COP30: Meta de ação global ou promessas em um mundo partido
Debates na Europa buscam soluções concretas para as mudanças climáticas antes da Conferência da ONU, em Belém

Durante a Conferência de Bonn, às vésperas da London Climate Action Week, a presidência brasileira da COP30 lançou sua quarta carta orientadora. O documento apresenta um passo ousado: organizar uma Agenda de Ação estruturada em seis eixos temáticos, desdobrados em 30 metas e indicadores concretos.
No centro dessa proposta está a sugestão de transformar o Global Stocktake (GST) em uma Globally Determined Contribution (GDC) — uma espécie de NDC Global, na qual governos, empresas, cidades e sociedade civil definiriam coletivamente os marcos de implementação do Acordo de Paris.
Em um mundo ideal, seria uma revolução no multilateralismo climático. Mas o mundo de 2025 está muito distante desse ideal.
O peso dos compromissos não cumpridos
O diagnóstico é conhecido e incômodo. A maioria dos países não está sequer perto de cumprir suas Nationally Determined Contributions (NDCs) atuais. As NDCs são as metas de cada nação para reduzir a emissão de gases do efeito estufa.
As promessas de neutralidade líquida de empresas frequentemente resvalam no vazio confortável do net zero washing, que seria a marca de chegar a um balanço zero nas emissões.
As finanças climáticas seguem insuficientes, sobretudo para o Sul global. E os próprios mecanismos de implementação do Acordo de Paris caminham lentamente.
Multilateralismo em tempos de fragmentação
A proposta da GDC emerge em meio à crise do multilateralismo. Guerras em curso — da Ucrânia ao Oriente Médio — corroem a confiança entre as grandes potências. As tensões econômicas entre Estados Unidos e China dificultam qualquer coordenação robusta.
O sistema ONU, embora legítimo, enfrenta paralisia e questionamentos crescentes. Como estruturar uma nova governança climática global plenamente cooperativa num cenário em que os próprios pilares da governança internacional estão fragilizados?
A GDC, em sua concepção, é inspiradora. Mas não pode correr o risco de se tornar um álibi confortável para:
- Diluir responsabilidades nacionais;
- Oferecer espaço a greenwashing institucionalizado;
- Criar a ilusão de avanço, enquanto ações concretas permanecem tímidas.
- Perseguir metas globais se faz necessário, desde que não desvie o foco da pressão política necessária para o cumprimento rigoroso das metas já acordadas.
Caminhos possíveis: a esperança da mobilização na London Climate Action Week
Apesar dos riscos, seria injusto ignorar as iniciativas práticas já em construção — e, neste ponto, a presidência brasileira tem um ativo concreto.
Minha participação na London Climate Action Week (LCAW), consolidada como um dos maiores encontros de soluções climáticas do mundo com mais de 45 mil participantes, começou justamente moderando o painel técnico da SBCOP30 (Sustainable Business COP30), uma plataforma inédita global de articulação do setor privado.
O evento reuniu mais de 200 representantes de empresas, sociedade civil e governos. No painel, debatemos temas essenciais para a transição: transição energética, sistemas alimentares sustentáveis, bioeconomia, instrumentos de financiamento da transição, green jobs and skills, economia circular e resiliência urbana.
Este evento mostrou, na prática, como é possível consolidar casos concretos em uma iniciativa global, que já agrega confederações de mais de 40 países, o que reúne mais de 75% do PIB global, representando mais de 30 milhões de empresas.
Sim, são mais de 30 milhões de microempreeendedores, pequenas, médias e grandes empresas conectados através das associações nacionais de indústria e comércio nas principais nações do mundo em torno de soluções práticas de transição energética e climática.
A força da SBCOP reside justamente na capacidade de converter ambição em articulação setorial concreta, conectando prática empresarial com políticas públicas e transição justa.
A Presidência da COP30 tem apoiado iniciativas dessa natureza. O que alguns chamam de “new kids on the block” nos corredores climáticos, são os “implementadores da vida real”.
Se a COP30 conseguir transformar experiências como esta em núcleos colaborativos e efetivos de implementação, o conceito de NDC Global poderá ganhar musculatura e credibilidade.
Realismo radical: entregar o que já foi prometido
Talvez o maior legado da COP30, como disse Ana Toni, CEO da COP30, não seja criar novos compromissos, mas inaugurar finalmente a era da entrega:
- Implantar sistemas robustos e independentes de mensuração de emissões e fluxos financeiros;
- Consolidar exemplos concretos de entrega em setores críticos (energia, transporte, uso da terra);
- Avançar em coalizões climáticas plurilaterais de alta ambição, com incentivos claros e sanções credíveis.
O multilateralismo climático do futuro pode ter menos ilusões de consenso universal e mais pragmatismo de alianças eficazes.
A ambição brasileira em Belém traz energia renovadora ao debate climático. A proposta de uma NDC Global é visionária em seu desenho. Mas escancara a distância entre a utopia normativa e o realismo geopolítico.
Belém será o teste decisivo: mais uma cúpula de promessas ou o verdadeiro início da era da entrega?