Etanol X fomepizol: veja diferenças entre os antídotos contra o metanol

Bebidas alcoólicas adulteradas têm sido vendidas no Brasil, aumentando preocupação com sinais da ingestão do composto

Caroline Ferreira, da CNN
Ministério da Saúde já registrou dezenas de casos suspeitos de intoxicações por metanol no Brasil
Ministério da Saúde já registrou dezenas de casos suspeitos de intoxicações por metanol no Brasil  • CNN
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O número de casos relacionados à ingestão de bebidas adulteradas com metanol segue em crescente no Brasil. De acordo com o Ministério da Saúde, até quinta-feira (2), eram 59 casos em todo o país, sendo 11 confirmados em laboratório e outros 48 em investigação.

Entre as mortes, uma foi confirmada em São Paulo, e outras sete estão em análise: duas em Pernambuco, nos municípios de João Alfredo e Lajedo; três na capital paulista; e duas em São Bernardo do Campo. Diante da situação, o órgão publicou, na quarta-feira (2), uma nova nota técnica explicando à população sobre como sistema de saúde deve lidar com a situação. Hoje, existem dois antídotos usados na cura: etanol e fomepizol.

No Brasil, apenas o etanol farmacêutico está disponível para uso. Já fomepizol não possui registro sanitário, tornando necessária a busca por fornecedores em outros países para atender à demanda do Sistema Único de Saúde (SUS). Assim, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) divulgou um edital de chamamento internacional para a aquisição de fomepizol, em ampolas de 1,5 ml e concentração de 1.000mg/ml.

Etanol e fomepizol, qual a diferença?

À CNN, Werlley Januzzi, diretor do Pronto-Socorro do Hospital do Servidor Público Estadual (HSPE) e médico cardiointensivista, explica que o etanol é o álcool comum nas bebidas alcóolicas em geral, atuando como um antídoto funcional em casos de envenenamento e intoxicação por metanol e etilenoglicol. "Ele competiria pela mesma enzima hepática do fígado, que se chama álcool desidrogenase. Ao ocupar essa enzima, ele atrasa a formação dos metabólicos tóxicos".

"No caso específico, nosso maior temor seria o ácido fórmico [formado pela metabolização do metanol], que traz sintomas e efeitos colaterais gravíssimos, podendo levar até mesmo a cegueira. Em linguagem mais simples, ele [o etanol] entra na frente da fila e 'compra um tempo' para que possamos tratar o paciente de forma adequada", diz.

Já o fomepizol, é um antídoto porque que bloqueia de forma direta e seletiva a enzima álcool desidrogenasse, impedindo então que o metanol se converta nesse ácido fórmico, que é altamente tóxico. "O fomepizol tem um efeito previsível, com uma dose padronizada e pouquíssimos efeitos colaterais quando comparado ao tratamento com o etanol", explica.

"Então, podemos dizer que o fomepizol é um antídoto que serviria como se fosse um interruptor, que desligaria essa via de produção do ácido fórmico dentro do nosso corpo após a metabolização do metanol", adiciona.

A atuação do etanol e fomepizol

Também à CNN, Igor Marinho, infectologista da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, ambos os antídotos podem ser usados nos mesmos cenários clínicos — intoxicações por metanol ou etilenoglicol. A diferença está no contexto. "O fomepizol é preferido como primeira escolha em países em que está disponível. Já o etanol pode ser usado quando o fomepizol não está disponível, mas requer cuidados, monitoramento dos níveis no sangue e pode trazer mais complicações clínicas", detalha.

"Portanto, o estado do paciente, o grau de intoxicação e os recursos disponíveis no local onde está o paciente influenciam a escolha", acrescenta.

Igor diz também que, por fomepizol não ser comercializado no Brasil, foi necessário a Anvisa abrir o chamamento para ampliar o acesso, já que, de maneira geral, ele é considerado mais seguro e eficaz do que o etanol, uma vez que apresenta menor risco de efeitos colaterais e não requer controle laboratorial tão rigoroso. "Mas, em termos de eficácia na proteção contra os efeitos tóxicos, ambos funcionam — a diferença é que o fomepizol é mais prático e seguro, sendo esse um dos principais motivos do chamamento".

Efeitos colaterais

Para Werlley, quando se fala em efeitos colaterais, o uso do etanol traz efeitos de comum conhecimento da população. "Sedação, alteração no nível de consciência, hipoglicemia -- especialmente em crianças e pacientes desnutridos -- e, infelizmente, vômitos. Além disso, a dificuldade do etanol é manter isso dentro de uma faixa terapêutica".

Já o fomepizol, segundo Igor, costuma ser bem tolerado, mas pode causar dor de cabeça, náuseas e tontura. "Os efeitos adversos são geralmente leves e transitórios, sendo uma medicação mais segura se comparada ao etanol com relação a eventos adversos", explica.

"A gente pode dizer que os dois tratamentos são tratamentos para um caso agudo de intoxicação, então é muito difícil também entender o que seria o efeito colateral do tratamento e, a princípio, o efeito da intoxicação", conclui Januzzi.