MPF pede informações sobre uso de recursos federais na megaoperação do RJ

Procurador argumenta que ação resultou em graves denúncias de violação dos direitos humanos; órgão questiona ausência de alguns registros de câmeras corporais

Khauan Wood, da CNN Brasil*, em São Paulo
Megaoperação envolvendo cerca de 2.500 policiais civis e militares foi deflagrada nos complexos da Penha e do Alemão, na Zona Norte do Rio de Janeiro  • CNN
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O MPF (Ministério Público Federal) requisitou ao estado do Rio de Janeiro e à União informações sobre a utilização de verbas federais durante a megaoperação policial realizada nas comunidades do Complexo do Alemão e do Complexo da Penha, no último dia 28 de outubro, no Rio de Janeiro.

As requisição apura a eventual utilização dos recursos do FNSP (Fundo Nacional de Segurança Pública).

A solicitação foi feita pelo procurador Eduardo Benones e foi emitida no procedimento do MPF que fiscaliza os repasses e a aplicação dos recursos do fundo pelo estado do Rio de Janeiro.

De acordo com o órgão, o objetivo do pedido é esclarecer se houve uso de recursos federais durante a operação, que já é considerada a mais letal da história do Brasil.

Ainda segundo a solicitação, a operação resultou em graves denúncias de violação de direitos humanos, com elevado número de mortes de moradores das comunidades e de quatro policiais.

O procedimento de fiscalização dos repasses do FNSP foi instaurado pelo MPF em abril deste ano, por provocação do Grupo de Trabalho de Acompanhamento do (CNMP) Conselho Nacional do Ministério), através do conselheiro Antônio Edílio Magalhães Teixeira.

A medida atende a determinações do STF (Supremo Tribunal Federal) na ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 635/RJ, conhecida como “ADPF das Favelas”.

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Na decisão, a Corte atribuiu ao MPF, entre outras funções, a tarefa de acompanhar a destinação das verbas federais voltadas à segurança pública no estado do Rio de Janeiro, em especial aquelas destinadas a políticas de redução da letalidade policial.

No despacho, o procurador destaca que, antes de avançar nas medidas gerais de fiscalização sobre o uso dos recursos do fundo, é necessário esclarecer se a Operação Contenção contou com financiamento do FNSP, mesmo que parcial.

Solicitações do MPF:

  • Informações à Senasp/MJSP (Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça e Segurança Pública) sobre os repasses do fundo;
  • Esclarecimentos sobre o acompanhamento e a fiscalização da aplicação das verbas federais pelo estado do Rio de Janeiro ao comitê gestor do FNSP;
  • Relatórios de plenejamento e execução da operação à Sesp-RJ (Secretaria de Estado de Segurança Pública do Rio de Janeiro).

Além disso, o procurador ressalta que segundo informações públicas, a megaoperação resultou em um número elevado de mortes e em relatos de uso excessivo da força, mutilações e execuções sumárias.

O despacho enfatiza que, caso confirmadas as informações, o episódio poderá configurar grave violação de direitos humanos, inclusive com risco de responsabilização internacional do Estado brasileiro.

Ele também aponta que parte das imagens capturadas pelas câmeras corporais utilizadas pelos policiais teria sido perdida, por conta de um suposto descarregamento das baterias durante a operação.

Para o MPF, a ausência desses registros reforça a necessidade de apuração, já que compromete a transparência e o controle da atuação policial, além de justificar o exercício do controle externo da atividade policial.

No documento, o procurador Benones relembra que a decisão do STF homologou parcialmente o plano de ação do estado do Rio de Janeiro para redução da letalidade policial e determinou a implementação de medidas estruturais de transparência, uso proporcional da força e preservação de provas em operações.

O texto destaca ainda que o FNSP, tem o objetivo de financiar projetos e ações de segurança pública voltados à prevenção da violência, à inteligência policial e à redução da criminalidade e da letalidade.

A utilização desses recursos deve seguir regras específicas, proibindo, por exemplo, despesas com pessoal ou atividades administrativas e exigindo planos de aplicação alinhados à Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social.

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No último dia 28 de outubro, a Operação Contenção, realizada pelas Polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro, "foi o maior baque da história contra o CV (Comando Vermelho)", de acordo com o governo fluminense. Durante a ação, mais de 120 pessoas morreram.

Ao todo, o efetivo mobilizado chegou a cerca de 2.500 agentes, com o objetivo principal de frear o avanço territorial da facção Comando Vermelho e cumprir uma centena de mandados de prisão contra criminosos nos Complexos do Alemão e da Penha.

Dentre os alvos, 30 são de outros estados, com destaque para membros da facção no Pará, que estariam escondidos nessas regiões.

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Além disso, 113 pessoas foram presas, 118 armas apreendidas, 14 artefatos explosivos e uma quantidade ainda em contagem de drogas.

*Sob supervisão de Carolina Figueiredo