Saiba quem é Salman Rushdie, escritor esfaqueado que é jurado de morte

Agressor foi condenado a 25 anos de prisão nesta sexta-feira (16)

Mariana Catacci e Tiago Tortella, da CNN, em São Paulo
O escritor Salman Rushdie
O escritor Salman Rushdie foi atacado no palco de um evento em Nova York  • Reuters
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O homem que esfaqueou e cegou parcialmente o romancista Salman Rushdie no palco de um instituto de artes no oeste de Nova York em 2022 foi condenado a 25 anos de prisão nesta sexta-feira (16) por um ataque que também feriu um segundo homem, informou o promotor público.

Hadi Matar, de 27 anos, cidadão americano de Fairview, Nova Jersey, foi considerado culpado de agredir o autor no Tribunal do Condado de Chautauqua, em Mayville, Nova York, em fevereiro. Ele recebeu a pena máxima de 25 anos de prisão pela acusação de tentativa de homicídio.

Rushdie, de 77 anos, enfrenta ameaças de morte desde a publicação de seu romance “Os Versos Satânicos”, em 1988, que o aiatolá Ruhollah Khomeini, então líder supremo do Irã, denunciou como blasfemo, levando a um apelo pela morte de Rushdie, um decreto conhecido como fatwa.

O vídeo que registrou o ataque mostra Matar correndo para o palco da Instituição Chautauqua enquanto Salman Rushdie era apresentado ao público para uma palestra sobre como proteger escritores de perigos. Parte do vídeo foi exibida ao júri durante os sete dias de depoimentos.

“Ele está traumatizado. Ele tem pesadelos com o que passou”, disse o promotor público do Condado de Chautauqua, Jason Schmidt, após a audiência de sentença, referindo-se ao sofrimento de Rushdie.

"Versos satânicos"

Rushdie nasceu na Índia, mas se mudou para a Inglaterra, onde estudou e se formou em história. Publicou sua primeira novela, "Grimus", em 1975.

A forma como ele aborda assuntos políticos e religiosos delicados em suas obras o transformou em uma figura controversa. Isso chegou ao ápice com a publicação de seu quarto romance: "Os Versos Satânicos", em 1988.

O livro foi amplamente criticado pela comunidade muçulmana, que o considerou um sacrilégio. Em 1989, o líder iraniano, o aiatolá Ruhollah Khomeini, afirmou que Rushdie cometia blasfêmia e que "era insulto ao Islã e ao profeta Maomé", e emitiu um decreto religioso – ou fatwa – pedindo sua morte.

"É um caso de fundamentalismo religioso. Uma instrumentalização política do texto religioso. Neste caso, em âmbito internacional. Uma vez que não compete ao governo de um país condenar os cidadãos de outros países com base nas leis de seu Estado", afirma Luana Hordones Chaves, pesquisadora pela Unesp.

Assim, nos anos seguintes, o escritor viveu sob um forte esquema de segurança.

Em 1998, o governo do Irã informou que tentaria não executar a ordem. Mesmo assim, esse assunto não se encerrou e, em 2017, o líder supremo do país, o aiatolá Ali Khamenei, destacou que o decreto ainda estava em vigor.

Organizações iranianas, algumas afiliadas ao governo, levantaram uma recompensa de milhões de dólares pelo assassinato de Rushdie. Em 2019, Khamenei voltou a dizer que a medida era “irrevogável”.

Chaves ressalta que o caso expõe um conflito, por exemplo, de soberania, visto que o Irã condenou um cidadão britânico – que também não estava em solo iraniano. Diversos veículos de imprensa e a Organização das Nações Unidas (ONU) se movimentaram pela defesa da vida do escritor.

"Acontece que os direitos de liberdade de expressão (inclusive de cunho religioso) e a liberdade de religião que a carta da ONU defende entram em contradição com os direitos de muitos países muçulmanos. Exatamente porque, na perspectiva islâmica, apostasia e blasfêmia são consideradas crimes", explica a especialista.