Lula, Chávez, Kennedy, Stalin: relembre políticos que esconderam problemas de saúde

Presidente brasileiro, que passará por cirurgia na sexta-feira (29), disse que escondeu dores durante a campanha eleitoral

Lourival Sant'Anna, da CNN, São Paulo
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O presidente Lula admitiu, nesta terça-feira, ter escondido suas dores de quadril durante a campanha presidencial e ter adiado a cirurgia logo depois da eleição para não dar a impressão de não estar em condições de governar. Lula não está sozinho.

Omitir problemas de saúde para evitar seu impacto político negativo tem sido uma prática recorrente ao longo da história, das democracias mais escrutinadas até as ditaduras mais fechadas.

VÍDEO - Lula confirma que vai passar por cirurgia no fêmur

Chávez

Hugo Chávez, amigo próximo de Lula, foi diagnosticado com câncer em junho de 2011. A doença se tornou segredo de Estado.

Ele visitava Cuba com regularidade, para receber tratamento, e os rumores foram crescendo. Só em julho daquele ano, em Havana, o então presidente assumiu publicamente a doença, anunciando que um tumor "do tamanho de uma bola de beisebol” (seu esporte favorito) havia sido retirado de sua região pélvica.

Chávez trocou a imagem de incansável defensor dos pobres pela de um messias em contato com o sobrenatural. Em julho de 2012, três meses antes de sua reeleição, anunciou: “Estoy libre del cáncer”.

No poder desde 1999, Chávez se reelegeu, graças a sucessivas mudanças e reinterpretações da Constituição que lhe garantiram esse direito. Uma semana antes de sua eleição de 7 de outubro, desmentiu rumores e disse que sua saúde ia bem, ainda que “trabalhando a meia máquina”.

Em fevereiro do ano seguinte, foi submetido a nova cirurgia em Havana. Em dezembro, anunciou que, caso não se recuperasse, Nicolás Maduro, o vice-presidente, o substituiria até a realização de novas eleições. Na Venezuela o vice não é eleito, mas nomeado pelo presidente.

Na cerimônia, Maduro foi “ungido" por Chávez com uma espada que teria pertencido ao seu ídolo, Simón Bolívar, herói da independência. Depois da quarta cirurgia em Cuba, Chávez morreu em março de 2013.

O ex-presidente da Venezuela Hugo Chávez teve câncer / Getty Images
O ex-presidente da Venezuela Hugo Chávez teve câncer / Getty Images

Roosevelt

Um dos casos mais intrigantes foi o de Franklin Delano Roosevelt, que presidiu os Estados Unidos de 1933 até sua morte em 1945, e
portanto conduziu o país nos períodos turbulentos da Grande Depressão e da 2ª Guerra Mundial.

Em 1921, aos 39 anos, Roosevelt foi acometido de um ataque de poliomielite que o deixou paralisado da cintura para baixo.

Ele tinha acabado de ser derrotado como candidato a vice-presidente na chapa do democrata James Cox nas eleições de 1920, e não pretendia encerrar ali sua carreira política. Roosevelt sumiu de cena.

Ao longo de anos, ele aprendeu a caminhar curtas distâncias usando braçadeiras metálicas nas pernas, e com o apoio de pessoas que caminhavam ao seu lado. Ele nunca foi visto em público nas cadeiras de rodas que usava privadamente.

Roosevelt se elegeu três vezes. Sua morte súbita, por derrame cerebral, e a chegada à presidência de seu vice, Harry Truman, sem nenhuma experiência internacional, no fim da 2ª Guerra, provocou a aprovação da 22.ª Emenda da Constituição, que prevê o limite de dois mandatos para presidente.

Esse limite era observado desde o primeiro presidente americano, George Washington, mas não estava definido em lei.

O primeiro-ministro Winston Churchill, do Reino Unido, o presidente americano Franklin Roosevelt e o líder soviético Joseph Stalin, durante a Conferência de Yalta, em 1945 / Bettmann/Getty Images
O primeiro-ministro Winston Churchill, do Reino Unido, o presidente americano Franklin Roosevelt e o líder soviético Joseph Stalin, durante a Conferência de Yalta, em 1945 / Bettmann/Getty Images

Kennedy

Mesmo o jovem presidente John Fitzgerald Kennedy, assassinado em novembro de 1963 aos 46 anos, quando se preparava para lançar sua campanha à reeleição, sofria de várias doenças, que ocultava com o consumo intensivo de remédios.

Presidente John F. Kennedy em sua mesa na Casa Branca em seu primeiro dia de mandato como Presidente dos Estados Unidos / Getty Images
Presidente John F. Kennedy em sua mesa na Casa Branca em seu primeiro dia de mandato como Presidente dos Estados Unidos / Getty Images

Mitterrand

O super longevo presidente François Mitterrand, que ocupou o Palácio do Eliseu de 1981 a 1995, ocultou um câncer ao longo de uma década, de acordo com seu médico.

De acordo com Claude Gubler, o então presidente francês soube já no começo de seu primeiro mandato, em 1981, que seu câncer havia se espalhado para seus ossos, mas mentiu sobre sua doença ao longo de suas sucessivas eleições.

Mitterrand morreu aos 79 anos, oito meses depois do fim de seu segundo mandato. A duração dos mandatos presidenciais franceses foi reduzida por um referendo em 2000, de sete para cinco anos.

O ex-presidente da França François Mitterrand ocultou do público que estava com câncer/ Thierry Orban/GettyImages
O ex-presidente da França François Mitterrand ocultou do público que estava com câncer/ Thierry Orban/GettyImages

Stalin

O líder da Revolução Russa, Vladimir Lenin, foi o único governante soviético cujo estado de saúde não era tratado como segredo de Estado.

Seu sucessor, Josef Stalin, um tabagista contumaz, sofria de arteriosclerose. Teve um ataque cardíaco leve por volta do dia da rendição da Alemanha nazista perante as forças soviéticas, em 9 de maio de 1945, e depois um mais grave, em outubro.

Em 1951, o médico de Stalin lhe recomendou diminuir as atividades de governo. O ditador não recebeu bem o conselho. Três décadas antes, fingindo preocupar-se com a saúde de Lenin, ele lhe havia recomendado afastar-se das funções de governo, enquanto ocupava espaços para sucedê-lo e tentava acelerar sua morte.

Paranoico, Stalin mandou prender o médico sob acusação de espionar para o Reino Unido.

Dois anos mais tarde, com a saúde bastante debilitada, Stalin lançou uma nova campanha de perseguição aos judeus, focada nos médicos, entre outras categorias. Ele responsabilizava os médicos judeus pela morte de vários membros do Kremlin.

Stalin sofreu um ataque cardíaco fulminante na noite de 28 de fevereiro para 1º de março, um domingo, depois de uma noitada de comida, bebida e tabaco (ele fumava charuto e cachimbo) com Nikita Kruchev, Georgy Malenkov, Lavrentiy Beria e Nikolai Bulganin, integrantes do alto escalão com quem costumava jantar e
assistir filmes em sua dacha de Kuntsevo, perto de Moscou.

Os sensores no seu quarto não detectaram movimentos, e ele não telefonou para nenhum dos quatro camaradas, como de costume.

Mesmo assim, os funcionários o deixaram várias horas sozinho, sem cuidados, com receio de perturbá-lo.

O Kremlin não estava preparado para sua morte, considerada até então impensável, e a sucessão não estava definida. Nos quatro dias entre o ataque cardíaco e sua morte, dia 5 de março, Stalin praticamente não recebeu nenhum cuidado, enquanto os integrantes de seu entorno disputavam seu cargo, finalmente conquistado por Kruchev. A morte foi anunciada só um dia depois.

Stalin foi vítima do ambiente de terror que ele mesmo havia criado.

Stalin tinha problemas de saúde / Bettmann/Getty Images
Stalin tinha problemas de saúde / Bettmann/Getty Images

 

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