Livro apresenta história fotográfica de homens apaixonados
Casal publica parte de coleção de mais de 3 mil fotos, dos séculos XIX e XX, em obra lançada nos Estados Unidos
Quando os norte-americanos Hugh Nini e Neal Treadwell encontraram uma velha fotografia em uma loja de antiguidades em Dallas, Texas, viram algo de si mesmos refletido na imagem.
Tirada por volta de 1920, ela mostra dois homens em frente a uma casa, posando em um abraço amoroso em um momento em que ser gay não só era desaprovado como também ilegal.
“A imagem nos representava, então compramos o retrato, levamos para casa e o deixamos sobre a nossa mesa por seis ou nove meses”, lembrou Treadwell em uma entrevista por telefone da casa do casal em Nova York. “Foi uma descoberta aleatória e nunca pensamos que encontraríamos outra”.
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Ainda assim, nas duas décadas seguintes, o casal descobriu muito mais imagens como essa. Na verdade, vasculhando leilões, brechós e feiras de antiguidades, eles acumularam um arquivo de quase 3.000 fotografias de homens apaixonados.
Capturada entre meados do século 19 e logo após a Segunda Guerra Mundial, e com cenas nos cinco continentes, a coleção é composta por retratos e fotos espontâneas de casais deitados na cama, fazendo piquenique na grama e posando ao lado de seus carros.
Nini e Treadwell podem não saber as circunstâncias em que as fotos foram tiradas, mas acreditam que a linguagem corporal e os olhares mútuos dos personagens são, sem dúvida, os de homens em situações românticas.
Mais de 300 das fotos agora estão publicadas no livro Loving: A Photographic History of Men in Love, 1850s-1950s (Amar: Uma história fotográfica de homens apaixonados, 1850-1950, sem edição no Brasil). Juntos, elas oferecem vislumbres íntimos de vidas românticas que provavelmente permaneceram ocultas em sua época.
“Este livro significa, pela primeira vez, que essas pessoas, esses casais, podem falar por si mesmos”, afirmou Nini. “Eles não podiam fazer isso quando estavam vivos, mas podem fazer agora, e acho que isso é muito poderoso”.
Considerando que muitas das imagens vêm de uma época em que tirar, revelar ou guardar essas fotos podia representar um risco significativo à segurança pessoal (ou mesmo à liberdade), elas também representam atos individuais de bravura, acrescentou Nini.
“Esses casais fizeram algo muito arriscado porque realmente se preocupavam um com o outro. Eles eternizaram seus sentimentos com essas fotos e tiveram que escondê-las para sempre”.
Amor proibido
As fotos mostram jovens casais que só poderiam ter sonhado com as liberdades concedidas a Nini e Treadwell, que se casaram não oficialmente em 1992 (e legalmente 14 anos depois, depois que Massachusetts se tornou o primeiro estado dos EUA a permitir a união entre pessoas do mesmo sexo).
No entanto, a coleção mostra exemplos históricos de homens trocando alianças e participando de cerimônias de casamento informais. Em uma imagem, que se acredita ser da virada do século 20, um jovem casal é visto segurando uma placa que diz: “Não casados, mas com vontade de ser.”
Além de mostrar a evolução das atitudes, dos penteados e da moda ao longo das décadas, as imagens também traçam o desenvolvimento da fotografia como meio de comunicação. As fotos mais antigas da coleção foram feitas usando as primeiras formas de câmera e incluem ambrótipos, que foram produzidos em vidro, e daguerreótipos, que apareciam em placas de metal.
O arquivo passa pelo surgimento da fotografia em papel e depois pelas cabines fotográficas. Em seguida, as várias fotos tiradas no reflexo dos espelhos mostram que a necessidade de confiar no fotógrafo havia sido eliminada.
Embora Nini e Treadwell não saibam quase nada sobre seus temas, eles sabem ainda menos sobre onde os retratos estiveram nas décadas seguintes até serem redescobertos.
“Algumas das fotos têm vincos, então talvez tenham sido dobradas e colocadas em uma carteira, enquanto outras estão intactas, parece que ficaram dentro de um livro ou escondidas em uma gaveta”, refletiu Treadwell.
“É surpreendente para nós imaginar como foi essa trajetória, não só a do casal em si, mas também da fotografia que foi repassada durante décadas. Será que ela foi compartilhada por amigos? Foi guardada por uma família? Como ela chegou até nossas mãos?”
Cabe, portanto, ao espectador imaginar as histórias por trás de cada foto. Para o casal, a amplitude de respostas positivas à coleção é um testemunho da universalidade do amor.
“É comovente e gratificante saber que essa coleção é significativa e que toca desde alguém com 18 ou 20 anos até avós que estão olhando as fotos porque seus netos são gays. Ou chega a um idoso gay, ou pessoas heterossexuais, enfim toda a gama de pessoas”, disse Treadwell.
“A mensagem do nosso livro não é sobre sexualidade”, acrescentou Nini. “Nossa posição é que o amor não tem sexualidade: é universal”. “Loving: A Photographic History of Men in Love, 1850-1950, “ foi publicado nos Estados Unidos pela editora 5 Continentes Edition.
(Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês).