Fazenda aposta em arranjo bilionário para florestas e carbono na COP30
Meta é garantir financiamento permanente para florestas e criar regras justas para o comércio internacional

O Brasil chegará à COP30, em Belém, com cerca de 20 propostas em negociação. Entre elas, duas iniciativas da área econômica ganham destaque: a criação do Fundo de Florestas Tropicais (TFFF, na sigla em inglês) e a formação de uma coalizão internacional para integrar mercados de carbono.
Segundo o secretário-executivo adjunto da Fazenda e coordenador do Plano de Transformação Ecológica, Rafael Dubeux, essas propostas podem avançar porque não exigem consenso entre todos os países, mas apenas a adesão de blocos dispostos a cooperar.
“Se a gente tem bloqueios em algumas áreas, os países que estão dispostos a seguir avançando não precisam ficar parados por conta disso”, disse em entrevista à CNN.
O TFFF foi concebido para criar uma fonte permanente de financiamento às florestas tropicais. O desenho prevê a mobilização de US$ 125 bilhões, sendo US$ 25 bilhões de aportes iniciais vindos de países, bancos centrais ou grandes investidores, com capacidade de alavancar outros US$ 100 bilhões no mercado financeiro.
A construção do fundo está sendo feita em duas frentes: países patrocinadores, como Noruega, Reino Unido, Alemanha e França, e países beneficiários, como Brasil, Colômbia, Nigéria, Congo, Indonésia e Malásia.
“O Brasil vem liderando esse processo, mas é algo realmente coletivo, com vários eventos e horas de reuniões”, disse o secretário.
A lógica do fundo é distinta dos mecanismos tradicionais de doação, já que os aportes terão remuneração: os países ou instituições que aplicarem os recursos receberão de volta o capital com juros.
Nesse modelo, quem aplica no fundo terá retorno semelhante ao que receberia em títulos do Tesouro dos Estados Unidos, cerca de 4% ao ano.
Os recursos serão aplicados em projetos com rentabilidade superior, entre 7% e 8% anuais, e a diferença será transferida para os países em desenvolvimento que preservam florestas tropicais.
O funcionamento se baseia no pagamento anual por hectare de floresta mantida em pé, estimado em cerca de US$ 4 por hectare. O mecanismo prevê ainda bônus para quem ampliar a cobertura florestal e penalidades em caso de perda.
“Se ele tinha 100 e no outro ano manteve 100, recebe o valor cheio por hectare; se foi para 101, recebe um adicional. Se houver queda relevante, recebe praticamente zero”, explicou Dubeux.
Documentos oficiais do TFFF detalham que a dedução pode chegar a US$ 400 por hectare desmatado e US$ 100 por hectare degradado. Se as penalidades superarem o valor a receber, não há obrigação de pagamento — uma forma de evitar risco de endividamento para os países participantes.
Dubeux também afirmou que o Banco Mundial deve assumir a operação financeira do mecanismo, que ainda está em “fase de amadurecimento”.
A “missão” da Fazenda é que tudo esteja pronto para a COP30 — que será realizada entre 10 e 21 de novembro —, funcionando e com os primeiros aportes definidos e depositados até o fim do ano. Mesmo assim, Dubeux reconhece que chegar ao valor máximo pode não acontecer no curto prazo.
“Alguns [países] já sinalizaram para a gente: ‘olha, estamos interessados em participar, mas só conseguimos colocar no ciclo orçamentário uma parte no ano que vem e outra agora’. Então não dá para cravar, porque depende dos outros também, desse processo. Mas o que cabe a nós é deixar o fundo pronto para funcionar e fazer esse engajamento para receber esses recursos”, destacou.
Coalizão de carbono
Ao lado do Fundo de Florestas Tropicais, o governo aposta em um novo arranjo internacional de carbono inspirado no CBAM (Carbon Border Adjustment Mechanism) europeu, mas com desenho distinto.
A ideia é formar uma coalizão de países dispostos a estabelecer um teto comum de emissões, com orçamento declinante no tempo, e aplicar ajustes de fronteira para proteger sua competitividade.
Segundo Rafael Dubeux, o diferencial do modelo está na construção coletiva e no princípio de justiça. As cotas de emissões seriam distribuídas de acordo com a renda per capita: países ricos teriam tetos menores, enquanto nações de menor renda teriam mais espaço para emitir.
“A ideia é que as cotas levem em conta o inverso da renda per capita. Ou seja, quem tem renda alta terá um teto menor; quem tem renda baixa, um teto maior”, explicou.
Para evitar perdas de competitividade, o mecanismo prevê ajustes de fronteira sobre importados de países que não participarem da coalizão.
"O ajuste de fronteira garante equilíbrio: quem não aderir, paga para vender no mercado da coalizão. Aqui a gente está dizendo que está todo mundo convidado a se juntar. Você não quer? Tudo bem. Você vai pagar o preço para vender aqui”, disse Dubeux.
A proposta se apoia em três eixos: efetividade (ao criar um teto real de emissões para um grupo relevante de países), justiça (ao distribuir o esforço conforme a renda per capita) e viabilidade política.
Ele ainda pontuou que o projeto está sendo desenvolvido com apoio de acadêmicos internacionais, em trabalho coordenado pela professora Catherine Wolfram, do MIT e de Harvard.
A iniciativa já teve um primeiro documento apresentado em conferência da ONU em Sevilha e deve ganhar versão ampliada durante a Climate Week, em Nova York, em setembro.
De acordo com estudo do Salata Institute, da Universidade Harvard, uma coalizão desse tipo poderia reduzir emissões em até sete vezes mais do que os esforços atuais fragmentados e gerar quase US$ 200 bilhões em receitas de precificação de carbono para governos participantes.
O Brasil pretende articular a adesão de países como União Europeia, China, Reino Unido, Noruega, Canadá, México, Nova Zelândia e Coreia do Sul. Mesmo nos Estados Unidos, onde não há mercado nacional, a Califórnia — equivalente à quarta maior economia do mundo — já demonstrou interesse.