Análise: IOF expõe ouvidos moucos de Lula a demandas do setor produtivo
Congresso Nacional patrocinou uma derrota acachapante para o governo enquanto presidente diz que “ministro não decide”

A possibilidade de judicializar a derrubada do decreto que determina o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) por parte do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) denota níveis de fraqueza preocupantes da gestão petista junto ao Congresso Nacional.
Hugo Motta (Republicanos-PB), presidente da Câmara, e o do Senado, Davi Alcolumbre (PSD-AP), demonstraram boa vontade em dar vazão a propostas que visassem a melhora do ambiente fiscal do país pelo lado da despesa, algo que parece absolutamente censurado pela gestão petista.
O governo, por sua vez, inerte, faz-se mouco e estuda como driblar os sinais mais do que claros enviados pelo Legislativo.
Com autonomia, o Congresso Nacional patrocinou uma derrota acachapante para o governo — num sinal de desmoralização não só do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mas também de Gleisi Hoffmann, ministra das Relações Institucionais, nomeada numa iniciativa inexplicável de melhorar a articulação do governo.
Deu no que deu.
Agora, ao invés de ouvir os deputados e senadores — que deram um uníssono recado ao aprovar por 384 votos pela derrubada do decreto a míseros 98 a favor da manutenção —, o governo tira da cartola um acinte à atividade institucional e à voz dos setores atingidos tanto pela proposta original do chamado “pacote robusto”, quanto pela “adaptada” ao cogitar jogar a bomba no colo do Supremo Tribunal Federal (STF). E não é a primeira vez.
Em dezembro de 2023, após aprovação pelo Congresso Nacional da reoneração da folha de 17 setores, o governo editou uma medida provisória revertendo a medida.
Como houve resistência no Legislativo, a Advocacia-Geral da União (AGU) levou a questão ao STF — gerando críticas de que o Executivo estaria usando o tribunal como “escudo político”.
A resposta veio: uma derrubada de um decreto presidencial pelo Congresso Nacional era inédita desde 1992, sob a presidência de Fernando Collor de Mello, de um decreto que alterava as regras para o pagamento de precatórios. Collor sofreria o impeachment meses depois, o que denota o clima arredio da relação na ocasião.
O clima político para uma solução tão extremada, vale dizer, não existe — mas o Congresso manda um recado duro.
O sintoma maior de um problema grave vem de uma declaração de Lula durante a semana. Num evento nessa semana, o presidente admitiu aquilo que todas as emas e jabutis do Palácio da Alvorada já sabem: ele é quem manda e centraliza todas as decisões.
“No meu governo, ministro não decide o que faz, ministro decide o que vai apresentar para mim. Quem decide se vai fazer ou não sou eu”, disse o presidente na última quarta-feira (25).
Essa declaração de Lula escancara o cerne da crise: um presidencialismo que ignora a liturgia do diálogo institucional e a voz dos setores produtivos, além de tratar o Congresso como um cartório carimbador — e não como o poder representativo que é.
Ao concentrar decisões e recorrer ao Supremo como válvula de escape, o presidente escancara um descompasso preocupante entre a vontade expressa no Legislativo e a condução de um governo que parece preferir tribunais a plenários.
O recado do Congresso não foi apenas político, mas institucional: ou o Planalto aprende a compartilhar o poder — ou continuará acumulando derrotas humilhantes que fragilizam o Executivo e a confiança na gestão das contas do país.



