O que sabemos sobre empresa de Taiwan envolvida com pagers explosivos no Líbano
Gold Apollo, ligada a explosões no Líbano, nega fabricação de pagers usados no ataque, alegando que modelo foi licenciado por uma empresa europeia
As explosões simultâneas mortais provocadas por centenas de pagers usados por membros do Hezbollah no Líbano colocaram uma fabricante de eletrônicos taiwanesa pouco conhecida sob os holofotes globais, depois que seus produtos danificados foram identificados em imagens após o ataque.
Nos escritórios discretos da Gold Apollo, nos arredores da capital taiwanesa, o fundador da empresa, Hsu Ching-kuang, negou veementemente nesta quarta-feira (18) ter fabricado os pagers usados no ataque em massa.
Ele afirmou que os dispositivos foram fabricados por uma empresa europeia que havia licenciado sua marca.
“É claro que me sinto uma vítima”, disse Hsu a repórteres pouco antes da chegada de policiais para realizar uma investigação.
“Eu estou tocando meus negócios há 30 anos, por que de repente estou envolvido nisso?”.
Múltiplas fotos dos ataques de terça-feira (17) parecem mostrar pagers danificados com a marca Gold Apollo, aumentando o escrutínio sobre a empresa, especialmente após o New York Times ter relatado, citando fontes anônimas, que Israel escondeu explosivos dentro dos dispositivos e adicionou um interruptor em cada um, usado posteriormente para detoná-los remotamente.
A produção de pagers é altamente regulamentada em Taiwan devido às suas funções de transmissão, com as autoridades realizando inspeções regulares, disse a um oficial de segurança taiwanês à CNN na quarta-feira (18).
Os pagers da Gold Apollo atenderam a todos os padrões e nada de incomum foi encontrado, segundo o oficial, que não forneceu mais detalhes sobre a inspeção.
As autoridades também estão investigando a alegação da empresa de que a produção foi terceirizada para a Europa, acrescentou.
Desde sua fundação em 1995, a Gold Apollo fabrica uma ampla gama de dispositivos, desde pagers – dispositivos sem fio que podem enviar mensagens sem conexão com a internet, comumente usados por serviços de emergência e hospitais – até buzzers usados por restaurantes, de acordo com o site da empresa.
Ela trabalha com distribuidores ao redor do mundo para vender seus produtos, segundo uma reportagem anterior da mídia, já se promovendo como um dos maiores fornecedores de walkie-talkies e pagers nos EUA e na Europa, contando com agências de inteligência e serviços de emergência entre seus clientes.
Hsu disse na quarta-feira que os pagers identificados em reportagens no Líbano foram fabricados e vendidos por um parceiro europeu, que estabeleceu uma relação com sua empresa há cerca de três anos.
Em um comunicado emitido mais tarde, a Gold Apollo identificou o distribuidor, uma empresa com sede em Budapeste chamada BAC Consulting, e disse que licenciou sua marca para vendas em regiões designadas.
“O design e a fabricação dos produtos são de responsabilidade exclusiva da BAC”, dizia a nota.
A CNN tentou entrar em contato com a BAC através do site fornecido pela Gold Apollo aos repórteres.
Pagers explosivos
De acordo com imagens nas redes sociais do Líbano, pelo menos um pager mostrado na cena foi identificado como o modelo AR924 da Gold Apollo, descrito como um dispositivo compacto e à prova d’água que usa uma bateria de lítio recarregável, segundo informações do produto no site da empresa.
A Gold Apollo afirmou em seu comunicado que o pager AR924 foi produzido e vendido pela BAC, coberto por um acordo de licenciamento. A empresa se recusou a mostrar o contrato à CNN.
Hsu disse que, no início da relação com o parceiro europeu, a empresa apenas importava os pagers e produtos de comunicação da companhia taiwanesa. Mais tarde, a empresa disse à Gold Apollo que desejava fabricar seus próprios pagers e solicitou o direito de usar sua marca, acrescentou ele.
Hsu disse que a Gold Apollo encontrou pelo menos uma anomalia em suas negociações com a empresa europeia, citando uma transferência bancária que demorou muito para ser concluída.
“Podemos não ser uma grande empresa, mas somos responsáveis”, disse ele. “Isso é muito vergonhoso”.
De acordo com o Ministério de Assuntos Econômicos de Taiwan, a Gold Apollo exportou cerca de 260 mil pagers da ilha, principalmente para os Estados Unidos e Austrália, entre o início de 2022 e agosto de 2024.
Taipé não tem registro de pagers da Gold Apollo sendo enviados para o Líbano, disse o ministério em nota, acrescentando que continuará investigando.
Dispositivos de baixa tecnologia
O modelo AR924 não está disponível para venda em Taiwan, segundo o oficial de segurança taiwanês.
As empresas de telecomunicações de Taiwan encerraram os serviços de pager em 2011, devido a um declínio acentuado no uso com a crescente popularidade dos telefones celulares.
O AR924 também não está disponível nos Estados Unidos, disse um representante do distribuidor da empresa nos EUA à CNN.
A natureza de baixa tecnologia dos pagers pareceu ser um atrativo para o Hezbollah, um grupo militante apoiado pelo Irã, com base no Líbano.
No início do ano, o líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, pediu aos membros e suas famílias no sul do país, onde os combates com as forças israelenses ao longo da fronteira têm sido intensos, para se livrarem de seus celulares, acreditando que Israel poderia rastrear os movimentos da rede terrorista apoiada pelo Irã por meio desses dispositivos.
Hsu fundou a Gold Apollo com 100 milhões de dólares taiwaneses (US$ 3,1 milhões) em capital em 1995, segundo o registro corporativo de Taiwan.
Na época, os pagers – conhecidos localmente como “BB call” – estavam na moda na ilha.
Mas o fim dos serviços de pager pelas empresas de telefonia levou a empresa a mudar seu foco do mercado doméstico para o exterior, disse ele à revista Commonwealth de Taiwan em uma entrevista em 2011.
A Gold Apollo logo dominou os mercados de pagers em países ocidentais, segundo a revista.
A maior parte da demanda por seus pagers vinha de agências de inteligência, serviços de combate a incêndios e departamentos de defesa nos EUA e na Europa, incluindo o FBI, relatou a revista.