Câncer de próstata: quando o rastreamento é indicado?

Consultas regulares ao urologista e exames periódicos são importantes para aumentar as chances de diagnóstico precoce

Gabriela Maraccini, da CNN
Rastreamento do câncer de próstata aumenta as chances de diagnóstico precoce e, consequentemente, probabilidade de cura no tratamento  • Pressfoto/Freepik
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Entre os fatores que aumentam o risco para o câncer de próstata, estão a idade (a partir dos 60 anos), histórico da doença da família, herança genética e raça negra. Nesses grupos mais propensos a desenvolver o tumor, o rastreamento com exames clínicos e laboratoriais é essencial para aumentar as chances de diagnóstico precoce e, consequentemente, sucesso no tratamento.

O rastreamento do câncer de próstata é feito através do toque retal e do exame de sangue para avaliar a dosagem do PSA (antígeno prostático específico). Essa é uma proteína produzida pela próstata que, em níveis elevados, pode indicar alguma doença na glândula, incluindo o câncer.

"O recomendado é que homens a partir de 50 anos busquem avaliação especializada para o rastreamento do câncer de próstata. Para homens negros ou com histórico familiar da doença, o rastreio deve ser iniciado aos 45 anos", explica Charles Kelson Aquino, urologista da Hapvida Notredame Intermédica, à CNN.

Além do toque retal e da dosagem do PSA no sangue, também podem ser incluídos no rastreamento exames como ultrassom da próstata e ressonância magnética, segundo Aquino. A confirmação do diagnóstico é feita através da biópsia da próstata por via trans-retal ou trans-perineal, guiada por exames de imagem.

Ministério da Saúde e OMS não recomendam rastreamento para população geral; especialista faz ressalva

O Ministério da Saúde, assim como a Organização Mundial da Saúde (OMS), não recomenda que o rastreamento do câncer de próstata seja feito em homens que não têm maior risco para a doença e que não apresentam sintomas. Segundo essas entidades, não há evidência científica de que o rastreamento traga mais benefícios do que riscos.

A orientação da pasta gera discussão na área de oncologia e urologia. "Essa recomendação foi inspirada no órgão americano US Preventive Task Force, que orientava o não rastreamento do câncer de próstata. O argumento é que grande parte dos homens naquele país diagnosticam a doença em estágio localizado, sem metástase, e, consequentemente, o diagnóstico não teria impacto na melhora da sobrevida dos pacientes", explica Bruno Benigno, urologista e oncologista do Hospital Oswaldo Cruz e diretor da Clínica Uro Onco.

No entanto, o especialista alerta que a realidade brasileira é outra. "Transportar esses dados para nosso país não faz sentido, uma vez que vivemos, ainda, uma dificuldade de acesso e rastreamento", afirma.

Benigno explica que, segundo dados do próprio Instituto Nacional do Câncer (Inca), 30% a 35% dos brasileiros já descobrem o câncer de próstata em estágio avançado.

"Ou seja, são casos que poderiam ter sido detectados anteriormente se nós tivéssemos um programa de rastreamento populacional mais cedo", argumenta o urologista. "Na minha opinião, não fazer o rastreamento populacional em homens brasileiros pode trazer um risco ainda maior da parcela da população que descobre a doença avançada", completa.

Foi o que aconteceu nos Estados Unidos em 2018, quando as diretrizes foram atualizadas para recomendar que homens discutam com seus médicos sobre o rastreamento do câncer de próstata entre os 55 e 69 anos. Dessa forma, é reconhecido que a decisão final sobre fazer ou não o rastreamento deve ser individualizada e baseada nas preferências do paciente, considerando potenciais riscos e benefícios. O mesmo é feito no Reino Unido.

A Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), de Urologia (SBU) e de Radioterapia (SBRT) seguem o mesmo raciocínio e recomendam que seja discutido individualmente o rastreamento considerado que a doença é assintomática (ou seja, não apresenta sintomas) em suas fases iniciais.

Em posicionamento assinado em conjunto, as sociedades recomendam a discussão sobre potenciais riscos e benefícios do rastreamento do câncer de próstata com PSA. "Essa discussão deve também envolver a possibilidade do diagnóstico de tumores de próstata indolentes ou que não necessitam de tratamento imediato; possíveis riscos relacionados aos tratamentos e aos impactos negativos na qualidade de vida", diz a nota.

Dessa forma, o que considerar para iniciar o rastreamento?

Diante das diferentes posições sobre o rastreamento, ouvir a opinião e recomendação do médico urologista é fundamental. Isso porque, independentemente de ter risco aumentado ou não para o câncer de próstata, o diagnóstico precoce é fundamental para o sucesso do tratamento e maior probabilidade de cura.

"Se por um lado se discute o excesso eventual de exames ou procedimentos, por outro lado, há o fantasma da doença avançada", pondera Aquino. "Na fase avançada do câncer de próstata, o paciente pode apresentar uma série de sintomas debilitantes. As dores intensas e de difícil controle são comuns, especialmente dores pélvicas e dores associadas à micção. A obstrução miccional pode ocorrer, levando à necessidade de uso de sonda uretral ou à realização de uma cistostomia [procedimento cirúrgico que cria uma abertura na bexiga]."

Além disso, no câncer de próstata avançado, pode haver sangramento urinário, dor no reto e dor óssea.

"O fim da vida de um paciente com câncer de próstata terminal é muitas vezes triste, sendo um processo lento e sofrido tanto para o paciente quanto para a família", considera Aquino. "A minha opinião -- e, acredito, que a de muitos urologistas -- é de que o tempo irá comprovar, como tem sido sugerido em tantos trabalhos recentes, que, mesmo com algum risco de excessos na medicina, a avaliação preventiva faz mais sentido e diminui os riscos de um câncer avançado", afirma.

Benigno lembra, ainda, que o diagnóstico precoce, feito através do rastreamento, pode reduzir as chances de sequelas no tratamento. "Quando o câncer de próstata é localizado, ele ainda não teve tempo de infiltrar o esfíncter urinário e os nervos da ereção, que ficam fora da próstata. Portanto, também os riscos de sequelas, de perda da ereção e de incontinência urinária, que podem estar relacionados ao tratamento, são menores", afirma.

O especialista ressalta também que a consulta regular com médico urologista não serve apenas para avaliar a saúde da próstata, mas, sim, a saúde do homem como um todo.

"Nós sempre vamos abordar a saúde do homem de forma geral, qualidade do sono, atividade física, alimentação, se o paciente tem sobrepeso, estimular o paciente a parar de fumar, enfim, e também avaliar os sintomas urinários, como jato fraco, incontinência urinária, risco de câncer de próstata e questões relacionadas à ereção. Portanto, o rastreamento não é um momento focado apenas para a saúde da próstata, e sim para a saúde do homem como um todo, e é por isso que eu acho que é importante, sim, mantermos as campanhas de rastreamento", finaliza.