77% dos jovens transgênero sofrem transfobia no ambiente escolar, diz estudo
Levantamento do Grupo Dignidade ouviu familiares moradores de 62 cidades brasileiras
Um estudo realizado em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS) aponta que dentre 120 famílias, 77,5% de crianças e adolescentes transgêneros —entre 5 e 17 anos— foram vítimas de bullying no ambiente escolar.
Para o levantamento foram ouvidos pais, mães e responsáveis de alunos transgêneros de 62 cidades brasileiras. Com base nos relatos, os coordenadores da pesquisa separaram os autores de violência entre adultos e crianças. No grupo dos adultos, 65% dos acusados de bullying eram profissionais das instituições de ensino. Deste número, 56% eram professores.
A coordenadora da pesquisa, Thamirys Nunes, explica que um dos objetivos do projeto é fornecer dados que ajudem as instituições de ensino a adotarem políticas contra o bullying.
Segundo ela, atualmente, a maior parte das escolas trabalha de forma reativa, quando ocorrem casos de violência. “A comunidade escolar precisa entender que não é facultativo acolher o adolescente trans. É uma obrigação de todos que estão ali. É preciso entender que aquele indivíduo tem direitos”, aponta Thamirys.
Segundo dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), pelo menos 80 pessoas trans foram assassinadas no país no primeiro semestre de 2021. No mesmo período, a organização identificou uma vítima de 13 anos de idade —a mais nova desde que começaram os monitoramentos da Antra, em 2017.
No caso da pesquisa organizada pelo Grupo Dignidade, além de violência física, foram consideradas também agressões emocionais, verbais e cyberbullying. Tais ações podem culminar em consequências psicológicas, que vão desde depressão à ideação suicida, e práticas, resultando principalmente no abandono dos estudos.
A luta das famílias
Autora do livro “Minha criança trans?”, Thamirys Nunes é mãe de uma menina transgênero de seis anos de idade. “É um processo de muita dor, de muita ressignificação do que é a maternidade”, relata ela sobre o processo de aceitação.
“A gente reconstrói a nossa forma de amar. Hoje, eu exerço a maternidade de estar ao lado dela e, junto com a minha filha, escutando e observando, descobrir o que é melhor para ela”, reflete Thamirys.
Mesmo as escolas sendo, em tese, um ambiente de acolhimento e segurança, a pesquisa sugere o contrário. Dos entrevistados, 98% consideraram as instituições de ensino um ambiente hostil às crianças e adolescentes trans.
Thamirys resume a sensação de insegurança: “quando a gente passa pela transição de um filho, nós somos abandonados pela família, pelas escolas e pelo Poder Público. Então quando uma família me procura, o que eu digo é: você não está sozinho. O seu filho não é uma aberração. Ninguém precisa viver isso sozinho”.