Projeto de lei sobre serviços digitais entra em fase final no governo Lula
Texto mira conteúdos ilícitos, garante aplicação do ECA e Código de Defesa do Consumidor ao mundo digital e prevê abarcar redes sociais, comércios eletrônicos, buscadores e serviços de mensagens

O governo federal acerta os últimos detalhes de um projeto de lei que será enviado ao Congresso Nacional com o objetivo de mitigar riscos nos serviços digitais e garantir proteção aos usuários de internet no país.
A intenção do governo com o projeto é assegurar a aplicação de leis já existentes, como o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código de Proteção e Defesa do Consumidor, no mundo digital – sem que haja inovações ou excepcionalidades legais.
O texto mira conteúdos ilícitos, como aqueles que representam dano a crianças e adolescentes – que incentivam suicídio ou automutilação, por exemplo –, que atentam contra o Estado Democrático de Direito, além de fraudes e golpes.
Quem acompanhou a elaboração do texto e participa das tratativas para aprimorá-lo afirma que o projeto não propõe a moderação de conteúdo ou censura a publicações nas redes sociais – o que afastaria argumentos de cerceamento à liberdade de expressão no Congresso e reduziria eventual resistência.
O escopo do projeto de lei não está restrito às redes sociais e abarca os serviços digitais como um todo, o que inclui, por exemplo, comércios eletrônicos, buscadores online e serviços de mensagens.
O projeto atribuirá competências a uma autoridade da administração pública indireta, uma agência reguladora, que acompanhará o setor e poderá aplicar multas e sanções. Em casos graves, poderá ser determinado o bloqueio dos serviços digitais – inclusive segmentado por região ou funcionalidade.
O texto elaborado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública também prevê verificação etária para proteger crianças e adolescentes de conteúdos ilícitos e de serviços que não sejam apropriados para suas idades.
Serviços digitais com menos de três milhões de usuários devem, de acordo com o texto, dar transparência ao usuário, oferecer termos de uso e condições em língua portuguesa e disponibilizar alguma forma de contato, como chat ou atendente.
Os que possuírem mais de três milhões de usuários terão responsabilidades adicionais, como obrigatoriedade de ter CNPJ, Serviço de Atendimento ao Consumidor e um canal de denúncia à disposição dos usuários.
Envio ao Congresso
A Casa Civil constituiu um grupo de trabalho há dois meses para discutir pontos do projeto e aprimorá-lo. Os ministérios da Fazenda, da Gestão e Inovação, das Comunicações, a Controladoria-Geral da União, a Advocacia-Geral da União e a Secretaria de Comunicação Social da Presidência participam das conversas.
O projeto está praticamente fechado entre todos os ministérios, de acordo com quem acompanha as tratativas. A previsão mais otimista estima que os últimos detalhes do texto serão definidos nesta semana para que o projeto seja enviado ao Congresso. O envio depende ainda da leitura do momento político adequado e do aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
As discussões sobre a responsabilização das redes sociais voltaram na última semana depois do vazamento de Lula e da primeira-dama Janja Silva com o líder chinês Xi Jinping sobre o Tik Tok. Janja teria pedido a palavra para falar sobre os efeitos nocivos da rede social, destacando que seu algoritmo estaria favorecendo o avanço da extrema-direita no Brasil.
“Eu perguntei ao companheiro Xi Jinping se era possível ele enviar para o Brasil uma pessoa da confiança dele para discutirmos a questão digital, sobretudo do Tik Tok. Aí a Janja pediu a palavra para explicar o que é que está acontecendo no Brasil, sobretudo contra as mulheres e contra as crianças. […] Ele vai mandar uma pessoa especialmente para conversar conosco sobre o que a gente pode fazer nesse mundo digital”, disse Lula.
O cálculo do governo inclui ainda a liberação, nesta semana, do voto do ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento que discute a responsabilidade civil das plataformas por conteúdos de terceiros e a possibilidade de remoção de material ofensivo ou que incite ódio, sem a necessidade de ordem judicial.



