Entenda o que são as garantias de segurança para a Ucrânia
Líderes europeus se reuniram com Trump e Zelensky para discutirem futuro pós-acordo de paz com a Rússia

As garantias de segurança tornaram-se um foco central nas discussões sobre um acordo de paz para a Ucrânia, com o presidente do país, Volodymyr Zelensky, afirmando na Casa Branca, na segunda-feira (18), que elas são a "questão-chave, um ponto de partida para o fim da guerra".
Zelensky sabe que, a longo prazo, a superioridade numérica e armamentista da Rússia acabará com a resistência ucraniana. Por isso, ele insiste há muito tempo que qualquer acordo deve fornecer à Ucrânia promessas de que os EUA e a Europa impedirão os russos de retomar os ataques em um ou dois anos.
Como seriam as garantias de segurança e quem está envolvido?
Em primeiro lugar, este é um território desconhecido: a "Coalizão dos Dispostos", um grupo de aliados ucranianos importantes, ainda está analisando o que pode oferecer de forma realista.
O objetivo é bastante claro: dissuadir os russos de novos ataques à Ucrânia nos próximos anos. A forma é menos clara, mas provavelmente haverá um plano para enviar forças terrestres e apoiar a Ucrânia pelo mar e pelo ar. Também haveria ajuda na reconstrução do exército ucraniano, agora fraco por mais de três anos de guerra.
De fato, Zelensky argumentou que um exército ucraniano forte é, por si só, uma garantia de segurança. O presidente francês, Emmanuel Macron, enfatizou o apoio dos aliados a "um exército ucraniano robusto, capaz de resistir a qualquer tentativa de ataque e dissuadi-la, e, portanto, sem limitações em termos de número, capacidade ou armamento".

No início deste ano, o Reino Unido e a França apresentaram o conceito de uma força multinacional que, segundo o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, seria "implantada após um cessar-fogo para dissuadir a agressão russa nos próximos anos".
Inicialmente, falava-se de que os dois países liderariam um contingente de cerca de 30.000 soldados que seria destacado para a Ucrânia. Isso deu lugar a discussões sobre uma força de dissuasão menor em terra e um "guarda-chuva de segurança" fornecido por seus aliados, que incluiria elementos navais, aéreos e de treinamento.
Cerca de 30 países aderiram à coalizão. Mas ainda não está claro o que cada um deles estaria disposto a contribuir. Países como Alemanha e Itália relutam em enviar tropas terrestres; Austrália e Canadá podem estar mais dispostos.
A coalizão forneceria "forças de segurança no mar, no ar e em terra que os aliados estão prontos para fornecer à Ucrânia", disse Macron na segunda-feira (18). Ele acrescentou: "Precisaremos ajudar a Ucrânia com tropas em terra, para garantir que não haja intrusão da Rússia no futuro".
No entanto, não há chance de essa possível força ser mobilizada dentro e ao redor da Ucrânia antes do fim das hostilidades, o que dá ao Kremlin o que alguns analistas chamam de um veto poderoso.
Zelensky disse nesta terça-feira (19): "Já estamos trabalhando no conteúdo concreto das garantias de segurança", um processo que continuará em ritmo acelerado nas próximas semanas.
Mas aqui está o problema. Uma força de garantia completa, espalhada por uma linha de frente de 1.000 quilômetros, exigiria muito mais de 100.000 soldados, um número enorme para os exércitos europeus, que diminuíram desde o fim da Guerra Fria.

Na década de 1990, por exemplo, um corpo de 60.000 homens da Otan foi destacado para uma linha de frente muito menor na guerra da Bósnia.
Agora, adicione logística, rotações e uma estrutura de comando ao que precisa ser definido. E regras de engajamento em caso de violações do cessar-fogo, que teriam que ser acordadas por todos os governos com tropas em terra.
“A força mobilizada precisaria ser confiável para Moscou e a coalizão determinada a agir decisivamente em caso de violação do cessar-fogo”, de acordo com um relatório do IISS (Instituto Internacional de Estudos Estratégicos).
Mais viável, segundo analistas militares, seria uma força de dissuasão de cerca de 10.000 soldados, uma espécie de aviso à Rússia de que qualquer retomada dos ataques teria um preço. Essa força estaria na Ucrânia, mas não necessariamente perto das linhas de frente.
“Seu efeito de dissuasão sobre as forças russas seria alcançado principalmente por sua própria presença, já que a capacidade para operações de combate de alta intensidade seria limitada”, afirma o IISS sobre essa opção.
Já houve garantias de segurança na Ucrânia antes?
Na verdade, não. Houve um fluxo de armas – tanto da Europa quanto dos EUA – ao longo da guerra, bem como um considerável compartilhamento de inteligência. E durante o governo Biden, houve muita discussão sobre o caminho da Ucrânia para a adesão plena à Otan ou algum status de afiliada.
Mas essa perspectiva desapareceu quando Trump retornou ao cargo.
No fim de semana, o presidente americano reiterou que a Ucrânia não teria permissão para se juntar à aliança de segurança liderada pelos EUA – em linha com uma importante demanda russa.
Antes da invasão total da Rússia, havia uma missão civil de monitoramento, comandada pela OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa), que monitorava violações ao longo da linha de frente no leste da Ucrânia.
Mas ela não estava equipada para oferecer garantias de segurança e era frequentemente ignorada por ambos os lados.
Qual seria o papel dos EUA?
Esse é o elefante na sala.

Foi apenas nos últimos dias que Donald Trump, se convenceu da ideia de os EUA se envolverem na oferta de garantias de segurança à Ucrânia. Anteriormente, ele e outros membros do governo haviam afirmado sem rodeios que a responsabilidade era dos europeus.
Trump foi vago sobre a natureza do compromisso nas negociações da Casa Branca na segunda-feira (18). Ele sugeriu em uma publicação no Truth Social que as garantias "seriam fornecidas pelos vários países europeus, em coordenação com os Estados Unidos da América".
Mas Trump rejeitou na terça-feira (19) a perspectiva de tropas americanas serem enviadas para solo ucraniano.
"O que isso significará exatamente – o envolvimento dos EUA – será discutido nos próximos dias", disse o Secretário-Geral da Otan, Mark Rutte, em entrevista à Fox News.
Mas Rutte descreveu qualquer envolvimento dos EUA como um "avanço", o que de fato é – porque os russos jamais levariam a sério a ideia de uma força de segurança europeia sem o apoio dos EUA.
Os EUA têm capacidades importantes que os europeus não têm – sua coleta de inteligência e a capacidade de suprimir as defesas aéreas inimigas em larga escala são apenas dois exemplos. Mas o governo Trump estará atento a qualquer papel dos EUA que possa levar a uma escalada.
Mesmo assim, a Rússia vai aceitar essas ideias?
Em suma, não. Na segunda-feira (18), o governo reiterou sua insistência de que não poderia haver tropas de nenhum país da Otan em solo ucraniano. A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova, rejeitou "qualquer cenário que preveja o surgimento na Ucrânia de um contingente militar com a participação de países da Otan".
Moscou também insistiu que qualquer acordo de paz inclua limites ao número e à capacidade das forças armadas ucranianas. Afirma que também merece garantias de segurança e sempre alegou que a expansão da Otan para o leste é uma das causas do conflito.
Isso contradiz a insistência de Trump de que, na cúpula do Alasca, "Putin concordou que a Rússia aceitaria garantias de segurança para a Ucrânia. E este é um dos pontos-chave que precisamos considerar".
A questão é se Putin pode ser persuadido a permitir que a Ucrânia tenha qualquer tipo de garantia de segurança em troca da garantia dos ganhos russos no campo de batalha e – por exemplo – do reconhecimento da soberania russa sobre a Crimeia.
Há outro risco. A Rússia pode ser tentada a testar a determinação de qualquer força de garantia, criando algum pretexto para uma nova ação militar. Por sua vez, isso poderia contribuir para a maior ambição de Putin: dividir a aliança transatlântica, com os EUA relutantes em cumprir as garantias de segurança com as quais os europeus se comprometeram.
Existem alternativas?
Há mais discussões agora sobre parte da garantia de segurança vir na forma de cobertura aérea para a Ucrânia, um pouco como as zonas de exclusão aérea sobre o Iraque na década de 1990, que foram projetadas para impedir ataques das forças de Saddam Hussein contra minorias.
“O maior efeito dissuasor seria alcançado com o posicionamento não apenas de elementos terrestres, mas também de elementos aéreos de combate na Ucrânia”, afirma o IISS. Mais poder aéreo poderia ser alocado na Polônia e na Romênia.
Tal presença proporcionaria vigilância e reconhecimento, mas teria dificuldades para manter a superioridade aérea se desafiada pelos russos. E haveria o risco de uma rápida escalada se, por exemplo, caças se envolvessem em combate aéreo.
Além disso, afirma um observador, poder aéreo e tropas terrestres são como ovos e bacon – a galinha está envolvida, o porco está comprometido.
E os ucranianos querem comprometimento, não envolvimento.



