Entenda por que a Gol abriu processo de recuperação judicial nos EUA

Aérea reportou dívida de R$ 20,2 bilhões em dezembro; processo já foi aceito por tribunal de Nova York

João Nakamura, da CNN*, São Paulo
Gol e as suas subsidiárias fizeram o pedido baseado no Chapter 11  • Tomaz Silva/Agência Brasil
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A companhia aérea Gol apresentou um pedido de recuperação judicial à justiça dos Estados Unidos na última quinta-feira (25). O processo foi acatado pelo Tribunal de Falências de Nova York no dia seguinte.

Em fato relevante ao mercado, a aérea informou nesta segunda-feira (29) que encerrou dezembro com endividamento de R$ 20,17 bilhões. A empresa ainda afirmou que os ativos não auditados, no final de dezembro, somavam R$ 16,83 bilhões, e o patrimônio líquido estava negativo em R$ 23,35 bilhões.

Para o analista José Daronco, o grande problema da companhia foi o passivo acumulado desde o período da pandemia de covid-19, que trouxe fortes impactos ao setor aéreo.

"Apesar do momento bem favorável para as empresas de transporta aéreo, por conta da tarifa ter atingido as máximas históricas dos últimos anos, a Gol não teve outra saída se não entrar em recuperação judicial", pontua.

Chapter 11

A Gol e as suas subsidiárias fizeram o pedido baseado no chapter 11. Nos Estados Unidos, esse processo de recuperação judicial permite que as empresas continuem suas operações enquanto tentam reestruturar suas contas e fortalecer seu capital.

Com a aprovação da justiça norte-americana, a companhia aérea terá acesso ao crédito de US$ 950 milhões obtido pela Abra, o grupo controlador da Gol e da Avianca.

Uma série de motivos pode ter levado a companhia a optar pelo processo nos EUA, mas a advogada e especialista em direito empresarial, Giulia Panhóca, destaca a estrutura do mercado norte-americano.

Para a especialista, o cenário nos EUA é mais maduro, o que naturalmente tende a tornar o procedimento mais célere em comparação aos trâmites no Brasil. A escolha pela jurisdição internacional também passa pelo maior acesso de crédito para empresas em crise.

"É provável o fato de que os principais credores da companhia sejam americanos — fabricantes de aeronave e financiadores, por exemplo — levam a crer que a que a escolha da jurisdição americana foi motivada por uma combinação de fatores", explica.

Além da segurança jurídica, o advogado Fernando Canutto destaca a maior simplicidade do processo como uma preferência pelos EUA.

"A petição inicial, na verdade, um formulário nos Estados Unidos, é um documento de 18 folhas. Essa simplicidade permite que ela [Gol] busque recursos de uma maneira mais clara, porque a certeza de deferimento é muito maior do que teria no Brasil", afirma Canutto.

De acordo com a aérea, o financiamento "fornecerá liquidez substancial para apoiar as operações, que seguem normalmente, durante o processo de reestruturação financeira".

Com o suporte, a Gol reforça que os voos e seus programas de fidelidade serão operados normalmente.

A mesma estratégia foi usada pela Latam após a pandemia do covid-19. Dois anos depois, a aérea de capital brasileiro e chileno conseguiu sair do processo de recuperação e, hoje, opera normalmente.

"O pedido de recuperação judicial nos EUA, ao invés do Brasil, reside no fato de que a legislação americana é muito mais moderna e ágil, o que facilita uma recuperação bem sucedida. Foi o caso da Latam, por exemplo. No Brasil, o judiciário acaba não tendo a agilidade esperada, o que causa muitos prejuízos e, inclusive, prejudica a recuperação das empresas", pontua Daronco.

Histórico

A Gol vinha tentando lidar com a sua dívida elevada, num período de dificuldade ao qual o CEO da companhia, Celso Ferrer, atribuiu aos "desafios gerados pela pandemia" em fato relevante.

Em dezembro, a aérea optou por contratar a empresa de consultoria Seabury Capital para ajudá-la em uma revisão da estrutura de capital.

O cálculo envolvia gestão de passivos, transações financeiras e outras medidas para aumentar a liquidez.

Durante um evento no mês passado, a aérea afirmou aos investidores que estava em negociações para reestruturar sua dívida, e esperava a contribuição de detentores de títulos e acionistas.

No dia 17, a Gol disse que ainda estava discutindo com os investidores sobre como chegar a uma reestruturação “consensual”. Em comunicado, a companhia ressaltou seu compromisso com a captação de recursos para fortalecer sua posição de caixa.

Após a abertura do processo, no dia 25, a companhia emitiu um fato relevante ao mercado no qual reforçava seus esforços para manter seu padrão de serviço.

"A Gol vem empreendendo esforços significativos para oferecer a melhor experiência de viagem aos Clientes, ao mesmo tempo em que melhorou sua lucratividade e posição financeira”, disse Ferrer.

*Com informações de Reuters; sob supervisão de Gabriel Bosa

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