Caos e incerteza: Europa se prepara para o segundo inverno em meio à pandemia

Leste do continente sofre com baixa adesão à vacinação, enquanto a região do Ocidente resiste à imposição de novas medidas

Tara John, da CNN
Homem de máscara para prevenir contágio pelo novo coronavírus em Lisboa, capital
Homem de máscara para prevenir contágio pelo novo coronavírus em Lisboa, capital de Portugal. Europa é atualmente o maior epicentro da doença  • Foto: Rafael Marchante/Reuters
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Lockdowns, casos crescentes e baixa adesão à vacinação marcam o início do segundo inverno europeu em meio á pandemia, trazendo caos para os países do Leste Europeu e incerteza para os do Ocidente.

Apesar da ampla disponibilidade de vacinas, a Europa é a região do mundo com um aumento de novos casos de Covid-19, informou a Organização Mundial da Saúde (OMS) em seu ultimo relatório semanal. O continente registra alta de infecções há três semanas.

O sofrimento tem sido agudo no Leste Europeu, que luta contra o aumento de mortes e casos impulsionados pela baixa adesão vacinal, com países onde a taxa é de apenas 24%, de acordo com dados do Centro Europeu para Prevenção e Controle de Doenças (ECDC).

Na última quinta-feira (21), a Letônia se tornou o primeiro país da União Europeia a impor novo lockdown. No país, apenas 56% de todos os adultos receberam ambas as doses da vacina, em comparação com a média de 74,6% da União Europeia.

A Europa Ocidental também está lidando com o aumento dos casos de Covid-19, apesar de alguns países desfrutarem de uma cobertura vacinal quase universal.

A taxa de incidência na Alemanha aumentou para 100 novas infecções por 100.000 habitantes no último sábado (23) pela primeira vez desde maio. Bélgica e Irlanda sofrem com duas das mais altas taxas dessa categoria na região, de acordo com o ECDC, de 326 e 433 por 100 mil pessoas, respectivamente.

O ministro da Saúde da Bélgica, Frank Vandenbrouck, disse à emissora VRT que o país está em uma quarta onda. Mais de 85% da população adulta está totalmente vacinada, e a grande maioria dos pacientes hospitalizados com Covid-19 não foram imunizados, segundo as autoridades.

As diferentes taxas de vacinação colocam o Leste e o Oeste da Europa em dois caminhos separados, mas ambos compartilham o aumento de casos impulsionado pelo relaxamento das restrições, o clima frio e a variante Delta, predominante no continente.

Hesitação vacinal

O número de casos pode ser alto em alguns países da Europa Ocidental, mas graças às vacinas, as mortes e hospitalizações da Covid-19 permaneceram praticamente estáveis ​​em comparação com o Leste.

A partir desta segunda-feira (25), a Romênia reintroduzirá toques de recolher noturnos e tornará o "passaporte de vacina" obrigatório para a maioria dos locais, dias depois de registrar uma taxa de 19,25 mortes por milhão de pessoas, uma das mais altas do mundo.

Os problemas não se resumem à escassez de vacinas. Os países da União Europa têm acesso a todas as vacinas aprovadas pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA, em inglês), mas muitos países do Báltico e dos Bálcãs têm sido prejudicados pela baixa adesão vacinal, por fracas mensagens governamentais e desconfiança das autoridades.

Vacinação contra Covid-19 em Portugal/ Reprodução / CNN
Vacinação contra Covid-19 em Portugal/ Reprodução / CNN

A Ucrânia registrou o maior número diário de casos de Covid-19 desde o início da pandemia na última quinta-feira (21), com 22.415 novas infecções, dias depois que o presidente Volodymyr Zelensky implorou aos cidadãos para serem vacinados, dizendo que era a única maneira de evitar um lockdown.

"Há dois caminhos: vacinação ou confinamento", disse Zelensky em uma entrevista para o canal ucraniano ICTV. "Todos os dias enfrentamos esse desafio e essa escolha. Sou totalmente contra o lockdown por causa da economia."

Mas na última sexta-feira (22), as escolas nas regiões mais afetadas pela Covid foram fechadas e o governo anunciou a necessidade de certificados de vacinação ou um teste negativo para acessar o transporte público na capital Kiev, depois que as mortes diárias no país atingiram um recorde de 614 em 24 horas.

A Rússia está enfrentando sua pior fase de pandemia. Moscou decretou um lockdown de 10 dias e as autoridades admitem que o país está enfrentando um inverno terrível.

"Nem tudo o que precisava ser feito para informar e explicar a importância da vacinação foi realizado", disse o porta-voz do presidente Vladimir Putin, Dmitry Peskov, a jornalistas enquanto o Kremlin assumia responsabilidade parcial pela baixa taxa de vacinação. “Mas, ao mesmo tempo, os cidadãos do nosso país precisam assumir uma posição mais responsável e se vacinar”, disse ele.

Sem solução fácil

A Europa Ocidental não "alcançará os níveis de crise que vimos no passado, com hospitais de campanha, [porque] as vacinas definitivamente mudaram o jogo e, nesse sentido, deve haver muitos motivos para otimismo". disse o Dr. Peter Drobac, especialista de saúde da Universidade de Oxford, à CNN.

O Reino Unido, porém, mostra que as vacinas não são a única solução, acrescentou.

Depois de abandonar quase todas as restrições à pandemia no verão o Reino Unido está registrando a maioria dos casos diários na Europa Ocidental. Especialistas em saúde e sindicatos médicos têm implorado ao governo britânico que reimponha medidas como uso de máscaras ou passaportes de vacinação, de modo a evitar medidas mais restritivas como lockdowns.

Reino Unido abandonou a maioria das medidas contra a Covid-19
Reino Unido abandonou a maioria das medidas contra a Covid-19

Mas o governo rejeita tais políticas, mesmo com o aumento de hospitalizações e mortes. Katherine Henderson, presidente do Royal College of Emergency Care, disse à Sky News que o serviço de saúde do país já está em "um lugar terrível". Departamentos de emergência em todo o Reino Unido "já estão lutando para lidar" com as "grandes filas" de ambulâncias, disse ela.

Em vez disso, o primeiro-ministro britânico Boris Johnson pediu as pessoas com mais de 50 anos e dos grupos de risco que recebam a dose de reforço. Isso pode não ser  suficiente em meio à dispara de casos, que pode ser um terreno fértil para a criação de novas variantes.

Na última sexta-feira (23), a Agência de Segurança de Saúde do Reino Unido informou sobre uma descendente da variante Delta, AY.4.2, que está "sob investigação" devido a "evidências iniciais de que pode ser mais transmissível que a Delta".

"No Reino Unido, a estratégia tem se concentrado muito em permitir que as vacinas façam todo o trabalho. E não acho que isso será suficiente", disse Drobac.

É uma estratégia perigosa que depende de pessoas não vacinadas, como crianças, serem infectadas para criar uma "imunidade de rebanho", disse ele. "O problema com isso, é claro, é que não só permite um nível inaceitavelmente alto de internações e mortes, mas também pode não funcionar", acrescentou.

Enquanto o Reino Unido se arrasta em novas medidas, a Irlanda está adiando o abandono das restrições à pandemia em meio a um ressurgimento de casos, apesar de ter uma das taxas de vacinação mais altas da Europa - 92% da população totalmente vacinada, de acordo com o ECDC.

Durante uma coletiva de imprensa na última semana, o primeiro-ministro Micheál Martin disse que as exigências de vacinação permanecerão em vigor para eventos internos, e as máscaras continuarão a ser obrigatórias em espaços públicos fechados.

(Texto traduzido. Clique aqui para ler o original em inglês)