Estudos mostram relação entre tráfico de drogas e pesca ilegal no Javari
Lideranças indígenas afirmam que o crime se agravou na região onde Dom e Bruno desapareceram e defendem que a Polícia Federal assuma integralmente as investigações
A presença de pescadores e caçadores que atuam ilegalmente e em conjunto com traficantes de drogas no Vale do Javari, a terra indígena onde o indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Philips desapareceram, no Amazonas, é tema de estudos e denúncias às autoridades desde pelo menos 2013, de acordo com documentos obtidos pela CNN.
Lideranças indígenas ouvidas pela reportagem afirmam que o crime se agravou na região onde Teixeira e Phillips desapareceram, e que por isso defendem que a Polícia Federal assuma integralmente as investigações.
“Este é um crime em uma área próxima de fronteira. Tivemos uma morte de um agente da Funai em 2019 que até hoje não foi esclarecida. Por isso, é preciso federalizar o caso”, afirmou Beto Marubo, uma das lideranças da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja).
A CNN procurou a PF e aguarda retorno.
Uma pesquisa realizada em 2013 na tríplice fronteira de Brasil, Peru e Colômbia, onde fica o Vale do Javari, revelou que pelo menos 278 toneladas de caça ilegal são comercializados por ano nas cidades brasileiras de Benjamin Constant e Tabatinga, na colombiana Letícia e na peruana Caballococha.
O estudo revelou que 78% de toda a carne animal que circula na região é proveniente de bichos brasileiros mortos de maneira ilegal, uma vez que a caça e a pesca são apenas permitidos para subsistência dos indígenas.
Um estudo de 2019 feito pelo geógrafo Conrado Octavio e pelo ecólogo Hilton Nacimento, do Centro Trabalho Indigenista do Instituto Sociambiental (ISA) indicou que a pesca ilegal ocorre em todo o Vale do Javari e constitui “a principal ameaça atual aos isolados”.
Já a presença de traficantes de drogas é reportada, de acordo com o histórico montado pelos autores, desde a década de 1980 na região de fronteira.
“O narcotráfico é possivelmente, a principal força econômica da região, articulando-se a diversas outras atividades, como a exploração madeireira, o garimpo, a pesca [sobretudo voltada à exportação] e uma variedade de comércios e serviços.”
Em agosto de 2020, a Associação dos Kanamari Vale do Javari (Akajava), outra representação indígena que atua na região onde o indigenista e o jornalista sumiram, informou às autoridades da necessidade de proteção contra pescadores que se aproveitaram da pandemia de covid-19 e uma suposta redução do patrulhamento na área para aumentar as bases de exploração na região.
Em dois ofícios, a Akavaja mencionou a existência de pescadores que salgavam a água dos rios para retirar tracajás – espécie parecida com uma tartaruga, comum na Amazônia. Nos documentos, os indígenas pediram proteção e relataram que muitos pescadores ilegais usaram violência para afastar as tentativas de proteger os animais.
MPF diz que abriu investigação
Nesta segunda-feira (13) a CNN mostrou seis ofícios enviados neste ano ao Ministério Público Federal do Amazonas, Polícia Federal, Força Nacional de Segurança Pública e à Funai (Fundação Nacional do Índio) pela Univaja com informações de ataques a tiros contra indígenas, saída de pesca irregular e constantes invasões para extração irregular de animais.
Em nota, o Ministério Público Federal informou que foi instaurado procedimento de apuração do caso desde que a instituição recebeu as representações da Univaja.
Fotos – Buscas por jornalista e indigenista desaparecidos na Amazônia
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Testemunha levada pela PF até local de suposto desaparecimento de jornalista e indigenista no Amazonas Brazil. As mortes de Bruno Pereira e Dom Phillips foram confirmadas nos dias 17 e 18 de junho. REUTERS/Bruno Kelly • REUTERS/Bruno Kelly
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Policiais acompanham testemunha (de vermelho) em busca por jornalista e indigenista no Amazonas • Reprodução/CNN Brasil (15.ju.2022)
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Desaparecimento Dom Phillips e Bruno Pereira, equipe faz perícia • Foto: Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real
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Polícia Federal leva testemunha até suposto local onde desapareceram jornalista inglês e indigenista REUTERS/Bruno Kelly • Bruno Kelly/REUTERS
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Buscas em Atalaia do Norte (AM) por jornalista inglês e indigenista desaparecidos • Nailson Tenazor/Jambo Verde
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Buscas ocorrem no Vale do Javari, em Atalaia do Norte, e seguem de forma ininterrupta por meio terrestre e fluvial • Comando Militar Amazônia
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Perícia na lancha de suspeito preso por suspeita de envolvimento no desaparecimento de dupla no Amazonas • Polícia Federal
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Combatentes da 16º Brigada de Infantaria de Selva continuam buscas por jornalista britânico Dom Phillips e indigenista Bruno Araújo Pereira • Comando Militar Amazônia
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De acordo com as entidades, o indigenista é alvo de ameaças de madeireiros e garimpeiros que tentam invadir terras indígenas na região • Comando Militar Amazônia
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Comando Militar Amazônia faz buscas por desaparecidos por meios terrestres e fluviais • Comando Militar Amazônia
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Ferreira e Phillips desapareceram no trajeto entre a comunidade Ribeirinha São Rafael até a cidade de Atalaia do Norte • Comando Militar Amazônia
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Secretaria de Segurança Pública do Amazonas enviou reforço policial para o município de Atalaia do Norte • Secretaria de Segurança Pública do Estado do Amazonas
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Equipe faz buscas por dupla desaparecida no Amazonas • Polícia Federal
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Força-tarefa coordenada pela Secretaria de Segurança Pública do estado conta com 20 agentes para busca por desaparecidos • Secretaria de Segurança Pública do Estado do Amazonas
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Área onde equipes fazem buscas por dupla desaparecida no Amazonas • Polícia Federal
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Comitê prossegue com as buscas fluviais e o reconhecimento aéreo na região do Rio Itaquaí, último local em que os dois foram vistos. • Reprodução/Comando Militar Amazônia
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Amarildo da Costa Oliveira, conhecido como Pelado, foi preso temporariamente por suspeita de envolvimento no desaparecimento da dupla • Reprodução/Comando Militar Amazônia
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Comitê busca por jornalista britânico Dom Phillips e indigenista Bruno Araújo Pereira, desparecidos no Amazonas • Reprodução/Comando Militar Amazônia
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Neste domingo (12) completou uma semana do desaparecimento de indigenista e do jornalista • Reprodução/Comando Militar Amazônia
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A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) emitiu uma resolução com solicitações ao governo brasileiro a respeito do paradeiro da dupla • Reprodução/Comando Militar Amazônia
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Equipes da Operação Javari encontraram no sábado (11) uma embarcação na região de buscas • Reprodução/Comando Militar Amazônia
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Vestígios, como a beira de um barranco onde uma embarcação poderia ter sido arrastada, foram observados pela equipe de busca • Reprodução/Comando Militar Amazônia
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Mochila encontrada em área de buscas por desaparecidos; Polícia Federal confirmou que o objeto e outros materiais pertencem a Bruno Araújo e Dom Phillips • União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja)
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Área de aldeia no Vale do Javari, onde desapareceram o indigenista Bruno Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips • Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real
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Equipes de peritos analisam embarcação de um dos suspeitos pelo desaparecimento do indigenista e do jornalista inglês no Amazonas • Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real
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Área de buscas em Atalaia do Norte • Foto: Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real