Análise: Trump e o dilema do Oriente Médio
Envolvimento militar direto dos EUA no conflito Irã-Israel romperia com padrão diplomático adotado pelo presidente americano, gerando riscos geopolíticos, econômicos e eleitorais significativos

A possibilidade de um envolvimento direto dos Estados Unidos na guerra entre Irã e Israel representa um ponto de inflexão delicado na política externa norte-americana, especialmente sob a liderança de Donald Trump, cuja trajetória presidencial tem sido marcada por uma postura reticente em relação a intervenções militares prolongadas no exterior.
Apesar da retórica frequentemente combativa, Trump tem adotado, na prática, uma lógica de contenção e seletividade no uso da força.
A doutrina informal do republicano privilegia o desengajamento das chamadas “guerras intermináveis”, a priorização de objetivos militares pontuais e o controle estrito dos riscos associados à ação armada.
Exemplo disso foi a decisão de manter distância dos conflitos sírios, limitando-se a ataques cirúrgicos, como o bombardeio à base de Shayrat em 2017, ou ainda a opção por iniciar a retirada das tropas americanas do Afeganistão.
Mesmo em momentos de alta tensão com o Irã, como a operação que eliminou o general Qassem Soleimani em 2020, Donald Trump demonstrou aversão à escalada, insistindo que os Estados Unidos não buscavam guerra.
Essa coerência em evitar envolvimentos diretos torna ainda mais sensível a hipótese atual de uma intervenção aberta em defesa de Israel.
Tal decisão não apenas desafiaria os limites autoimpostos de sua política externa, como também colocaria em xeque a identidade política que o presidente americano construiu junto a sua base eleitoral, especialmente entre os eleitores do movimento Make America Great Again (MAGA), que historicamente rejeitam o engajamento militar prolongado e o papel de “polícia global”.
Além do custo humano e político, o impacto de uma escalada regional seria profundamente desestabilizador para a economia internacional.
O estreito de Ormuz, por onde passa cerca de 20% do petróleo comercializado no mundo, se tornaria um epicentro de risco geopolítico.
A interrupção ou mesmo a ameaça à sua segurança já é suficiente para gerar aumentos nos preços da energia, injetar volatilidade nos mercados e agravar as pressões inflacionárias globais, efeitos que repercutiriam diretamente no ambiente doméstico dos Estados Unidos.
Internamente, o ambiente político tampouco favorece uma decisão dessa magnitude.
Americanos são contra envolvimento em guerra no Oriente Médio
Pesquisas de opinião pública recentes apontam que a maioria dos norte-americanos se opõe ao envio de tropas ou ao envolvimento direto em mais uma guerra no Oriente Médio.
Segundo uma pesquisa conduzida entre 13 e 16 de junho de 2025 pelo Economist/YouGov, 60% dos americanos são contra que os EUA iniciem envolvimento militar direto no conflito entre Israel e Irã, enquanto apenas 16% se manifestaram a favor e 24% disseram não ter opinião formada.
Esse panorama se estende à base republicana: 53% dos eleitores de Trump se opõem à intervenção, e só 23% apoiam.
Portanto, um engajamento direto do país nesse conflito representaria não apenas um risco estratégico no Oriente Médio, mas também uma ruptura com a tradição recente da política externa americana sob Trump.
Em um contexto de crescente multipolaridade, desaceleração econômica global e fragmentação das alianças internacionais, abrir um novo front militar seria uma aposta de alto custo e benefícios incertos.
Ao longo da história, muitos líderes acreditaram poder controlar os efeitos de uma guerra limitada. Poucos tiveram sucesso.
Neste momento, prudência não é sinal de fraqueza: é reconhecimento do tamanho da responsabilidade global dos Estados Unidos e das consequências reais de suas escolhas.