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    Crise climática faz seis jovens portugueses processarem 32 países em tribunal de direitos humanos

    Caso será julgado no Tribunal Europeu nesta quarta-feira (27); é o primeiro caso do tipo na corte

    Laura PaddisonVasco Cotovioda CNN

    O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) analisará nesta quarta-feira (27) um processo “sem precedentes”, movido por seis jovens contra 32 países europeus, acusando-os de não terem conseguido enfrentar a crise climática.

    Os requerentes, com idades entre 11 e 24 anos, de Portugal, estão na linha da frente das mudanças climáticas e pedem ao tribunal que obrigue estes países a acelerar ações práticas contra as mudanças climáticas.

    É o primeiro caso climático a ser apresentado ao TEDH e o maior de um total de três causas que tramitam na corte.

    As apostas são altas. Uma vitória forçaria os países a atuarem de forma mais efetiva e também seria um impulso para outros processos judiciais semelhantes em todo o mundo, especialmente nas ações que argumentam que os países têm obrigações em matéria de direitos humanos para proteger as pessoas da crise climática.

    Contudo, se o tribunal decidir contra os requerentes, isso poderá ser prejudicial para outras reivindicações climáticas.

    “É um caso entre David e Golias, sem precedentes nos seus potenciais impactos”, disse Gearóid Ó Cuinn, diretor da Global Legal Action Network (GLAN), que apoiou o caso dos requerentes.

    Incêndios florestais: a faísca para os processos

    A jornada até a audiência desta quarta-feira começou há seis anos. “Tudo começou em 2017 com os incêndios em Portugal”, disse Catarina Mota, uma das reclamantes.

    Incêndios florestais devastadores queimaram 500 mil hectares em Portugal e mataram mais de 100 pessoas naquele ano. À medida que os incêndios avançavam em direção ao local onde Mota morava, a sua escola e outras na área foram fechadas. “A fumaça estava por toda parte”, disse ela à CNN.

    O desastre catalisou o processo. Mota começou a conversar com uma amiga e agora também reclamante, Cláudia Duarte Agostinho. Com a ajuda da GLAN, reuniram mais quatro reclamantes, todos afetados pelos incêndios de 2017.

    Embora a alegação tenha sido desencadeada pelos incêndios, as alterações climáticas continuam a afetar suas vidas, argumenta o grupo, especialmente as fortes ondas de calor que Portugal enfrenta regularmente.

    Os reclamantes argumentam que esses períodos dificultam a saída de casa, a concentração nos trabalhos escolares, o sono e, para alguns, até a respiração, além dos impactos na saúde mental.

    “Isso nos deixa preocupados com o nosso futuro. Como poderíamos não ter medo?, questiona André dos Santos Oliviera, de 15 anos, outro dos reclamantes.

    ‘Como um tratado juridicamente vinculativo’

    A ação — movida em 2020 e que depende de financiamento público — foi acelerada pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos devido à urgência da questão e ao grande número de acusados.

    Nesta quarta-feira, os requerentes argumentarão que o fracasso na resposta à crescente crise climática viola os direitos humanos, incluindo o direitos à vida e à vida familiar.

    Eles pedem ao tribunal que determine que os países que alimentam a crise climática sejam obrigados a proteger, não só seus próprios cidadãos, mas também aqueles que estão fora das suas fronteiras, mas são impactados pelas suas ações.

    A exigência é que os 32 países, que incluem os 27 países da União Europeia, além de Noruega, Rússia, Suíça, Turquia e Reino Unido, reduzam drasticamente a emissão de gases de efeito estufa e obriguem as empresas sediadas a também reduzirem suas emissões.

    Os países, por outro lado, alegam que nenhum dos requerentes demonstrou ter sofrido danos graves em consequência das alterações climáticas.

    O governo da Grécia – um país que acabou de passar por um verão mortal, com incêndios e tempestades – disse na sua resposta: “Os efeitos das alterações climáticas registrados até agora não parecem afetar diretamente a vida humana ou a saúde humana”.

    O processo pode seguir vários caminhos.

    O tribunal pode rejeitar a reclamação por motivos processuais ou decidir que não tem jurisdição para julgá-lo.

    Se ultrapassar os obstáculos processuais, o tribunal poderá decidir que os países não têm obrigações em matéria de direitos humanos no que diz respeito às alterações climáticas.

    “Isso poderia ser muito prejudicial para outros casos semelhantes”, disse Michael B. Gerrard, diretor do Centro Sabin para Legislação sobre Mudanças Climáticas da Faculdade de Direito de Columbia.

    Ou o tribunal poderia decidir a favor dos requerentes. O julgamento “atuaria como um tratado juridicamente vinculativo”, disse Ó Cuinn à CNN, forçando todos os 32 países a acelerar suas ações para conter as mudanças climáticas.

    “Esta pode ser uma decisão extremamente importante que inspirará mais casos climáticos em toda a Europa e talvez em muitas outras regiões”, disse Gerrard à CNN.

    A ação é a maior de três ações que correm no tribunal, todas relacionadas às obrigações dos países para com os seus cidadãos no que diz respeito às alterações climáticas. Os outros dois processos foram ouvidos em março.

    Um foi apresentado por mais de 2 mil mulheres suíças que alegaram que as ondas de calor alimentadas pelas alterações climáticas prejudicavam a sua saúde e qualidade de vida. O outro foi movido por um presidente da Câmara francês, que alegou que o fato de a França não agir contra as alterações climáticas violava seus direitos humanos.

    Não está claro se os tribunais decidirão sobre todas as reivindicações em conjunto, mas o prazo entre a audiência e o julgamento é entre nove e 18 meses, disse Gerry Liston, advogado sênior da GLAN.

    A ascensão do litígio climático

    À medida que as condições meteorológicas extremas se tornam recorrentes, os litígios climáticos revelam-se uma ferramenta cada vez mais popular para tentar forçar ações de combate às mudanças climáticas, especialmente porque as nações do mundo não têm feito o suficiente para reduzir a poluição e evitar níveis catastróficos de aquecimento.

    Mesmo que as atuais políticas climáticas sejam cumpridas, o mundo ainda está a caminho para um aquecimento superior a 2,5°C acima dos níveis pré-industriais até ao final do século.

    O planeta já está 1,2 grau mais quente e os impactos são claros. Só neste ano já houve ondas de calor recorde, incêndios florestais sem precedentes e inundações catastróficas.

    Os países estão fazendo o mínimo, disse Liston da GLAN, e se todas as nações fizerem isso, “vamos continuar numa trajetória totalmente catastrófica”.

    É por isso que as pessoas têm recorrido aos tribunais. Existem mais de 2.400 ações judiciais climáticas em todo o mundo, de acordo com o Sabin Center, e mais são adicionadas a cada semana.

    Relembre:

    O litígio climático é uma ferramenta importante, disse Catherine Higham, coordenadora do projeto Leis do Mundo sobre Mudanças Climáticas da London School of Economics. “Mas acho que é apenas uma peça do quebra-cabeça”, disse ela à CNN.

    A defesa contínua e as conferências climáticas – como a próxima cimeira COP28 das Nações Unidas no Dubai – também são vitais, acrescentou ela.

    Para os requerentes portugueses, será uma espera ansiosa pela decisão do tribunal. Mesmo que a reivindicação não corra bem, disse Mota, pelo menos terá feito as pessoas sentarem-se e prestarem atenção.

    Ainda assim, acrescentou ela, “ansiamos por um resultado positivo”.

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