STF retoma julgamento sobre descriminalização das drogas para uso pessoal

Corte tem quatro votos para não considerar crime posse de maconha para consumo próprio

Lucas Mendes, da CNN, em Brasília
Ministros durante a sessão plenária no STF
Ministros do STF durante a sessão plenária  • Carlos Moura/SCO/STF
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O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou na tarde desta quinta-feira (24) o julgamento sobre a descriminalização das drogas para consumo pessoal.

O ministro Gilmar Mendes, relator do caso, havia pedido na última sessão a tratar do caso, em 2 de agosto, o adiamento da continuidade da análise. Nesta quinta, ele apresentou uma proposta convergente com os votos já apresentados.

Até o momento, a Corte tem placar de 4 a 0 para deixar de se considerar crime o porte de maconha para consumo próprio.

Votaram nesse sentido Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Edson Fachin e Roberto Barroso. Os três últimos votaram em 2015. O caso ficou parado até 2 de agosto deste ano, quando votou Moraes.

Em 2015, Gilmar Mendes havia votado para descriminalizar o porte para consumo pessoa de forma ampla, sem especificar drogas. Nesta quinta (24), ele reajustou seu voto para defender a descriminalização do porte para consumo apenas da maconha. O próximo a votar é o ministro Cristiano Zanin.

"Estou votando na linha do que já tinha entendido Fachin, Barroso e Moraes. E vou além, dizendo que a retomada desse julgamento inaugura oportunidade de articulação direta entre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário para aprimoramento do marco regulatório do setor. Afinal, o enfrentamento eficaz do uso indevido de drogas pressupõe cooperação transversal entre instituições do Estado", disse Mendes.

Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF) / Fellipe Sampaio/SCO/STF
Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF) / Fellipe Sampaio/SCO/STF

"É valida a posição legislativa pela proibição do porte de drogas ainda que para consumo pessoal. Só estamos falando que não se deve tratar como crime", acrescentou o ministro em outro momento. O presidente do Senado e do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD), chegou a classificar como "equívoco grave" a possibilidade do STF descriminalizar o porte de maconha.

O julgamento na Corte gira em torno da constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, de 2006. A norma estabelece que é crime adquirir, guardar ou transportar drogas para consumo pessoal.

O caso tem repercussão geral reconhecida, ou seja, o entendimento firmado pelo STF neste julgamento deverá balizar casos similares em todo o país.

O que Moraes disse em seu voto?

Alexandre de Moraes propôs um critério para diferenciar usuários de maconha de traficantes da droga: a posse de uma quantidade de 25 a 60 gramas ou de seis plantas fêmeas.

Conforme o voto do magistrado, essa faixa é relativa. Ou seja, policiais podem fazer a prisão em flagrante de pessoas que estejam portando uma quantidade menor do que a prevista, “desde que, de maneira fundamentada, comprovem a presença de outros critérios caracterizadores do tráfico de entorpecentes”.

Para Moraes, é preciso garantir a aplicação “isonômica” da Lei de Drogas, por entender que a norma não atinge a todos de forma igualitária, mesmo para situações idênticas. Segundo o magistrado, as consequências dependem da classe social, idade ou grau de instrução de pessoas que são presas em flagrante.

O ministro entendeu que a fixação de quantidade de droga apreendida não deve ser o único critério para diferenciar usuário de traficante.

“O critério deve, caso a caso, ser analisado com base em outros critérios, complementares. Por exemplo, a forma como está condicionado o entorpecente, a diversidade de entorpecentes, a apreensão de outros instrumentos, como balança, cadernos de anotação, locais e a circunstâncias da apreensão”, declarou.

O ministro disse não haver uma “cartilha” com medidas consideradas corretas para qualquer país tratar a questão do uso de drogas ilícitas. “Por isso me parece necessário uma análise da realidade brasileira, com dados concretos e reais”, afirmou.

Conforme o magistrado, a legislação estabeleceu critérios muito genéricos para definir se a droga apreendida pela polícia era destinada a consumo próprio, aumentando a discricionariedade das autoridades para enquadrar a situação como tráfico.

“Na aplicação da lei, não houve algo consciente, mas a própria cultura de persecução penal acabou transformando uma lei que veio para melhorar a situação do usuário, piorando a situação do usuário”, disse. “Porque apesar de despenalizar a conduta do usuário, a lei previu algo muito genérico. Isso aumentou a grande discricionariedade da autoridade policial no momento do flagrante, do Ministério Público no momento do oferecimento da denúncia, e do Judiciário, ao sentenciar”.