ONU apoia solução de dois Estados, desafiando a posição de Israel e dos EUA

Líderes mundiais reuniram-se na Assembleia Geral para reconhecer um Estado Palestino, em uma mudança diplomática histórica quase dois anos após o início da guerra em Gaza

Da Reuters
Conferência da ONU sobre a solução de dois Estados para Israel e Palestina em julho deste ano  • UN Photo/Loey Felipe
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Dezenas de líderes mundiais reuniram-se na Assembleia Geral da ONU nesta segunda-feira (22) para apoiar um Estado Palestino, em uma mudança diplomática histórica quase dois anos após o início da guerra em Gaza, que enfrenta forte resistência de Israel e de seu aliado próximo, os Estados Unidos.

A promessa do presidente da França, Emmanuel Macron, feita em julho, impulsionou a nova rodada de reconhecimentos, com Reino Unido, Canadá e Austrália afirmando depois que seguiriam o mesmo caminho — o que fizeram no domingo.

“Conclamamos aqueles que ainda não o fizeram a nos acompanhar”, disse o presidente palestino, Mahmoud Abbas, por videoconferência, já que não pôde participar do evento histórico após ter o visto negado pelos EUA.

“Pedimos seu apoio para que a Palestina se torne um membro pleno das Nações Unidas”, acrescentou, prometendo reformas e eleições dentro de um ano após um cessar-fogo.

Israel refuta solução de dois Estados

O governo mais à direita da história de Israel declarou que não haverá Estado Palestino, enquanto continua a combater o grupo militante Hamas em Gaza após o ataque de 7 de outubro de 2023, que matou cerca de 1.200 pessoas em Israel.

Israel tem sido amplamente condenado por sua atuação militar em Gaza, onde mais de 65 mil palestinos foram mortos, segundo autoridades de saúde locais.

Nas últimas semanas, Israel iniciou uma ofensiva terrestre há muito anunciada contra a Cidade de Gaza, com poucas perspectivas de cessar-fogo.

“Precisamos abrir caminho para a paz”, disse Macron na abertura da sessão na ONU, em Nova York.

“Devemos fazer tudo ao nosso alcance para preservar a própria possibilidade de uma solução de dois Estados, Israel e Palestina vivendo lado a lado em paz e segurança”, afirmou antes de anunciar a medida diplomática, recebendo longos aplausos.

 

Israel declarou que iniciativas desse tipo prejudicam as chances de um fim pacífico para o conflito.

O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, o primeiro-ministro canadense, Mark Carney, e o secretário-geral da ONU, António Guterres, também discursaram no evento.

Luxemburgo, Malta, Bélgica e Mônaco também se juntaram, nesta segunda-feira (22), aos mais de três quartos dos 193 membros da ONU que já reconhecem o Estado palestino.

Uma delegação que representa o Estado da Palestina tem status de observador na ONU — mas sem direito a voto. Por isso, ainda que a maioria dos países reconheçam a independência palestina, a adesão plena à ONU exige aprovação do Conselho de Segurança, onde os EUA têm poder de veto.

A solução de dois Estados foi a base do processo de paz apoiado pelos EUA inaugurado pelos Acordos de Oslo, em 1993. O processo sofreu fortes reveses de ambos os lados e praticamente morreu.

Não há negociações sobre uma solução de dois Estados desde 2014.

Estados Unidos e Israel boicotaram a reunião desta segunda-feira (22). O embaixador israelense na ONU, Danny Danon, disse que Israel discutirá como responder aos anúncios de reconhecimento depois que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu retornar ao país na próxima semana.

Netanyahu rejeitou inúmeros apelos para encerrar a ofensiva enquanto o Hamas não for destruído e afirmou que não reconhecerá um Estado palestino.

Os Estados Unidos têm dito a outros países que o reconhecimento palestino criará mais problemas.

Divisões europeias e resposta israelense

Embora a maioria dos países europeus já reconheça um Estado palestino, duas das maiores economias do continente, Alemanha e Itália, sinalizaram que dificilmente farão isso em breve.

A Alemanha — historicamente um forte apoiador de Israel por sua responsabilidade no Holocausto — tem se mostrado mais crítica à política israelense, mas insiste que o reconhecimento de um Estado Palestino deve ocorrer apenas ao final de um processo político que leve a uma solução de dois Estados.

Um porta-voz do governo alemão também disse que não deve haver novas anexações de territórios ocupados por Israel.

A Itália afirmou que reconhecer um Estado Palestino poderia ser “contraproducente”.

Autoridades israelenses disseram que Israel avalia anexar parte da Cisjordânia ocupada como possível resposta, além de adotar medidas bilaterais específicas contra Paris, embora os reconhecimentos sejam amplamente simbólicos.

A anexação poderia ter efeito contrário e afastar países como os Emirados Árabes Unidos, potência petrolífera e centro de comércio com grande influência diplomática no Oriente Médio.

Os Emirados Árabes Unidos, o mais destacado dos Estados árabes que normalizaram relações com Israel sob os Acordos de Abraão, mediados pelos EUA em 2020, disseram que uma anexação enfraqueceria o espírito do acordo.

Os Estados Unidos alertaram para possíveis consequências para quem adotar medidas contra Israel, inclusive a França, anfitriã da cúpula.

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