É possível perder dinheiro durante as oscilações do mercado do Tesouro Direto?
Alterações diárias de preços e taxas de títulos do governo assustam investidores iniciantes; Tesouro passa a interromper negociações em casos de volatilidade
O avanço da pandemia do coronavírus assusta boa parte da população global e um dos grupos que vem perdendo o sono é o de investidores (dos grandes aos menores). Quem abriu a sua carteira de investimentos nos últimos dias, tomou um belo de um susto. Essas pessoas viram, inclusive, títulos de renda fixa estarem cotados abaixo do valor investido inicialmente. Agora fica a dúvida: é possível perder dinheiro com as oscilações do Tesouro Direto?
A resposta simples é: só se você tirar seu dinheiro antes do prazo, mesmo que seu título pareça estar se desvalorizando. Mas como isso não basta, é preciso entender o contexto atual e como funciona o Tesouro Direto.
Dados de fevereiro divulgados pela Secretaria do Tesouro Nacional na última terça-feira (24) mostram que, nos últimos quatro meses, resgates superaram emissões de títulos do Tesouro Direto. Isso quer dizer que as pessoas mais tiraram seu dinheiro dos papéis do governo do que colocaram. Só em fevereiro, esse saldo negativo ficou em cerca de R$ 960 milhões. Fenômeno que a forte queda na taxa de juros ajuda a explicar.
Estes números ainda não levam em conta, todavia, o mês de março, um dos mais caóticos da história da B3 e do mercado de ações como um todo. E, com a volatilidade da renda variável em níveis altíssimos, a renda fixa pode ter retornado às carteiras de investimento antes do previsto. “A renda fixa voltou a ter o seu charme”, disse Luciane Effiting, superintendente de investimentos do banco Santander, durante entrevista a Fernando Nakagawa no programa Carteira Inteligente, do CNN Brasil Business.
Apesar disso, nem o Tesouro Direto, considerado um dos investimentos mais seguros, passou ileso à crise provocada pelo coronavírus. A secretaria tem interrompido as negociações dos títulos em dias de forte oscilação no mercado e consequentemente assustado seus investidores. Parte dessa revolta, difundida principalmente nas redes sociais, foi gerada justamente porque um dos grandes atrativos da modalidade é sua liquidez e a possibilidade de tirar o dinheiro investido sempre que necessário ou desejado.
Gerente do Tesouro Direto, Diego Link, afirma que a medida é para proteger o próprio investidor de taxas distorcidas praticadas no mercado secundário – empresas, bancos, fundos e corretoras negociam títulos públicos entre si a todo tempo. “Os preços e taxas dos papéis são definidos por essas negociações secundárias. Em momentos de alta volatilidade, estes valores variam de forma abrupta, por isso realizamos algumas interrupções”, diz.
Inicialmente, até os títulos atrelados à Selic, que não sofrem tanta oscilação e são utilizados como reserva de emergência, estavam tendo suas negociações interrompidas. Mas, depois da pressão popular, só os títulos prefixados continuaram no processo.
Por vezes, explica Link, esse mercado secundário perde a referência de preços durante as negociações, fazendo com que o Tesouro realize leilões de recompra de títulos para restabelecer a ordem. “Estas interrupções servem para travar o pânico do mercado e reorganizar as coisas. Mas, sem aviso, pode assustar e incomodar os investidores”, opina Gabriela Mosmann, analista CNPI da Suno Research.
É necessário calma
Além das pausas não programadas, outro movimento vem assustando investidores, principalmente os de primeira viagem. Os valores dos títulos variam a todo momento, consoante a auto regulação dessa negociação secundária. Isso faz com que um papel que foi comprado às 10h da manhã possa ser vendido a um preço diferente às 18h ou nos próximos dias. O nome disso é marcação a mercado.
“Os investidores iniciantes precisam entender que o Tesouro tem dois tipos de título. Os de curto (Selic) e os de longo prazo (IPCA+ e prefixado). Os últimos não são ideais para quem precisa de liquidez. Eles vão te pagar o valor contratado no prazo do título, mas sofrem oscilações diariamente e ao longo de todo período de contratação”, afirma Gabriela.
Ou seja, o investidor receberá as taxas que contratou se o dinheiro for retirado no dia do vencimento do título. Caso decida retirar antes, ficará exposto às cotações do dia. “Não fique olhando os preços dos papéis a todo momento. Se você quer investir no curto prazo, compre títulos atrelados à Selic. Se seu objetivo é o longo prazo e você comprou um título prefixado, só retire quando o prazo se encerrar”, aconselha Letícia Camargo, planejadora financeira pela Planejar, Associação Brasileira de Planejadores Financeiros.
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A verdade é que especialistas reafirmam a segurança dos títulos do governo e explicam que este movimento de vender títulos em momentos de desespero pode ser extremamente prejudicial à sua saúde financeira.
Do outro lado deste espectro, surge uma oportunidade para os investidores mais experientes. A bolsa volátil e por vezes até perigosa fez com que os papéis do Tesouro estejam sendo negociados com taxas bem superiores às de um mês atrás. Momento ideal para comprar estes títulos e, sabendo prever as oscilações da marcação a mercado, vendê-los antes do prazo para uma maior obtenção de lucro.
“É verdade que surgiram essas oportunidades. As taxas estão altas agora devido à instabilidade dos mercados. Quando as coisas se normalizarem, a tendência é baixar. De qualquer forma, não aconselho a especulação”, diz Letícia. Papéis como o Tesouro IPCA+, que pagam a variação da inflação mais uma taxa fixa, viram este valor adicional saltar de 3% para quase 5% em menos de um mês.
Link afirma que a especulação é do jogo, mas prega cautela para que investidores não errem suas previsões e percam dinheiro. O gerente do Tesouro diz ainda que a entidade está trabalhando para tornar sua atualização de remarcação de juros mais frequente e intuitiva para o público. “Isso está em estudo. Só queremos que seja algo perene, e não pensado somente para tempos de instabilidade como agora”, afirma.