SIMP-0136: auroras polares em um planeta sem estrela intrigam os cientistas

No primeiro boletim meteorológico de um exoplaneta, o Telescópio James Webb divulgou indícios de auroras em um objeto celeste sem estrela próxima

Jorge Marin, colaboração para a CNN Brasil
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As auroras polares que conhecemos são impulsionadas pelo vento solar.  • Evert Nasedkin/Divulgação
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Considerado um modelo para estudar exoplanetas gigantes jovens, o objeto subestelar SIMP-0136 surpreendeu uma equipe de astrônomos do Trinity College Dublin, da Irlanda, que o observava com o Telescópio Espacial James Webb (JWST). É que, mesmo sem orbitar uma estrela, o objeto errante exibiu auroras polares.

O fenômeno, normalmente associado a espetáculos luminosos em mundos do Sistema Solar, como a Terra ou Júpiter, ocorre quando partículas carregadas (elétrons e íons) são aceleradas pelo vento solar e interagem com gases presentes na alta atmosfera e guiados pelo campo magnético dos planetas.

Publicado na revista Astronomy & Astrophysics, o estudo pode ser considerado o primeiro “boletim meteorológico” de um objeto externo ao Sistema Solar. Mesmo sem estar ligado a uma estrela, o SIMP-0136 revelou variações de temperatura, nuvens e auroras, sinais de uma atmosfera dinâmica e complexa.

Quando foi descoberto a apenas 21 anos-luz da Terra, o objeto SIMP-0136 foi classificado como uma anã marrom. Mas, sem sinais de que esteja fundindo deutério em seu núcleo, a suposta estrela foi “rebaixada”, por alguns cientistas, a planeta errante, um corpo solitário que vaga livremente pelo espaço.

Embora isso torne planetas que não orbitam uma estrela praticamente invisíveis, é possível que existam muitos planetas errantes próximos. Por isso, o fato de o SIMP-0136 ter se tornado visível no infravermelho — devido à sua atmosfera quente — o fez de destacar como alvo ideal para estudos de variabilidade atmosférica (modulações de brilho com rotação).

Por que SIMP-0136 se mantém tão quente?

SIMP-0136 tem 15 vezes a massa de Júpiter e um dia de 2,4 horas • NASA, ESA, CSA, Joseph Olmsted (STScI)/Divulgação
SIMP-0136 tem 15 vezes a massa de Júpiter e um dia de 2,4 horas • NASA, ESA, CSA, Joseph Olmsted (STScI)/Divulgação

Embora já fosse conhecido dos cientistas, antes mesmo do lançamento do JWST, por sua variabilidade infravermelha e emissões de rádio, não se sabia ao certo o motivo dessas flutuações observadas — se devidas a variações na cobertura de nuvens, mudanças térmicas, efeitos magnéticos (auroras), ou uma combinação de tudo isso.

Dessa forma, a precisão dos instrumentos do JWST foi fundamental: ao mapear pequenas variações no brilho de SIMP-0136 enquanto ele girava em torno de seu eixo, em um curto dia de 2,4 horas, os autores detectaram sinais de uma aurora aquecendo a atmosfera superior do objeto, semelhante ao que ocorre em Júpiter.

Esse aquecimento pode explicar a curiosa inversão térmica, ou seja, a atmosfera fica mais fria perto da superfície e mais quente conforme a altitude aumenta, algo totalmente oposto ao padrão terrestre. É possível que o fenômeno esteja ligado à absorção de radiação por nuvens ou gases.

Para o primeiro autor, Evert Nasedkin, pós-doutorando na Escola de Física do Trinity, "Estas são algumas das medições mais precisas da atmosfera de qualquer objeto extrassolar até hoje, e a primeira vez que as mudanças nas propriedades atmosféricas foram medidas diretamente", afirma em um comunicado.

Embora não tenha estrela próxima, SIMP-0136 mantém temperaturas elevadas devido à sua grande massa — cerca de 15 vezes a de Júpiter — e ao calor gerado durante sua formação. Com apenas 200 milhões de anos, o objeto ainda retém boa parte dessa energia.

Novas descobertas e referências para futuros telescópios

Outra surpresa para a equipe foi a constância das nuvens em SIMP-0136. Ao contrário do que vemos na Terra, onde mudanças na distribuição das nuvens afetam o clima, o objeto revelou uma cobertura uniforme, indicando que sua atmosfera segue uma lógica distinta, mesmo com fenômenos dinâmicos acontecendo.

As nuvens do enigmático corpo celeste são formadas por grãos de silicato, parecidos com a areia das praias terrestres, e não pelas tradicionais gotículas de água ou cristais de gelo das nossas nuvens. Essa diferença química reflete a alta temperatura e a forma inesperada como atmosferas jovens e massivas podem se comportar.

"Diferentes comprimentos de onda de luz estão relacionados a diferentes características atmosféricas. Semelhante à observação das mudanças na cor da superfície da Terra, as mudanças na cor do SIMP-0136 são impulsionadas por mudanças nas propriedades atmosféricas ", explica Nasedkin.

Como tem um longo histórico de dados, o SIMP-0136 pode servir como um laboratório de referência para o desenvolvimento de modelos 3D mais realistas da sua atmosfera, permitindo entender como interagem os diferentes processos dinâmicos (ventos, circulação), químicos (reações) e magnéticos (auroras, campos magnéticos).

Além disso, por ser considerado um análogo ideal para a população de exoplanetas, entender a atmosfera dinâmica de SIMP-0136 ajuda a calibrar expectativas para observações de exoplanetas semelhantes, principalmente por futuras missões, como o Extremely Large Telescope e o Habitable Worlds Observatory.