Organização identifica 196 povos indígenas isolados sob ameaça global

Levantamento da Survival International aponta que metade desses grupos pode ser exterminada nos próximos dez anos

Thomaz Coelho, da CNN Brasil, São Paulo
Estudo reúne ainda relatos de povos indígenas que sobreviveram ao contato forçado e afirma que os isolados desempenham papel importante na preservação de florestas  • Guilherme Gnipper Trevisan/FUNAI/Hutukara
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Pelo menos 196 povos e grupos indígenas isolados vivem em 10 países da América do Sul, Ásia e Pacífico, segundo o relatório Fronteiras de Resistência: a luta global dos povos indígenas isolados, divulgado nesta segunda-feira (27) pela organização Survival International.

O documento é o primeiro levantamento global sobre esses povos e apresenta o número mais preciso e atualizado já feito até hoje.

O lançamento ocorreu em Londres e contou com a participação das lideranças indígenas brasileiras Lucas Manchineri e Maipatxi Apurinã, de Herlin Odicio, do Peru, e do ator norte-americano Richard Gere.

De acordo com a pesquisa, mais de 96% dos povos isolados estão ameaçados por atividades extrativistas, como mineração, exploração madeireira, petróleo e gás. A exploração madeireira afeta 65% dos grupos, a mineração mais de 40% e o agronegócio mais de 20%.

O relatório alerta que metade dessas comunidades pode ser exterminada nos próximos dez anos se não houver medidas de proteção.

A Survival também destaca o aumento de povos isolados na Ásia e no Pacífico, regiões onde, segundo o documento, os governos não têm legislação adequada para garantir os direitos desses grupos à terra e ao isolamento.

Relatório identifica 196 povos indígenas isolados em 10 países • Survival International
Relatório identifica 196 povos indígenas isolados em 10 países • Survival International

Novas ameaças

Além das atividades econômicas, o relatório cita novas ameaças, como influenciadores digitais que buscam o “primeiro contato” para gerar conteúdo, missionários financiados por organizações religiosas e organizações criminosas envolvidas em tráfico de drogas e mineração ilegal.

O estudo reúne ainda relatos de povos indígenas que sobreviveram ao contato forçado e afirma que os isolados desempenham papel importante na preservação de florestas e na mitigação dos impactos das mudanças climáticas.

Relatório identifica 196 povos indígenas isolados em 10 países • Survival International
Relatório identifica 196 povos indígenas isolados em 10 países • Survival International

Lucas Manchineri, presidente da organização Manchineri da Terra Indígena Mamoadate (AC), afirmou: “Nossa forma de apoiar também é contar essas histórias, mostrar ao mundo que os isolados não desapareceram — eles estão ali, vivos, lutando em silêncio — e que nós, como parentes próximos, temos a obrigação espiritual e política de protegê-los.”

A diretora da Survival International, Caroline Pearce, disse que o respeito à escolha dos povos isolados é essencial: “Embora nossas descobertas apontem para uma situação grave, há uma solução: respeitar a escolha e a resistência dos povos isolados. Os governos devem reconhecer e fazer valer o direito à autodeterminação e os direitos à terra.”

Os povos indígenas e a proteção de seus territórios também estarão entre os temas debatidos na COP30, conferência da ONU sobre mudanças climáticas que será realizada em novembro, em Belém.

Imagens reforçam o alerta

Em julho de 2024, a Survival International também divulgou imagens inéditas que mostravam dezenas de indígenas isolados às margens de um rio na região de Madre de Dios, no sudeste do Peru, próximo à fronteira com o Brasil. O grupo retratado é o povo Mashco Piro, considerado o maior povo indígena isolado do mundo.

A organização estima que existam cerca de 750 indivíduos Mashco Piro vivendo na floresta. Segundo a Survival, eles habitam uma área que vem sendo pressionada por atividades de exploração madeireira, o que coloca em risco sua sobrevivência e aumenta as chances de encontros forçados com trabalhadores da região.

A presença dos Mashco Piro é registrada na região desde o século XIX, quando o território começou a ser invadido por trabalhadores envolvidos na extração de látex.