Curitiba tem passeio que mostra lado sombrio da cidade
Tour "Curitiba Sombria" percorre endereços que oferecem uma perspectiva diferente da história da capital, envolvendo mistérios e fatos notáveis

Curitiba tem o Jardim Botânico, o Museu Oscar Niemeyer e o Parque Barigui entre seus atrativos mais famosos. Mas também possui endereços familiares aos moradores, como a Praça João Cândido, a Rua XV de Novembro e o Cemitério Municipal. O que estes últimos têm em comum? Fazem parte do tour "Curitiba Sombria", que conta a história da capital paranaense sob uma perspectiva diferente -- e mais macabra.
"Brinco que Curitiba é a Transilvânia brasileira. Quando começo o passeio, falo sobre essa nossa vocação sombria", conta Luciana Penante, jornalista e mediadora do tour.
Ela criou o passeio no Halloween do ano passado e, desde então, tem percorrido o centro histórico de Curitiba todos os sábados, apresentando locais que, muitas vezes, passam despercebidos pelo público. O que a maioria não sabe é que tais endereços foram palcos de histórias obscuras que envolvem figuras emblemáticas e até sociedades secretas.
A ideia esbarra no "Dark Tourism", nicho de turismo em que pessoas vão a locais associados a tragédias. Não é um lazer tradicional, mas uma busca por educação, memória e curiosidade.
O passeio do "Curitiba Sombria" não se limita a lendas e contos: o recorte histórico resgata nomes que foram importantes para o desenvolvimento da cidade. A milagreira Maria Bueno, a travesti Gilda e narrativas sobre a Loira do Táxi, a "bruxa" Anna Formiga e o Pirata Zulmiro embalam o programa.
"A ideia inicial era fazer um podcast. Comecei a revisitar jornais antigos e microfilmagens. Percebi que havia muitas histórias que precisavam ser resgatadas, que estavam se perdendo. Então pensei em um jeito de ir visitando locais onde a história ocorreu de fato", conta Luciana, que passou o ano de 2023 imersa em pesquisas.
Roteiro por Curitiba

O passeio acontece ao longo de todo o ano, sempre aos sábados, com duas saídas: às 19h e às 21h30. Ao todo, o tour tem capacidade de 13 pessoas por saída. O roteiro percorre o centro histórico por meio de uma van, com apoio de imagens ao longo do trajeto. O ponto de encontro acontece na Praça João Cândido.
A praça concentra dois pontos de interesse: o Belvedere e as Ruínas de São Francisco. Segundo Luciana, a história diz que já foi um local de enforcamento na época que Curitiba ainda era Vila Nossa Senhora da Luz dos Pinhais. Com o tempo, foi ganhando novos usos, incluindo a tentativa da construção de uma igreja - que corresponde às Ruínas - e o Palácio Belvedere.
"O Belvedere foi erguido em 1915 em um local em que é possível ver toda a cidade. Foi caindo em desuso e chegou a pegar fogo. Com a reforma, foram encontrados ossos na terra, isso porque ali, antes, havia uma capelinha. Era comum a prática de enterrar indivíduos ao lado de capelas e igrejas", explica Luciana.
Depois, o passeio segue para a Praça Tiradentes, onde Curitiba nasceu, com destaque para a Catedral. Segue para o Clube Concórdia, onde túneis subterrâneos do século XVIII ainda são um mistério.
Outros pontos de parada são o Cemitério Municipal, onde os visitantes entram na brincadeira ao "invocar" a Loira do Táxi; a Rua XV de Novembro, que possui uma placa de 1983 em homenagem à travesti Gilda; e a Rua Vicente Machado, local do assassinato da milagreira Maria Bueno em 1893.
Curiosidade, mas também conscientização
"Coloco a Gilda no roteiro porque o passeio pode servir para conscientizar as pessoas. Falamos dela por ter vivido uma situação de rua, por ser um indivíduo LGBTQIA+ e por ter sofrido preconceito. Ela faleceu com 33 anos. Passou muitas dificuldades, mas ainda assim era uma pessoa que espalhava alegria e que iluminava a XV de Novembro", afirma Luciana.
Outro caso de comoção na capital paranaense é o de Maria Bueno. "Foi o primeiro feminicídio a ficar famoso em Curitiba", diz a criadora do tour. Considerada uma santa popular, foi assassinada por um homem do Exército que mantinha uma relação.
"A devoção a ela começa com pessoas pretas e pobres, mas chega na alta sociedade curitibana. Hoje ela é cultuada de maneira absurda, seu túmulo tem muitos agradecimentos."
O passeio termina com uma degustação de costelas no Gato Preto, restaurante emblemático da cidade que abre todos os dias das 18h às 6h. "Com a confraternização, as pessoas fazem amizades. A ideia era criar uma comunidade, e tem dado certo. Depois, as pessoas vêm me contar histórias de avós, mães e de sociedades secretas. Sempre tem uma história, e elas querem compartilhar", resume Luciana.
Tour Curitiba Sombria
Todos os sábados, com saídas às 19h e às 21h30 / Classificação indicativa do tour é de 18 anos / Ingressos a R$ 100 pelo site (já inclui degustação no Gato Preto) / Mais informações no Instagram.