Itamaraty ignora esforços de Israel para nomear novo embaixador no Brasil

Atual representante israelense deve deixar Brasília na semana que vem sem sucessor aprovado

Mariana Catacci, da CNN
Palácio do Itamaraty, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília  • Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
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O Ministério das Relações Exteriores do Brasil teria ignorado os últimos esforços da chancelaria israelense para manter um representante de Israel no Brasil, a poucos dias da partida do embaixador Daniel Zonshine.

A CNN apurou que representantes da embaixada de Israel se reuniram com o setor do Itamaraty responsável pelo Oriente Médio para apresentar uma lista de medidas que poderiam convencer o Brasil a destravar a nomeação de um novo embaixador israelense em Brasília.

Durante as reuniões, teriam sido mencionadas algumas possibilidades, com o objetivo de entender que tipo de gesto seria suficiente ou esperado pelo Itamaraty em meio à tensão diplomática entre os dois países. No entanto, o Ministério das Relações Exteriores não respondeu.

Para uma fonte próxima à chancelaria israelense, o silêncio do Itamaraty gerou o entendimento de que "não há interesse em resolver o impasse". A CNN entrou em contato com o MRE, que disse que "não se manifesta sobre assuntos cobertos por sigilo".

O embaixador Daniel Zonshine deve deixar o Brasil na semana que vem, sem um sucessor aprovado pelo governo brasileiro. O nome indicado por Israel para substituir Zonshine é Gali Dagan, ex-embaixador israelense na Colômbia.

Dagan deixou a Colômbia em meados de 2024 após atritos com o governo de Gustavo Petro. O presidente colombiano é um crítico aberto das ações de Israel na Faixa de Gaza e já chamou a ofensiva de "genocídio", desencadeando trocas de farpas com o então embaixador israelense em Bogotá.

O chanceler da Colômbia, Álvaro Leyva, chegou a exigir que Dagan se desculpasse e deixasse o país após o embaixador acusar Petro de fazer declarações "hostis e antissemitas".

O pedido para que Gali Dagan seja nomeado como novo embaixador no Brasil foi feito em janeiro pela administração israelense, mas segue sem aprovação. O consentimento de um Estado para que um diplomata estrangeiro seja nomeado é conhecido como "agrément", e os pedidos raramente são negados.

Para o cientista político e pesquisador de Harvard Hussein Kalout, ex-Secretário Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, a postura do Itamaraty sobre a guerra que já deixou mais de 60 mil mortos em Gaza é clara: "Enquanto a guerra continuar, será difícil o Brasil conceder agrément à indicação de um novo embaixador de Israel no Brasil".

A CNN apurou, em ocasiões anteriores, que o Brasil não teria interesse em voltar a ampliar as relações com Israel pelo menos até o fim de guerra em Gaza.

A tensão entre o Brasil e Israel tem escalado e atingiu o ápice no mês passado, quando o Brasil aderiu ao processo que acusa Israel de genocídio na Corte Internacional de Justiça, além de ter se retirado da Aliança Internacional de Memória do Holocausto.

Segundo o chanceler Mauro Vieira, o Brasil fez um "enorme esforço" para promover negociações para encerrar o conflito, mas decidiu oficializar o apoio à ação da África do Sul diante dos "últimos desenvolvimentos da guerra". Em resposta, o Ministério das Relações Exteriores de Israel chamou a decisão do Brasil de "demonstração do profundo fracasso moral".

No ano passado, o presidente Lula foi declarado "persona non grata" por Israel após relacionar a ofensiva israelense em Gaza ao Holocausto. A fala de Lula também levou Israel a convocar o então embaixador brasileiro em Tel Aviv, Frederico Meyer, para uma visita de reprimenda ao Museu do Holocausto. O gesto foi interpretado como um constrangimento pelo governo do Brasil, que retirou o embaixador de Israel.