Aumento do benefício estimulou a demanda pelo Bolsa Família, dizem especialistas
A exclusão de famílias compostas só por uma pessoa favoreceu a inclusão de grupos que estavam na fila do programa
Em seis meses, o Bolsa Família já incluiu 2,15 milhões de novas famílias no programa, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome.
Mesmo com as revisões promovidas pelo Ministério do Planejamento e Orçamento e a criação de regras para tentar combater o aumento de famílias unipessoais entre os beneficiários, os números de assistidos dispararam.
Especialistas consultados pela CNN avaliam que o aumento do valor do benefício — que antes era em torno de R$ 200 por família e agora está em média de R$ 600 — atraiu um número maior de interessados.
Segundo Daniel Duque, pesquisador da área de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), quando o benefício estava em R$ 200, uma família que tinha uma renda baixa, mas que não era baixíssima, não tinha tanto interesse em participar do programa.
“Para essas famílias, não iria fazer tanta diferença e, por isso, nem requeriam o benefício. Agora que está em R$ 600, tende a aumentar a demanda devido ao melhor incentivo do programa”, explica.
De acordo com o economista da LCA Consultores, Bruno Imaizumi, desde 2022, às vésperas das eleições, o governo de Jair Bolsonaro zerou duas vezes a fila do Auxílio Brasil — que substituiu o Bosa Família —, representando uma explosão muito forte de famílias unipessoais, ou seja, composta por uma pessoa só.
“Agora, desde o início de 2023, o governo federal, por meio de uma revisão no programa, conseguiu reduzir cerca de 940 mil pessoas que estavam com cadastros irregulares.”
Perfil eletivo
Entretanto, Imaizumi destaca que a problemática é que, no novo Bolsa Família, foram incluídos outros tipos de beneficiários — crianças e jovens, por exemplo — elevando o rendimento médio familiar e abrindo ainda mais o perfil eletivo para o programa, mesmo com as exclusões da revisão.
O programa paga um adicional de R$ 50 a famílias com gestantes e filhos de 7 a 18 anos. Além disso, paga outro adicional, de R$ 150, a famílias com crianças de até 6 anos. Dessa forma, o valor total do benefício pode chegar a R$ 900 para quem cumpre os requisitos para receber os dois adicionais.
Isso aumentou a quantidade de famílias com direito e que estão solicitando o benefício.
“Pensa em um casal: os dois se cadastram como famílias unipessoais, recebem dois benefícios, e para eles, que têm condições de entrada mais difícil no mercado de trabalho, é um valor relativamente alto que passam a receber. É um valor próximo de um salário mínimo. Isso que o governo está querendo barrar.”
O economista acredita que esses números não devem ser revertido na integridade, mas, a exclusão desses beneficiários tem o potencial de gerar uma economia entre R$ 5 bilhões e R$ 10 bilhões.
“Antes do Auxílio Brasil, o governo tinha em torno de 2,5 milhões de beneficiários unipessoais no Bolsa Família anterior. Hoje, este número está próximo dos 5 milhões.”
Porém, Imaizumi aponta que as secretarias que fazem os cadastros destas famílias estão sucateadas. Além disso, há um desconhecimento das regras do antigo Auxílio Brasil e do novo Bolsa Família.
“Esse problema faz com que os órgãos tenham dificuldades de repassar esse conhecimento aos colaboradores para poderem verificar essa questão da exclusão ou não dos beneficiários unipessoais.”
Duque, da FGV, pontua que há famílias na fila tentando o benefício e não conseguem. Do outro lado, há famílias que recebem dois ou mais pagamentos mensais.
“O governo está identificando essas duas pessoas como uma só e passou a liberar recursos para outra família. Isso melhora e expande o número de beneficiários.”
Mercado de trabalho
A melhora no mercado de trabalho não impactou na quantidade de famílias beneficiadas pelo Bolsa Família. Porém, na visão de Duque, esse cenário, no médio prazo, tende é apresentar uma queda na demanda do programa.
“É muito recente a mudança do programa do governo federal e, por isso, não se vê um impacto no mercado de trabalho. Essa é uma situação que demora para se ajustar. Uma família que passa muito tempo desempregada e com a renda baixa, não tem ideia de quanto tempo vai permanecer em um emprego.”
Daniel Duque
Imaizumi ressalta que o Brasil ainda é um país bastante heterogêneo e desigual.
“Tem uma massa de pessoas que poderiam ser mão-de-obra, mas tem pouquíssima qualificação. A tendência é que, com esses benefícios, no médio, mais para longo prazo, essas pessoas consigam sair da extrema pobreza e ingressem no mercado de trabalho de maneiro mais positiva.”
Para ele, é possível esperar uma diminuição no número de beneficiários do Bolsa Família, e, paralelo a isso, uma melhora no mercado de trabalho.
“Este cenário será composto seja por pessoas procurando emprego, ou mesmo ocupadas em posições formais, ou informais, recebendo pouco.”
Bolsa família
Desde o relançamento em março deste ano, o Bolsa Família já incluiu 2,15 milhões de novas famílias. O marco foi registrado neste mês de setembro, quando o programa de transferência de renda do Governo Federal fez 550 mil novas concessões.
Os pagamentos iniciaram nesta segunda-feira (18) e seguem de forma escalonada até o dia 29. São 21,47 milhões de famílias atendidas no mês, a partir de um investimento de R$ 14,58 bilhões.
Ainda em março, foram incluídas 694.424 novas famílias. Outras 113.843 entraram para o Bolsa Família em abril, e 200 mil em maio. Os meses de julho e agosto registraram a entrada de 300 mil novas famílias cada.
Ainda segundo o governo federal, um trabalho de busca ativa foi responsável pelas novas concessões, focando nas pessoas mais vulneráveis e com direito ao complemento de renda, mas que não tinham acesso ao benefício.
Todos os meses entram e saem famílias do programa, conforme o cumprimento ou não dos critérios para receber o benefício.
Em setembro, foram cancelados os cadastros de 237.897 famílias.