Pedro Côrtes
Blog
Pedro Côrtes

Professor titular da Universidade de São Paulo (USP) e um dos mais renomados especialistas em Clima e Meio Ambiente do país.

Guerra, petróleo e clima: o grande pré-teste da COP30

Em meio à volatilidade dos preços e riscos no Oriente Médio, a reunião em Belém será palco de disputas, mas também de possíveis avanços na transição energética

Extracão de petróleo em Loving County, Texas, EUA
Extração de petróleo em Loving County, Texas, EUA  • Angus Mordant/Reuters
Compartilhar matéria

O petróleo tem se mostrado essencial nos últimos cem anos, em que pese os impactos ambientais decorrentes de seu uso. Apesar da diversificação das fontes, como o Mar do Norte, o Pré-Sal brasileiro e o shale gas, o Oriente Médio continua concentrando alguns dos principais fornecedores internacionais, tornando o suprimento mundial de óleo suscetível às questões geopolíticas da região.

Conflitos no Oriente Médio têm gerado altas expressivas no preço do petróleo desde meados do século passado. A Crise de Suez, em 1956, causou prejuízos ao comércio marítimo, mas com impacto limitado. Já o embargo árabe de 1973, durante a Guerra do Yom Kippur, elevou significativamente o preço do barril e desencadeou a primeira grande crise energética global. Isso se repetiria com a Revolução Iraniana e a Guerra Irã-Iraque no fim dos anos 1970, levando a novas elevações do preço do petróleo e agravando a inflação e a recessão mundial.

Nos anos seguintes, episódios como a invasão do Kuwait, em 1990, a Segunda Guerra do Golfo, em 2003, além de outros eventos e confrontos, mantiveram o mercado em alerta, com oscilações expressivas nos preços. A escalada da guerra entre Israel e o Irã, somada ao risco de fechamento do Estreito de Ormuz, elevou o preço do Brent de US$ 61 (01/06) para mais de US$ 77 na última sexta-feira. Com o agravamento da guerra, cotações mais altas são esperadas.

Diante dessa escalada, o governo brasileiro já planeja elevar de 27% para 30% a quantidade de etanol anidro na gasolina, reduzindo a importação do combustível e procurando manter estável os preços praticados no Brasil.

Impactos para a COP30

Com os preços pressionados e as incertezas geopolíticas em alta, cresce a preocupação com a disposição dos países para negociações climáticas substanciais na COP30. Em um cenário de guerras – lembrando que a esperada paz entre Rússia e Ucrânia continua a ser almejada, mas sem sucesso – é de se questionar se os governos teriam disposição para negociar escopos de redução de emissões e metas de financiamento climático.

Contrariamente ao que se possa imaginar, surge a possibilidade de que a transição energética seja acelerada entre os participantes da COP30. É uma oportunidade que se apresenta para a chancelaria brasileira, tendo em vista que o Brasil é o país que lidera a transição energética, tanto para movimentação de veículos quanto para a geração de energia elétrica.

Embora desafiadora, essa pode ser uma janela estratégica para reforçar o papel da transição energética como prioridade geopolítica. Não se trata de um processo simples ou rápido, mas o atual contexto geopolítico oferece uma oportunidade única para acelerar a transição.

A alternativa, ainda que parcial, encontrada pelo Brasil, pode ser uma sinalização do caminho a ser trilhado por outros países. O etanol, sujeito a variações sazonais geralmente previsíveis, permanece imune a choques geopolíticos. A tecnologia flex garante sua aplicação em qualquer proporção na mistura com a gasolina. O biodiesel segue caminho similar, embora haja restrições tecnológicas que dificultam uma ampliação substancial de seu uso.

Além dos biocombustíveis, há opções de veículos elétricos que podem utilizar fontes renováveis como a energia solar, solar ou biomassa. Mesmo considerando uma transição mais avançada, o Brasil já se destaca em pesquisas para a produção de hidrogênio verde a partir do etanol.

Na COP30, o Brasil terá a chance não somente de exibir seus avanços, mas de liderar, com legitimidade, o debate internacional por soluções climáticas mais ambiciosas — mesmo diante de um cenário global marcado por conflitos e incertezas. A chancelaria brasileira pode encontrar aí uma chance concreta de projetar internacionalmente o protagonismo do Brasil na transição energética.