O que empresas brasileiras estão fazendo para reduzir a emissão de poluentes
Na COP26, corporações do país se esforçam para mostrar ações e adesão às pautas ambientais
Mesmo criticado pela falta de ambição climática, o governo brasileiro se comprometeu, na COP26, com metas para reduzir a emissão de gases de efeito estufa.
O país pretende cortá-la em 50% até 2030 e neutralizá-la até 2050 – um cálculo ainda pouco claro e que não supera o que havia sido firmado no Acordo de Paris.
De olho nas exigências do mercado, uma parcela das empresas brasileiras tenta demonstrar que busca uma transição para uma economia de baixo carbono.
É unanimidade que o maior problema do Brasil com as emissões é o desmatamento. Segundo o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), 44% das emissões nacionais são causadas pelo problema, sendo que 90% do desmatamento que acontece no país é ilegal.
Documento do Observatório do Clima informa que, no ano passado, o desmatamento na Amazônia atingiu 10.851 km², a maior taxa em 12 anos. A média, em 2019 e 2020, foi de 10.490 km² desmatados por ano, um número 62% maior que a média anual de 6.494 km² registrada na década anterior.
“O desmatamento ilegal não traz nenhum tipo de benefício para a sociedade, não cria empregos qualificados, não fortalece o setor florestal responsável e ainda aumenta o impacto dos gases de efeito estufa sobre a atmosfera, em vez de alimentar uma indústria capaz de absorver CO2 [gás carbônico]. Beneficia poucos responsáveis por ações criminosas e deixa o prejuízo para a maciça maioria dos brasileiros”, analisa Marina Grossi, presidente do CEBDS.
A organização reúne cerca de 80 empresas que representam 50% do PIB (Produto Interno Bruto brasileiro) e argumenta que o mercado brasileiro já desenvolve ações para reduzir o desmatamento, além de trabalhar para influenciar políticas nesse sentido.
No último domingo (8), durante a COP26, foi lançado o “Posicionamento do Setor empresarial pela Amazônia“, documento que aponta ações como rastreabilidade das cadeias produtivas, transparência, fim do desmatamento ilegal e uso de tecnologias.
Mais uma demonstração desse esforço foi a entrega de outro documento a ministros brasileiros e ao presidente da COP26, Alok Sharma. O “Posicionamento Empresários pelo Clima” reúne a assinatura de 115 empresas e 14 entidades setoriais que defendem medidas para uma economia de baixo carbono e assumem responsabilidades nessa transformação.
Essas companhias vêm adotando medidas para reduzir e compensar as emissões de gases causadores do efeito estufa, fazer a precificação interna de carbono, descarbonizar as operações e as cadeias de valor e estabelecer metas de neutralidade climática até 2050.
Gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional das Indústrias (CNI), Davi Bomtempo explica que esse processo de adaptação vem se internalizando nas empresas há alguns anos. Não só pelo corte de emissões, mas também considerando custos e economia de recursos no sistema produtivo.
Na terça-feira (9), a CNI apresentou na COP uma estratégia de transição energética baseada em quatro pilares: eficiência, com a expansão de energias renováveis, como biocombustíveis, biomassa e eólica em alto-mar; carbono, com a regulação mercado de carbono; economia circular, com a gestão adequada de resíduos, reuso, reciclagem e bens mais duráveis; e conservação florestal, com iniciativas de bioeconomia, pagamento de serviços ambientais e a ratificação do Protocolo de Nagoya – acordo que estabelece regras internacionais para a repartição de benefícios do uso econômico de recursos genéticos da biodiversidade.
“A gente veio mostrar alguns cases de empresas, como elas estão contribuindo para a redução de emissão, de forma também a ser mais competitiva, considerando todo o contexto internacional. Também considerando o perfil do consumidor, que vem mudando ano a ano. Hoje, o consumidor quer saber como o produto ou serviço é produzido, quanto gerou de emissão, quanto gastou de energia, se tem gestão adequada de recursos hídricos, de resíduos, para tomar a decisão de compra”, explica Bomtempo.
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1º nov. 2021 - Ativistas protestam pela conscientização contra o aquecimento global como a “COP26 Hot Air Band” • Hasan Esen/Anadolu Agency via Getty Images
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1º nov. 2021 - Ativista da mudança climática Greta Thunberg participa de protesto perto do local da COP26, em Glasgow, na Escócia • Christopher Furlong/Getty Images
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1º nov. 2021 - Protesto contra o presidente Jair Bolsonaro, na Itália • Reprodução/CNN
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31 out. 2021 - Ativistas fazem manifestação em Bruxelas, capital da Bélgica, no primeiro dia da COP26, que acontece em Glasgow, na Escócia • Reprodução/CNN
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31 out. 2021 - Ativistas fazem manifestação em Bruxelas, capital da Bélgica, no primeiro dia da COP26, que acontece em Glasgow, na Escócia • Reprodução/CNN
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31 out. 2021 - Ativistas fazem manifestação em Bruxelas, capital da Bélgica, no primeiro dia da COP26, que acontece em Glasgow, na Escócia • Reprodução/CNN
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30 out. 2021 - Grupos de peregrinação caminharam até a sede da COP26, em Glasgow, na Escócia; eles são acompanhados por membros do grupo Extinction Rebellion • Foto: Ian Forsyth/Getty Images (30.out.2021)
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30 out. 2021 - Ativistas do grupo ambientalista Ocean Rebellion presos em uma rede de pesca, em Glasgow, na Escócia; eles protestam contra métodos agressivos de pesca e a degradação causada nos oceanos • Foto: Ian Forsyth/Getty Images (30.out.2021)
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30 out. 2021 - Grupos de peregrinação caminham até Glasgow, na Escócia, em protesto contra as mudanças climáticas; Glasgow é a sede da COP26 neste ano • Foto: Christopher Furlong/Getty Images (30.out.2021)
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29 out. 2021 - Ativistas da Ocean Rebellion usando cabeças de latas de óleo com 75 litros de óleo falso, ao lado do campus da COP26, em Glasgow, na Escócia, enquanto a cidade se prepara para a conferência • Foto: Jane Barlow/Getty Images (29.out.2021)
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28 out. 2021 - Ativistas protestaram na sede da COP26 para que os governantes ajam contra as mudanças climáticas • Reprodução/CNN
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28 out. 2021 - COP26: Manifestantes não mostram otimismo com as promessas feitas até o momento e pedem medidas mais profundas • Reprodução/CNN
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28 out. 2021 - Protestos na COP26: ativistas alertaram para o aumento da temperatura no planeta • Reprodução/CNN
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28 out. 2021 - COP26: cartazes mostravam palavras de ordem, afirmando que o "mundo está em chamas" • Reprodução/CNN
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4 nov. 2021 - COP26: ativistas usando cabeças de peixe durante uma manifestação da Ocean Rebellion, em Glasgow, enquanto os líderes mundiais se reúnem para discutir as mudanças climáticas na Cúpula da COP26. (04/11/2021) • Peter Summers/Getty Images
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4 nov. 2021 - COP26: ativistas no quinto dia de conferência. Aceleração da transição de energia fóssil para energia limpa foi o foco do debate nesta quinta. • Divulgação/UNClimatechange
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4 nov. 2021 - COP26: ativistas no quinto dia de conferência. Aceleração da transição de energia fóssil para energia limpa foi o foco do debate nesta quinta. • Divulgação/UNClimatechange
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4 nov. 2021 - COP26: ativistas no quinto dia de conferência. Aceleração da transição de energia fóssil para energia limpa foi o foco do debate nesta quinta. • Divulgação/UNClimatechange
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Gargalos para a transição energética
“A contribuição da empresa depende do setor que ela está, se é intensivo em energia ou tem conexão com agros e florestas”, diz Gustavo Pimentel, diretor da plataforma de investimentos no campo social SITAWI.
No agronegócio, é essencial o cumprimento do Código Florestal, principalmente a recuperação de áreas desmatadas, sem adiamento de prazos para o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e submissão de planos de recuperação ambiental.
“As empresas do agro ou aquelas que compram do setor acabam não demandando que os fornecedores façam essas recuperações porque a lei não está obrigando. Precisamos que elas se antecipem e comecem a exigir antes dos prazos legais ou de uma ação mais incisiva do governo”, avalia.
Em razão das especificidades de cada setor, para o CEBDS, é preciso analisar caso a caso para identificar quais processos devem ser transformados. As empresas associadas, segundo a entidade, estão buscando o objetivo através da precificação de carbono e a descarbonização das operações.
A Ambev, por exemplo, fechou um acordo para a compra de mil caminhões e vans elétricas. A empresa estima que com isso haverá redução de 25% da emissão de CO2 na cadeia produtiva em cinco anos.
A CNI destaca três questões a serem trabalhadas para superar as dificuldades da transição energética. A primeira é o financiamento. “Hoje, o Brasil destina pouco recurso a iniciativas de mudanças climáticas. A gente sabe que tem um fluxo de capital internacional na ordem de US$ 500 bilhões por ano, e apenas 4,5% vão para América Latina e Caribe. Então precisamos superar algumas barreiras”, analisa Bomtempo.
Outras duas questões são aproximar o setor produtivo da academia, a fim de gerar inovação, e formular políticas públicas ambientais para além do comando e controle.
“Tem outra parte que é uma virada de chave que é a questão dos incentivos econômicos que precisam ser cada vez mais utilizados nas políticas públicas brasileiras. Incentivo para usar o material reciclável, por exemplo. Hoje é muito mais caro utilizar essa matéria-prima nos processos”.
Mercado de carbono é crucial para o setor
Esta parcela do setor privado acredita que, para o Brasil, uma transição rápida para uma economia de baixo carbono é possível – e desejada. Com o fim do desmatamento, o país conseguiria cumprir 80% da meta, colocando-se à frente de outros.
Para que isso seja possível, o CEBDS e a CNI avaliam que é fundamental a regulamentação do artigo 6 do Acordo de Paris, que define o mercado global de carbono, e a implantação de um mercado brasileiro de carbono. Para as empresas, o tema é um dos mais importantes desta COP e essencial para conter o aquecimento global.
Discutida desde 2015, a regulamentação poderia gerar um comércio de US$ 167 bilhões ao ano em 2030 e de US$ 347 bilhões ao ano em 2050, segundo a International Emissions Trading Association. O Brasil é um dos países com maior potencial de venda de créditos e pode gerar receitas líquidas de até US$ 72 bilhões até 2030, de acordo com a Environmental Defense Fund.
A criação de um mercado brasileiro de carbono vai garantir a trajetória de uma economia verde no país e sua competitividade internacional. Segundo Pimentel, uma política de clima neste sentido tornaria mais fácil o investimento em iniciativas de agricultura de baixo carbono, eficiência energética e energia renovável.
A transparência dos dados das empresas
Para estes empresários, manter a floresta em pé vendendo créditos de carbono é o que vai financiar o desenvolvimento sustentável, gerando empregos e renda. “Uma economia verde e regenerativa contribui para o combate às mudanças climáticas e traz benefícios para todos: para os brasileiros, para os negócios, para o país, para o planeta”, afirma Grossi.
Claudia Yoshinaga, professora de finanças na FGV-EAESP, avalia que empresas que têm relações com mercados europeus e, agora, com os Estados Unidos estão mais propensas a mostrar ações de sustentabilidade em razão do engajamento desses países nesta pauta, como forma de manter relações comerciais.
Mas ela demonstra ceticismo, assim como outros especialistas em ESG. A sigla, que em inglês quer dizer ambiental, social e governança, trata dos processos da empresa, e vem dos debates sobre responsabilidade corporativa.
O ESG cria avaliações e rankings, através de agências, para nortear os investidores sobre riscos. Fabio Alperowitch, diretor da Fama Investimentos, especializada em ESG, acredita que os brasileiros precisam deixar de acreditar que são a solução, pois ainda representam uma grande parte do problema.
“Quando a gente fala de empresas e investidores, os compromissos são muito baixos. São pouquíssimos gestores que se comprometem. Embora o brasileiro tenha essa percepção de que temos 40% das florestas tropicais do mundo, com a maior biodiversidade, com uma matriz energética adequada, ele não se sente responsável (pelas mudanças climáticas) e não faz nada. Então a gente está muito atrasado. É vergonhoso”, critica.
Apesar de a sigla estar na moda, Yoshinaga entende que falta um entendimento melhor sobre as iniciativas alinhadas com o ESG. Outra preocupação é sobre a transparência dessas ações, que são voluntárias.
No fim das contas, cada empresa mostra o que lhe interessa e faz uma seleção das melhores coisas. É esperado que as corporações tenham ações positivas. O problema é dar muita visibilidade a elas enquanto existem problemas por trás.
“É fácil cair no discurso, enganar quem não entende, o que é muita gente. É muito bacana falar que está todo mundo fazendo, mas temos que ter um pouco de cautela [sobre o que é divulgado]”, diz a professora.
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As casas do projeto chamado Tacla, na Itália, podem ser construídas por impressoras em cerca de 200 horas, consumindo, em média, 6 kW de energia. É preciso apenas uma equipe de duas pessoas para colocar uma residência dessa de pé, e os resíduos podem ser quase totalmente eliminados • Fórum Econômico Mundial/Iago Corazza
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A Heart of School ajudou a facilitar o uso do bambu nas construções de Bali, na Indonésia. Além dos 400 alunos de ensino básico, a escola recebe arquitetos, designers, engenheiros, defensores do meio ambiente e entusiastas interessados em aprender a construir com bambu • Fórum Econômico Mundial/divulgação
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O prédio da Universidade de Ânglia Oriental, no Reino Unido, é construído com vigas de pinho de origem local, 70% do cimento foi substituído por um subproduto da indústria siderúrgica, reduzindo o carbono, e a mistura de concreto usa areia local reciclada • Fórum Econômico Mundial/Dennis Gilbert
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O Woodside Building, da Universidade de Monash, em Melbourne, Austrália, tem tecnologia para atingir carbono zero até 2030. A capacidade térmica dos vidros e a ventilação mecânica da construção são capazes de reduzir o uso de energia. Além disso, a reutilização da água e a produção de energia solar são outros pontos de destaque • Fórum Econômico Mundial/Michael Kai
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O Powerhouse, que fica em Trondheim, na Noruega, gera mais energia renovável durante sua fase operacional do que foi usado durante a fase de construção. O prédio também foi construído sem utilização de combustível fóssil (sem emissões diretas de carbono) • Fórum Econômico Mundial/Ivar Kvaal
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O Sara Cultural Center, na Suécia, é um dos edifícios de madeira mais altos do mundo e foi construído com material retirada de florestas geridas de forma sustentável, localizadas a 200 km do local, com a madeira sendo processada a 50 km do canteiro de obra, o que reduziu a necessidade de transporte e a emissão de gases ao longo de toda a cadeia • Fórum Econômico Mundial/Patrick Degerman
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A ecovila urbana do Instituto Favela da Paz, em São Paulo, conta com tecnologias caseiras como biodigestores, que transformam resíduos orgânicos em gás de cozinha, que é entregue à comunidade. O prédio também tem aquecimento solar de água e fornece água quente para quem não pode pagar por um chuveiro elétrico • Fórum Econômico Mundial/Instituto Favela da Paz