Israel volta a áreas que estariam livres do Hamas e gera dúvida sobre estratégia
O retorno de Israel a áreas que supostamente havia libertado do Hamas gera dúvidas sobre a estratégia militar de longo prazo


Os militares israelenses retomaram os combates no norte de Gaza, onde anteriormente afirmava ter desmantelado a estrutura de comando do Hamas. Mas agora afirma que o grupo militante palestino está tentando “se reagrupar” na área, levantando dúvidas sobre se o objetivo de Israel de erradicar o grupo no território palestino é realista.
Israel retomou sua operação terrestre no sábado (11), com intensos bombardeios e tiros, atingindo grande parte do campo de refugiados de Jabalya, no norte da Faixa. Os militares israelenses também começaram a operar na área de Zeitoun, no centro de Gaza, enquanto continuam com a ofensiva no leste de Rafah e próximo à fronteira entre Rafah e o Egito.
O retorno de Israel a áreas que supostamente havia libertado do Hamas gera dúvidas sobre a estratégia militar de longo prazo, que, após mais de sete meses de guerra, matou mais de 35 mil palestinos e deixou grande parte de Gaza em ruínas. Porém, mais de 100 reféns de Israel ainda estão em cativeiro e a liderança do Hamas segue em liberdade.
A retomada dos combates no norte ocorre em um momento em que as negociações para se atingir um acordo de cessar-fogo e a libertação dos reféns estão estagnadas. E a administração Biden sinaliza que os Estados Unidos estão perdendo a paciência com o governo de Netanyahu.
No fim de semana, o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, fez uma avaliação contundente sobre a conduta de Israel na guerra.
Em uma entrevista no domingo à CBS News, Blinken disse que qualquer sucesso inicial na invasão de Israel à cidade de Rafah, no sul de Gaza – à qual Washington se opôs fortemente – “não é sustentável”. O principal diplomata americano criticou Israel por não ter um “plano aceitável para proteger os civis”, nem um plano pós-guerra para o território palestino.
“Estamos vendo partes de Gaza que Israel libertou do Hamas, onde o Hamas está voltando, inclusive no norte, inclusive em Khan Younis”, disse Blinken, acrescentando que uma ofensiva terrestre em Rafah deixará Israel “segurando uma insurgência duradoura, porque muitos combatentes do braço armado do Hamas vão permanecer, não importa o que façam em Rafah.”
“Ou se eles (Israel) saírem de Gaza, como acreditamos que precisam fazer, teremos um vácuo que provavelmente será preenchido pelo caos, pela anarquia e, em última análise, pelo Hamas novamente.”
Alguns especialistas israelenses dizem que a atual estratégia de guerra de Netanyahu, que tem por objetivo a destruição completa do Hamas em Gaza, é falha e irrealista, pois não possui visão de longo prazo.
“A estratégia de Israel não é boa”, disse Danny Orbach, historiador militar da Universidade Hebraica de Jerusalém. Ele afirmou que a tática de limpar e degradar incessantemente as capacidades do Hamas, enquanto evita a responsabilidade de governar Gaza, não funcionará.
Netanyahu afirmou anteriormente que Israel terá a “responsabilidade geral pela segurança” em Gaza por um “período indefinido” após o fim da guerra, uma posição que está em desacordo com a dos EUA.
Sem nenhum governo alternativo viável, Netanyahu “como de costume, decide não decidir”, disse Orbach, acrescentando que a estratégia em andamento de “limpeza e degradação” permite que o primeiro-ministro evite tomar decisões difíceis sobre Gaza no pós-guerra, ao mesmo tempo que impede o Hamas de ressurgir tão forte como era antes de 7 de outubro.
O líder israelense ainda não apresentou um plano pós-guerra para o enclave. Os Estaod Unidos têm pressionado por uma Autoridade Palestiniana (AP) reformada para governar Gaza, o que Netanyahu rejeitou repetidamente. A AP é um governo que espera por um futuro Estado palestino independente nas áreas da Cisjordânia ocupada, da Jerusalém Oriental ocupada e em Gaza como parte de uma solução de dois Estados para o conflito entre Israel e a Palestina.
Netanyahu disse repetidamente que os militares estão no caminho certo para eliminar o Hamas e, em uma entrevista com Dr. Phil na sexta-feira (10), afirmou que 14 mil combatentes do Hamas foram mortos até agora. Israel estimou que Gaza tinha 30 mil combatentes antes de 7 de outubro.
A CNN não pode verificar de forma independente os números fornecidos pelo Ministério da Saúde palestino, controlado pelo Hamas, ou por Israel, devido às restrições de divulgação dos meios de comunicação internacionais.
Antigos e atuais funcionários israelenses, incluindo uma importante figura militar, emitiram alertas sobre a direção que Israel está tomando com a guerra.
No fim de semana, o chefe do Estado-Maior das Forças de Defesa de Israel (FDI), major-general Herzi Halevi, criticou a estratégia de Netanyahu. “Enquanto não houver nenhum movimento político que traga uma forma de governo que não seja o Hamas na faixa, teremos que operar repetidas vezes lá e em outros lugares para desmantelar a infraestrutura do Hamas”. “Será uma tarefa de Sísifo”, disse ele, sugerindo que poderá nunca ser realizada.
Altos funcionários das FDI incentivaram o primeiro-ministro a tomar decisões e a formular uma estratégia para a guerra, acrescentou o Canal 13.
O ex-chefe da inteligência militar de Israel, Tamir Hayman, também sugeriu à liderança de Israel a negociar um acordo de reféns que inclua um cessar-fogo indefinido e trabalhar com uma Autoridade Palestina para restaurar a ordem em Gaza.
Hayman, que agora dirige o Instituto de Estudos de Segurança Nacional (INSS) em Tel Aviv, disse anteriormente à CNN que Israel corre o risco de cair em uma guerra perpétua de atrito, onde há “atritos sem fim” com os seus vizinhos. Uma guerra prolongada, disse ele, corre o risco de deixar Gaza sob o domínio do Hamas ou à mercê de um vácuo de poder onde vários grupos armados podem competir pela autoridade.
Outros dizem que o ressurgimento dos “bolsões” do Hamas não é incomum e que os militares israelenses terão de continuar entrando nas áreas de Gaza até que não surjam mais combatentes.
“Este processo acontecerá repetidamente”, disse Amir Aviv, ex-vice-comandante da Divisão de Gaza das forças armadas de Israel, à CNN, até que todos os “bolsões de resistência” sejam removidos.
O ex-vice-comandante acredita que é possível erradicar o Hamas. “Gaza não é infinita, não é tão grande”, disse ele. “(Israel) alcançou o último reduto (Rafah), e agora o Hamas está as costas contra a parede.”