro, que pagaria outros boletos e garantiria um agrado para a família, um jantar, um presente? Aquela alegria fugaz que vai passar, como canta o Chico Buarque naquele samba espetacular.

No caso do Corinthians, a alegria é a perspectiva de vencer a Copa do Brasil, o famoso grito de campeão. No dia seguinte, a dívida bilionária continuará lá, mas o presidente do clube será chamado para programas esportivos, sua foto estampará as capas de jornais, e o corintiano estará feliz.

E aí, vale a pena?

O Corinthians pagou para ver com Hugo Souza.

Você, como gestor de um time de futebol endividado, o que faria?

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