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Margem Equatorial: entenda a polêmica entre Ibama e Petrobras

Conflito sobre a exploração de petróleo na foz do Amazonas opõe preocupações ambientais e interesses energéticos do país

Cristiane Noberto, da CNN Brasil
O licenciamento ambiental travou por mais de um ano após o Ibama negar, em 2023, o pedido da Petrobras para perfurar o bloco FZA-M-59, na Bacia da Foz do Amazonas  • FILE PHOTO: A view shows the logo of Brazilian state-run oil firm Petrobras in Rio de Janeiro, Brazil June 5, 2025. REUTERS/Ricardo Moraes/File hoto
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A concessão de licença ambiental à Petrobras para perfurar um poço exploratório em águas profundas do Amapá, na Margem Equatorial Brasileira (MEB), encerrou uma disputa que se arrastava há quase cinco anos entre a estatal e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

O embate expôs a tensão entre a política de expansão da exploração de petróleo e os compromissos ambientais assumidos pelo governo.

A Margem Equatorial é uma faixa marítima que se estende do Amapá ao Rio Grande do Norte, com características geológicas semelhantes às áreas produtoras da Guiana e do Suriname, onde foram descobertas grandes reservas de petróleo.

Estimativas da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) apontam um potencial de até 30 bilhões de barris de óleo equivalente. Para a Petrobras, trata-se de uma nova fronteira estratégica para repor reservas e sustentar a produção nas próximas décadas.

O impasse

O licenciamento ambiental travou por mais de um ano após o Ibama negar, em 2023, o pedido da Petrobras para perfurar o bloco FZA-M-59, na Bacia da Foz do Amazonas.

À época, o órgão alegou inconsistências técnicas no projeto e insuficiência de dados sobre a fauna marinha e os impactos potenciais da operação.

A negativa gerou forte reação do governo federal, que insistiram na revisão da decisão. O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegou a criticar publicamente a falta de aval para que a Petrobras pudesse fazer os estudos no local.

Em fevereiro deste ano, o petista chamou de “lenga-lenga” o fato do Ibama ter negado várias vezes o pedido.

"Talvez essa semana ainda vá ter uma reunião da Casa Civil com o Ibama e nós precisamos autorizar que a Petrobras faça pesquisa [na Margem Equatorial]. É isso que queremos. Se depois vamos explorar é outra discussão. O que não dá é ficar nesse lenga-lenga. O Ibama é um órgão do governo, parecendo que é um órgão contra o governo", afirmou em entrevista a uma rádio de Macapá.

Após novos estudos e ajustes feitos pela petroleira, o Ibama concluiu em outubro de 2025 que os esclarecimentos apresentados pela Petrobras eram suficientes para prosseguir, autorizando a perfuração. O órgão destacou, no entanto, que a licença se limita à fase exploratória, sem autorização para produção.

Riscos e críticas

A liberação da licença foi recebida com cautela por ambientalistas e parte da comunidade científica. Organizações civis afirmam que a região da foz do rio Amazonas é altamente sensível, com grande biodiversidade marinha e áreas ainda pouco estudadas.

Há preocupação de que acidentes, mesmo em pequena escala, possam afetar ecossistemas costeiros e comunidades tradicionais.

Em abril, durante visita a lideranças indígenas no parque Xingu, Lula ouviu do cacique Raoni, líder do povo Kayapó, reconhecido internacionalmente pela luta das causas indígena e da Amazônia, para não explorar petróleo na Foz do Rio Amazonas.

Com ajuda de um intérprete, o cacique defende manter as coisas do jeito que estão para garantir “que a gente tenha um meio ambiente, a terra com menos poluição e menos aquecimento”.

O Ibama estabeleceu uma série de condicionantes para a operação, incluindo o monitoramento em tempo real, protocolos de emergência e 13 embarcações de apoio prontas para contenção de vazamentos.

A Petrobras afirma que montou a maior estrutura de resposta ambiental do país e que a perfuração seguirá “os mais altos padrões internacionais de segurança”.

O que está em jogo

A disputa sobre a Margem Equatorial sintetiza o dilema atual da política energética brasileira: como expandir a exploração de petróleo sem comprometer a agenda de transição verde.

Para o governo, o desafio é equilibrar segurança energética, geração de receitas e preservação ambiental. Um dos pés do orçamento público é a exploração e venda de barris de petróleo. Receita esta que tem salvado as contas do governo ao longo de 2025 e deve ter importância bem grande em 2026, ano eleitoral. .

O tema também tem peso político — a exploração é vista como um símbolo da capacidade do Brasil de explorar seu próprio potencial com responsabilidade ambiental, ao mesmo tempo em que mantém metas de descarbonização.

Com a perfuração agora liberada, o resultado do poço Norte de Uatumã será decisivo. Se forem confirmadas reservas economicamente viáveis, a Petrobras pode abrir uma nova fronteira de exploração no Atlântico Norte — e reacender o debate sobre até onde o país está disposto a ir em busca do petróleo da Margem Equatorial.

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