Como o metanol afeta o cérebro e a visão?
Bebidas alcoólicas adulteradas resultaram em três mortes, de acordo com a Secretária de Saúde do estado
A Secretaria de Saúde do estado de São Paulo confirmou três mortes por ingestão de bebida adulterada com metanol. Mais um morte suspeita de intoxicação foi confirmada em São Bernardo do Campo, nesta segunda-feira (29).
A substância líquida, inflamável e incolor é comumente utilizada como solvente, na fabricação de combustíveis, plásticos, tintas e medicamentos, por exemplo. Para esclarecer sobre as mortes confirmadas, a CNN conversou com especialistas, que explicam como o metanol pode afetar o cérebro e a visão.
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Como o metanol age no organismo?
Feres Chaddad, professor e chefe da Disciplina de Neurocirurgia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e chefe da Neurocirurgia da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, detalha o processo que começa no trato gastrointestinal.
"O metanol em si não é altamente tóxico, mas, após a ingestão, é rapidamente absorvido pelo trato gastrointestinal e metabolizado no fígado. Nesse processo, ele é convertido primeiro em formaldeído e, posteriormente, em ácido fórmico, que é o principal responsável pela toxicidade. Como o ácido fórmico é metabolizado lentamente, tende a se acumular no organismo, especialmente quando o metanol é ingerido em altas doses ou associado ao álcool etílico", inicia.
Na sequência, o metanol atinge o cérebro. "Por ser uma molécula pequena, o ácido fórmico atinge o cérebro", acrescenta. O neurologista explica que essa substância age nas mitocôndrias, estruturas dentro das células que produzem sua energia. Desse modo, mesmo havendo oxigênio disponível, há uma falência energética celular. "Além disso, o acúmulo de ácido no sangue provoca acidose metabólica grave, que acelera a disfunção enzimática e a morte celular. A combinação da falência energética com a acidose resulta em necrose celular", acrescenta.
Segundo Chaddad, "algumas regiões do sistema nervoso são particularmente vulneráveis. O nervo óptico e a retina sofrem lesões nas células ganglionares e na mielina, explicando os distúrbios visuais que podem evoluir para cegueira irreversível."
Orlando Maia, especialista em tratamentos neurocirúrgicos endovasculares, ressalta que o fato do cérebro demandar alta energia, o metanol acaba sendo depositado na região, afetando diretamente o sistema nervoso central.
Já a visão, é afetada mais especificamente na retina e no nervo óptico. "No metabolismo do metanol no fígado, forma-se o ácido fórmico, que apresenta predileção pela retina e pelo nervo óptico, causando lesões diretas nessas estruturas", explica Orlando Maia.
"Na esfera oftálmica, o ácido fórmico provoca edema de papila [retenção de líquidos no disco óptico] e neurite óptica [inflamação do nervo óptico], resultando em alterações visuais".
O especialista ainda esclarece o motivo das lesões cerebrais causadas por metanol serem irreversíveis. "As lesões são irreversíveis porque o dano final corresponde a uma necrose neuronal, incluindo a do nervo óptico. A necrose representa morte celular definitiva e degeneração total do neurônio, o que explica por que o metanol é extremamente tóxico e não permite recuperação", finaliza Maia.
Quais os sintomas por intoxicação por metanol?
De acordo com a Associação Brasileira de Neuro-oftalmologia (ABNO), sociedade filiada ao Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), os sintomas iniciais da intoxicação aparecem entre 12 a 24 horas após a ingestão da bebida adulterada.
Os sintomas pela intoxicação de metanol incluem:
- Dor de cabeça;
- Náuseas e vômitos;
- Dor abdominal;
- Confusão mental;
- Visão turva repentina ou cegueira, em ambos os olhos.

