Ibovespa aos 170 mil pontos? Veja o que move o otimismo na bolsa brasileira
Fluxo positivo é sustentado por entrada de estrangeiros, perspectiva de queda na Selic e cenário global favorável; maré positiva, porém, pode virar com preocupação fiscal

O Ibovespa encerrou esta quarta-feira (29) no terceiro recorde seguido, se aproximando da marca histórica dos 150 mil pontos em meio ao ciclo de otimismo do mercado por fatores domésticos e internacionais.
A alta dos últimos dias abre uma janela para a projeção de novos recordes, segundo analistas ouvidos pelo CNN Money, com expectativas apontando para patamares de 170 mil pontos em 2026.
Apesar do clima de euforia, os especialistas ponderam que a maré positiva pode virar, sobretudo com a constante preocupação fiscal no radar dos investidores.
Brasil mais atrativo
A imposição de tarifas pelo governo de Donald Trump e a condução incerta da política econômica americana geraram cautela entre investidores, que passaram a buscar alternativas mais atrativas.
Com a sinalização de novos cortes de juros nos Estados Unidos — que acabou se confirmando nesta quarta-feira após o Fed (Federal Reserve) aplicar nova redução de 0,25 ponto nas taxas —, os mercados emergentes, que oferecem taxas mais altas, ganharam protagonismo.
O Brasil, nesse contexto, se tornou um dos principais destinos de capital estrangeiro. Por aqui, o BC (Banco Central) mantém a Selic em dois dígitos desde o início de 2022, com a taxa atualmente em 15%.
Segundo dados divulgados pela B3, o fluxo de investimento estrangeiro foi positivo em R$ 26,9 bilhões no primeiro semestre, considerando IPOs e follow-ons, o melhor desempenho desde o segundo semestre de 2023.
Raphael Figueredo, estrategista da XP, afirma que o mercado vive uma “rotation global”, com investidores realocando capital entre diferentes regiões.
“É natural que parte daquela superexposição esteja se transferindo para mercados mais atrativos, como os emergentes, dos quais o Brasil faz parte.”
João Daronco, analista da Suno Research, reforça que o movimento é global.
“Temos observado os mercados europeus com bom desempenho, assim como os emergentes da América do Sul, como Chile e Colômbia. Podemos dizer que é um humor global, não apenas brasileiro. A água está subindo e todos sobem juntos.”
Câmbio, fiscal e psicológico
Internamente, o desempenho da bolsa é sustentado pela estabilidade do câmbio, bons resultados corporativos e a sinalização do governo de que pretende buscar equilíbrio fiscal.
“Há também um componente psicológico importante: quando o índice se aproxima das máximas históricas, há uma entrada natural de novos investidores que não querem perder o movimento, o que cria um ciclo de valorização autoalimentado”, explica Enrico Gazola, economista da Nero Consultoria.
Outro fator relevante é a expectativa de que o Copom (Comitê de Política Monetária) reduza a taxa Selic a partir do primeiro trimestre de 2026, o que favorece empresas de setores cíclicos e com alto nível de endividamento.
“Podemos ver uma melhora no fluxo de capital, o que explica a renovação das máximas”, diz Figueredo.
Ibovespa nos 170 mil pontos em 2026
O mercado ainda espera novos cortes na taxa de juros americana, o que é visto como positivo para a bolsa brasileira.
“Historicamente, olhando ciclos passados de cortes de juros, o Brasil e os mercados emergentes tendem a performar muito bem. Nossa bolsa já teve alta superior a 30% nos 12 meses seguintes ao primeiro corte do Fed. Em alguns ciclos, o Ibovespa sobe mais que o próprio S&P 500”, afirma Fernando Ferreira, da XP.
Se neste ano o foco foi o investidor estrangeiro, agora o mercado começa a olhar também para os fluxos domésticos, com a retomada do interesse por ativos de renda variável diante da perspectiva de queda na Selic.
“A nossa previsão já era de 150 mil pontos neste ano, e estamos muito perto de alcançar esse valor. Para o ano que vem, diante desse cenário, enxergamos 170 mil como um valor justo para o Ibovespa”, conclui Ferreira.
O bom humor tem prazo de validade?
O Ibovespa acumula alta de cerca de 24% no ano e atingiu um novo patamar histórico nesta quarta-feira, ao alcançar os 148 mil pontos.
Na avaliação de especialistas, o otimismo deve persistir enquanto os fundamentos se mantiverem: inflação global em desaceleração, perspectiva de juros menores no exterior, entrada de capital estrangeiro e relativa estabilidade política doméstica.
No entanto, o mercado vive de expectativas, e elas podem mudar rapidamente.
“Se o Fed endurecer novamente o discurso ou se o governo brasileiro perder credibilidade fiscal, o cenário pode se inverter em questão de dias”, alerta o economista. “Por ora, os ventos continuam favoráveis, mas é um otimismo que precisa ser encarado com cautela, pois a euforia costuma ser a fase mais vulnerável de qualquer ciclo de alta.”
A expectativa para os próximos dias é de uma correção e realização de lucros após a sequência de altas. A continuidade do bom humor dependerá, sobretudo, da resolução de questões internas.
No Brasil, o fator-chave é a credibilidade fiscal: qualquer sinal de responsabilidade nas contas públicas tende a sustentar a confiança dos investidores. No exterior, as incertezas vêm diminuindo com o avanço das negociações comerciais do governo Trump.


