PMs do Rio acusados de racismo vão prestar depoimento na próxima semana
Segundo delegado, o fato foi registrado como crime de preconceito e, caso seja provado o crime, pena pode chegar a três anos de prisão
A Polícia Civil vai ouvir na próxima semana, todos os agentes de segurança envolvidos na abordagem ao promotor de eventos e influenciador, Júlio César Dantas, que denunciou ter sido vítima de racismo ao sair de uma loja no centro do Rio, na última quarta-feira (17). Júlio registrou ocorrência na tarde desta quinta (18) na 5ª Delegacia (Centro), acompanhado de seus advogados.
Segundo o delegado da Polícia Civil, Bruno Gilabert, o fato foi registrado como crime de preconceito, com base no artigo 20 da lei nº 7.716 de 1989, que versa sobre "Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional".
“Por ora trabalhamos com a hipótese do art. 20, mas ainda há algumas circunstâncias a demonstrar. Caso seja constatado o crime, a pena é de 1 a 3 anos", disse o delegado Bruno Gilabert.

A abordagem foi realizada na quarta-feira (17), em uma loja no centro da cidade. A ação foi registrada por Júlio, que transmitiu ao vivo a ação em sua conta Carioquice Negra, que tem mais de 800 mil seguidores nas redes sociais. No vídeo, ele logo questiona o motivo da abordagem e recebe como resposta que teria entrado e saído muito rápido do estabelecimento.
Ao longo da ação, Júlio questiona se o verdadeiro fato era a cor de sua pele. Em outro trecho, um dos policiais também afirma que Júlio teria apresentado um volume suspeito na cintura. O jovem levanta a blusa e mostra que não havia qualquer objeto. Um agente chega a dizer que o volume poderia ser efeito do vento na camisa.
O produtor de eventos nega-se a entregar a identificação por entender que não havia um motivo concreto para a abordagem e passa a ser acusado de desobediência. No início, é possível identificar dois policiais, mas logo o número cresce e chega a seis, segundo narra o rapaz. Júlio foi conduzido pelos agentes para a 5ª Delegacia de Polícia Civil, no centro da cidade, onde se identificou e foi liberado.
Para Rodrigo Mondego, vice-presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos do Rio de Janeiro e procurador da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a abordagem policial precisa ser fundamentada em alguma suspeita concreta de crime cometido.
“Quando não há motivação para a abordagem e a pessoa é levada para a delegacia sem justificativa, caracteriza-se abuso de autoridade. A pessoa só pode ser detida em caso de flagrante delito, em caso de um crime, ou por determinação judicial. Ninguém pode ser detido para averiguação. Esse é um instrumento usado na ditadura. É uma violação à Constituição e ao Código do Processo Penal. Ser preto não é uma atitude suspeita”, pontuou Mondeg
Por nota, a assessoria da Operação Segurança Presente, vinculada à Polícia Militar do Rio de Janeiro, disse que os agentes suspeitaram de Júlio por ele ter demonstrado insatisfação com a aproximação policial, e destacou que as abordagens são respaldadas por lei. Ainda segundo a nota, as ações policiais “não são pautadas por cor da pele, orientação sexual, religiosa, de gênero ou qualquer fator pessoal, mas a partir de denúncias ou comportamentos que podem representar algum risco à coletividade”.
Em entrevista à CNN, nesta quinta (18), Júlio comentou o ocorrido.
“Incômodo gigante de saber que não é uma coisa nova, que não foi a última vez, que nas últimas 24 horas aconteceu de novo. Eu tô aqui pra que essa pauta seja questionada, discutida, que as instituições levantem essa pauta e reverberem, pra mudar essa forma de abordagem. Ali eram duas da tarde, fiquei imaginando se fosse tarde da noite o que seria", disse.